Page 202 - Revista da Armada
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infante D. Henrique, e na via do Oriente,  te adaptação às suas próprias mutações.
         atrás das especiarias, mas a sua presença  Mas a Marinha tem ainda uma razão su-
         surge, sobretudo, nas viagens para a Ter-  plementar para aqui se deslocar, recordan-
         ra Nova, onde formaram grandes colónias,  do os tempos do Centro da Aviação Naval
         logo após as viagens dos irmãos Corte Real,  de S. Jacinto, na margem norte da Barra.
         entre 1500 e 1502. As primeiras campanhas  Criado em 1918, quando decorria a Pri-
         da pesca do bacalhau nos mares gelados  meira Grande Guerra, ali viria a funcio-
         do Atlântico Noroeste, onde era tal a sua  nar a Escola de Aviação «Almirante Gago
         abundância que se dizia poder apanhar-se  Coutinho» que formou dezenas de piloto s,
         lançando cestos à água, foram o principal  mecânicos e artífices de aviação, até à sua
         destino dos marinheiros aveirenses. E o ba-  integração na Força Aérea em 1953. Hoje,
         calhau foi, no século XVI, uma mercadoria  quando a Marinha volta a dispor de meios
         de uma riqueza imensa, que não passou  aéreos, a imagem do Centro de S. Jacinto
         despercebida aos reis de Portugal, dali ti-  é como que uma miragem de um perío-
         rando enormes proveitos. Entendemo-lo  do épico dominado pelo pioneirismo de
         facilmente recordando que a possibilidade  gente generosa, que arriscou e, por vezes,
         de obter um pescado facilmente conservá-  sacrificou a vida em nome do que era pou-
         vel, seco ao ar ou salgado, era a forma de  co mais do que um sonho. Um sonho que
         alimentar as populações do interior da Eu-  não posso deixar de classificar como um
         ropa, a quem estava vedado o consumo de  verdadeiro sonho de marinheiro: daqueles
         carne por cerca de 150 dias no ano. A nossa  que não têm limites.
         historiografia sobre o século XVI privilegia   Regressar a Aveiro para comemorar o
         as viagens para a Índia, mas a Terra Nova  Dia da Marinha é, pois, uma homenagem
         foi o destino de centenas de navios por ano,  também para esses homens que deram
         numa actividade que só decaiu quando os  corpo a um Centro da Aviação Naval,
         ingleses tomaram conta do Atlântico Norte,  onde funcionou a escola que recebeu o
         na sequência de uma longa disputa com Fi-  nome do mais ilustre de todos eles: aque-
         lipe II, rei de Espanha e de Portugal.  le que viria a descobrir e aperfeiçoar uma
           A laguna fechou-se – como foi dito – no  forma rigorosa e científica para aplicar
         final do século XVI ou princípio do XVII e  na aviação o método de navegação que
         assim viria a permanecer até 1808, quando  aprendera a usar no mar, viabilizando as
         foi aberta artificialmente a Barra que ainda  grandes viagens aéreas sem referências
         hoje conhecemos. Esta fase corresponde a  visuais em terra. Refiro-me ao Almiran-
         um certo declínio de Aveiro, que Pombal  te Gago Coutinho de que se comemora
         tentou contrariar com a sua elevação a cida-  este ano um século e meio sobre o seu
         de em 1759, procurando reavivar o comér-  nascimento.
         cio marítimo e, sobretudo, a exploração do
         sal, que continuava a ter uma enorme pro- AS COMEMORAÇÕES
         cura nacional e internacional. Mas a cidade  DO DIA DA MARINHA
         só voltaria a crescer no século XIX, desen-  O contexto de homenagem às gentes
         volvendo-se num formigueiro de salinas, de  que, ao longo dos séculos, foram a alma
         estaleiros e fervilhando numa enorme ac-  da nossa Marinha criou uma tradição de
         tividade marítima que veio até o presente,  enorme ligação a essas populações, du-
         e que teve outro momento alto quando do  rante esta grande festa anual. Assim, a
         recrudescimento da Grande Pesca (Faina  cidade de Aveiro teve ocasião de assistir
         Maior) do bacalhau, a partir dos anos 20  a uma exposição de actividades e depar-
         do século passado.                 tamentos que foi inaugurada no dia 15
           A Marinha Portuguesa, forjada como foi  de Maio, uma semana antes das cerimó-
         nestas comunidades ligadas ao mar e à acti-  nias mais significativas. Dividida em pó-
         vidade marítima, desde os tempos mais an-  los instalados em três locais diferentes,
         tigos, é com elas que deve comemorar a sua  os visitantes tiveram ocasião de assistir a
         festa anual. E assim tem feito todos os anos,  uma mostra da estrutura e da acção quo-
         escolhendo locais onde uma festa de mari-  tidiana da Marinha, nalguns casos com a
         nheiros tem um particular significado. Avei-  possibilidade de participação e a interac-
         ro é, certamente, um desses locais como o  tividade dos visitantes. Um desses pólos
         demonstra a sua história feita na comunhão  foi instalado nos Paços do Concelho, com
         íntima com o mar e a ria, numa permanen-  secções representativas das actividades

















         20  JUNHO 2009 U REVISTA DA ARMADA
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