Page 14 - Revista da Armada
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com a determinação de eventuais obras adi- nos meados do século passado) seguido da           da contentorização, do que o possível na Gola-
                                                                                              da merecedor da nossa concordância.
cionais de correcção que se tornem necessá- decisão de se alargar o Canal de Panamá para
                                                                                              A VISÃO DE UM EX-ADMINISTRA-
rias face a este tipo de intervenção.   a sua passagem (2014) originando consequên-           DOR DO PORTO DE LISBOA

                                        cias para uma segunda revolução neste tipo              A minha intervenção tenta esclarecer dois
                                                                                              pontos: (1) A importância da preservação do
A VISÃO DE UM COMANDANTE de transporte: o igual contínuo aumento dos                          porto de Lisboa como motor de desenvolvi-
DA MARINHA MERCANTE                     contentores em serviço (Fig. 3).                      mento; e (2) Visão do Portugal marítimo.
                                          Portugal tem, na proximidade da sua costa,
                                                                                                O porto de Lisboa é fundamental a nível
Quando em 1956 o americano Malcon o ponto de cruzamento da maior intensidade                                 local, mas também nacional.
                                                                                                             Representa 20% da carga to-
Maclean fez o 1º embarque, em navios, das de tráfego marítimo mundial originado pelo                         tal processada nos portos por-
                                                                                                             tugueses e 44% da carga em
suas grandes caixas normalizadas, onde ha- encontro das rotas das Américas para a Eu-                        contentores a nível nacional.
                                                                                                             A cidade e a região sairiam
bitualmente transportava as suas mercado- ropa e África-Ásia. Factor este que deve levar                     muito prejudicadas se o porto
                                                                                                             deixasse de processar carga e a
rias, estávamos longe de pen-                                                                                mesma fosse transferida para
                                                                                                             Setúbal e Sines (Fig. 5).
sar na grande revolução que                                                                                     Contudo o porto definha a
                                                                                                             olhos vistos. Por três razões
tal originaria nos transportes                                                                               principais:
                                                                                                                Em primeiro lugar, creio que
globais, muito em especial o                                                                                 os governos recentes não têm
                                                                                                             entendido a importância do
marítimo.                                                                                                    porto de Lisboa; umas vezes
                                                                                                             por fuga ou omissão, como foi
A normalização das dimen-
                                                                                              o caso do cancelamento do concurso para a
sões dos designados contento-                                                                 obra do fecho da golada; outra, por “desva-
                                                                                              rio” legislativo, como julgo ser o prolonga-
res veio facilitar a sua utilização                                                           mento do terminal deAlcântara. Em segundo
                                                                                              lugar, não é do agrado das autarquias que se
nos transportes marítimos, nos                                                                opere a carga no porto de Lisboa. Em terceiro
                                                                                              lugar, opiniões defendem que o porto de Lis-
ferroviários e rodoviários (ex-                                                               boa deveria ser destinado, somente, a navios
                                                                                              de grande Turismo e Náutica de recreio.
cluindo os aéreos que têm ou-
                                                                                                Na minha opinião nada de mais errado.
tras características muito espe-                                                                Aimportância do porto de Lisboa, no plano
                                                                                              económico é fundamental para a competiti-
cíficas), permitindo o seu fácil                                                               vidade económica da cidade e da região em
                                                                                              que se insere. É portanto necessário manter a
movimento, empilhamento e                                                                     carga no porto de Lisboa construindo para o

uma estiva fixa uns nos outros.                                                                                         efeito um novo termi-
                                                                                                                       nal junto à foz do rio
A estas características básicas                                                                                        Tejo (Trafaria) e para
                                                                                                                       tal ter-se-á de proceder
acresceu serem construídos de                                                                                          aos estudos conducen-
modo a se encherem e despeja- Fig. 3 – Novos porta-contentores e cais.                                                 tes ao fecho da golada
                                                                                                                       do Tejo.
rem rapidamente e após fechados manterem os responsáveis pelos portos a fazer face à si-
                                                                                                                         Os interesses do
as mercadorias protegidas e seguras.    tuação prevista.                                                               todo Nacional devem
                                                                                                                       prevalecer sobre as
Apesar de todas as contestações, que tais Lisboa, se quiser entrar no desafio dela ad-                                  conveniências das au-
                                                                                                                       tarquias, por muito
caixas sofreram, o número de contentores vindo, com os navios de mais de 300m e de                                     importantes que estas
                                                                                                                       sejam.
posto em serviço cresceu ano após ano e nos 10.000 TEUS, deve pensar em construir um
                                                                                                                         Será possível que
finais de 2009 circulavam em todo o globo terminalconsonanteaosparâmetrosqueosor-                                       exista uma cidade
                                                                                                                       possuidora de um
mais de 200 milhões de TEUS (medida de ganismosinternacionaisrecomendam;situado               porto como o de Lisboa, que tenha abdi-
                                                                                              cado tout court da exploração da carga no
contentor de 20 pés de comprimento).    numa zona ampla e desobstruída, com fundos            seu porto?
                                                                                                No entanto deve atender-se aos movi-
Face a tal revolução os portos adaptaram os de 16m ou mais, cais com condições e equipa-      mentos que visam a limitação da operacio-
                                                                                              nalidade do porto; reivindicação das popu-
seus cais com espaços necessários ao seu par- mentos para dois navios gigantes, localizado    lações, das Autarquias e ainda à decisão do
                                                                                              Governo com a construção da terceira tra-
queamento; substituíram os velhos guindas- em zona desimpedida do denso urbanismo e

tes por pórticos e outros equipamentos para rápido e fácil acesso ao Mar Alto (Fig. 4).

o seu manuseamento e procuraram ampliar Considerando os parâmetros acima é nosso

as vias de comunicação para um melhor es- parecer que só na zona da Golada, Trafaria –

coamento dos mesmos.                    Bugio, se poderão encontrar as condições para

A maior parte dos

navios de carga ge-

ral foi substituída por

novos navios porta-

contentores especifi-

camente construídos

para o seu embarque

escorreito tanto nos

porões como acima do

convés.

Alguns dos então

mais importantes por-

tos do mundo, como

Londres, Nova Iorque,

Roterdão, Antuérpia,

Marselha, de entre ou-   Fig. 4 – Futuras instalações do Porto de Gdansk.
tros, deixaram mesmo

os seus velhos cais e construíram amplos e seexecutarumterminaldetaiscondições,caso

modernos terminais fora das suas zonas ur- se decida voltar a fechar as areias que do local,

banas, nas proximidades do MarAlto, na bus- há décadas, foram dali removidas.

ca de melhores fundos e maiores facilidades Oscustosdaoperacionalidadecomosgran-

para a manobra e segurança dos navios.  des navios – consumos, manobras, seguros,

Nos últimos anos assistimos a um crescente estadias, etc. – dificilmente aceitariam que se

aumento no tamanho dos porta-contentores projectasse no porto de Lisboa um local mais

(similar ao que se passou com os petroleiros amontante,paraumterminaldanovageração

14 ABRIL 2010 U REVISTA DA ARMADA
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