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AUTORIDADE MARÍTIMA
Locais de refúgio para navios em dificuldade
Locais de refúgio para navios em dificuldade
INTRODUÇÃO da sua posição para se dirigirem a um local salvando a necessária adaptabilidade de ma-
abrigado na costa, ou sequer para se aproxi- térias, o sucedido sempre que se fala dos lo-
odos se lembram da polémica gerada à marem do litoral desses países. Entre muitos cais indicados pelo Governo português como
volta da decisão do Governo de Espa- outros, valerá a pena lembrar casos como o adequados para receberem a co -incineração,
Tnha de não permitir a aproximação do do petroleiro grego Andros Patricia, que, em problemática em que porventura nunca será
Prestige à costa espanhola durante o período 31 de Dezembro de 1978, sofreu uma ruptura possível obter a concordância das populações
crítico em que este navio se encontrou entre os no casco quando navegava nas proximidades vizinhas desses locais. Este facto leva a pensar,
dias 13 e 19 de Novembro de 2002, período no do cabo Finisterra, o da colisão de 2 super-pe- com seriedade, na alternativa de conseguir que
qual quer os responsáveis pelo navio, quer as troleiros próximo de Trinidade e Tobago, em o navio chegue a uma zona abrigada para aí
autoridades espanholas, desenvolveram esfor- 1979, o Atantis Empress e o Aegean Captain, o Ki- proceder às acções necessárias que lhe per-
ços no sentido de o salvar e de minimizar even- rky, em 1991, na Austrália, e, mais recentemen- mitam prosseguir viagem ou para efec tuar a
tuais danos para o meio marinho. Como se viu, te, do Erika, do Ievoli Sun, do Vicky, do Castor trasfega das substâncias perigosas para o meio
a decisão do Estado -Costeiro foi no sentido de e do Prestige, estando este último ainda bem ambiente que transporte ou até, em última ins-
afastar o navio em vez de o aco- tância, e como solução final, o
lher num local costeiro indicado respectivo afundamento contro-
para o efeito. Este exemplo bem lado, ou o seu desmantelamento,
poderia ter estado na origem da quando aplicável.
intenção da International Mari-
time Organization (IMO), e mais CONCEITOS, BASE
tarde da União Europeia (UE), LEGAL E ORIENTAÇÕES
de mostrar aos Estados-Costei- PARA A ESCOLHA DESTE
ros a necessidade de terem iden- TIPO DE LOCAIS
tificados, nas respectivas costas
marítimas, locais onde certos O âmbito de aplicação das
navios, e sob determinadas con- medidas associadas à assistên-
dições, pudessem ser recebidos cia a um navio em dificuldade
para aí lhes ser prestado o apoio cobre apenas o apoio a ser pres-
possível ou para aí serem toma- tado a esse navio na tentativa de
das as medidas adequadas para que este, e a respectiva carga,
minimizar os danos ambientais não se percam e de que o meio
decorrentes do incidente. Mas IEVOLI SUN. marinho não seja afectado em
não. O caso Prestige configurou apenas mais presente na nossa memória. O acidente sofri- resultado do acidente, uma vez que ficou cla-
uma situação em que este trabalho de casa po- do pelo Castor, logo em Dezembro seguinte, ro desde o início que não se trata de matérias
deria ter ajudado a decidir sustentadamente e a negação do pedido para entrar num local do foro da busca e salvamento.
e com racionalidade. Vários foram os aciden- abrigado de Espanha, Marrocos ou Gibraltar, Nas guidelines da IMO - adoptadas através
tes que conduziram à identificação desta ne- depois de ter sofrido uma avaria grave que co- da Resolução A.949(23), de 5 de Dezembro de
cessidade, sem que este trabalho tenha ainda locava em risco a estabilidade da plataforma e 2003 - refere-se que a “situação em que o navio
sido realizado por muitos Estados-Costeiros. A que impunha medidas rápidas de assistência necessita de assistência é uma situação diferente
Directiva nº 2002/59/CE, do Parlamento Eu- quer para trasfega da carga, quer para proce- daquela onde se requer o salvamento de pessoas de
ropeu e do Conselho, de 27 de Junho de 2002, der a reparações que repusessem as suas qua- bordo mas em que existe risco do navio se perder
acabaria por impor aos Estados–Membros, en- lidades náuticas, levou a que a IMO aceleras- ou de provocar prejuízos à navegação ou ao meio
tre outras obrigações, a identificação de locais se a tomada de acção neste âmbito através da ambiente marinho”. Por outro lado, local de re-
de refúgio e bem assim a elaboração de pla- discussão deste assunto em diversos comités fúgio vem identificado como um “local onde
nos de acolhimento para cada um dos locais tendo o próprio Secretário-Geral desta Organi- um navio a necessitar de assistência pode ser re-
identificados. Neste texto, irá ser apresentada zação assumido que a problemática dos locais colhido para estabilizar a sua situação e assim re-
uma breve sinopse do que está em causa com de refúgio era uma prioridade em matéria de duzir o risco existente para a vida humana e para
esta imposição e qual o estado de desenvolvi- preservação do meio marinho. o meio ambiente marinho”. Podemos englobar
mento desta matéria em Portugal, sendo ainda Não é fácil aceitar que um local de refúgio, nesta abrangente definição locais situados na
analisadas algumas sensibilidades associadas na acepção aqui apresentada, venha a estar costa ou perto dela desde que ofereçam abri-
a esta problemática. situado em zonas com algum outro tipo de go aos navios, tais como baías, enseadas, fun-
interesse para o Estado-Costeiro. Mas porque deadouros, reentrâncias, ou estuários e zonas
PORQUÊ LOCAIS DE REFÚGIO a decisão tem de ser tomada e porque a natu- portuárias. Convém que nestes locais existam
PARA NAVIOS EM DIFICULDADE reza humana nos tem ensinado a afastar o pe- condições naturais ou artificiais para dar abri-
rigo, é conveniente que a mesma se baseie em go ao navio e para lhe prestar a necessária
A necessidade de tentar encontrar locais de critérios objectivos e rigorosos de modo a ser assistência em termos de facilidades para re-
refúgio que possam servir para acolher navios irrefutável. Atente-se na problemática social e parar eventuais danos que comprometam as
em dificuldade terá surgido depois de diver- política que a gestão do acidente com o Prestige suas qualidades náuticas e/ou a carga, além
sos navios em risco de perderem a carga, de originou em Espanha. A grande mediatização de poderem pôr em risco outros interesses do
se afundarem, ou de poderem constituir uma destes assuntos recomenda, hoje, uma ponde- Estado-costeiro. Numa abordagem muito su-
ameaça, em termos de poluição, para o meio ração adequada para cada caso não havendo cinta de alguns instrumentos internacionais
marinho, não terem recebido autorização por regras precisas que se possam aplicar de igual onde podemos encontrar suporte para este
parte dos Estados-Costeiros mais próximos forma em todos os países. Relembre -se, res- trabalho, encontramos diversas Convenções
REVISTA DA ARMADA U FEVEREIRO 2007 7