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Semelhanças e Relações
entre Nápoles e Portugal
GEOGRAFIA, CLIMA E POVO Mapa do Mediterrâneo onde são bem patentes as mandia, respectivamente – e conquistaram aos
semelhanças geográficas entre Portugal e o anti- Mouros os seus domínios.
Assemelhanças entre Portugal e o go reino de Nápoles. A vermelho estão os reinos/
antigo reino de Nápoles/Sicí- impérios que dominaram Nápoles e a laranja os Na verdade, a relação histórica entre as duas
lia começam com as respectivas que o invadiram. nações vem de época mais remota, quando
geog rafias. Ambos têm dimensões idênticas, Olisipo e Neapolis (a antiga Nápoles) estavam
cerca de 550 km de extensão Norte-Sul e 200 Lisboa e Nápoles. ligadas pelas rotas marítimas gregas e, depois,
km de largura Este-oeste. Tendo aproxima- romanas.Ambas antigas colónias gregas (em-
damente os mesmos limites de latitude (Por- Virgílio e Camões. bora Lisboa tenha começado por ser um en-
tugal entre os 42º10’N e os 36º60’ N; e o an- treposto fenício), foram fundadas na mesma
tigo reino de Nápoles entre os 42º55’ N e os Rogério I da Sicília e Afonso I de Portugal. época (por volta do século VIII a.C.).
36º40’ N) os dois territórios têm climas idên- Dona Teresa como Elvira, a mulher de Rogé-
ticos, com temperaturas amenas e, sobretu- rio, eram filhas de Afonso VI de Leão. E tanto E depois vieram os Lusitanos. Guerreiros
do, muito sol. o Conde D. Henrique, pai do nosso primeiro afamados pela sua coragem, eram frequente-
Rei, como Rogério, tornados cunhados por mente recrutados como mercenários e, duran-
Também as duas capitais são semelhan- via dos respectivos casamentos, pertenciam a te a Segunda Guerra Púnica, muitos andaram
tes: cidade marítima como Lisboa, Nápoles famílias provenientes do Norte, de territórios pela Campânia (região a que Nápoles perten-
estende-se sobre diversas colinas e é virada hoje pertencentes à França – Borgonha e Nor- ce) integrados nos exércitos cartagineses de
ao Sul. E, tal como Lisboa, Nápoles é sujei- Aníbal Barca.
ta a terramotos (a que se juntam as erupções
do Vesúvio). Depois da queda do Império Romano do
Ocidente, a Lusitânia, renascida como Por-
Outra zona de confluência é o idioma. En- tugal, só viria verdadeiramente a reencon-
tre a língua portuguesa e o dialecto napolita- trar o Mar durante o reinado de D. Dinis, que
no (muitos estudiosos consideram-no uma em 1317 convidou o genovês Manuel Pessa-
língua) existem muitas palavras e sons co- nha para organizar a Armada portuguesa. A
muns que não se encontram nem no Italia- cooperaçãoentre Portugal e a república de Gé-
no nem no Castelhano, como, por exemplo, nova manteve-se até ao período das grandes
os artigos definidos “o” e “a”, o som “sh” do Descobertas dos séculos XV e XVI. Por essa al-
“s” antes das consoantes mudas, a típica ex- tura, uma outra república italiana, a “sereníssi-
pressão “Há-de” (em Napolitano “Ha da”) e ma” Veneza encontrouPortugal como rival na
as palavras “gaiola” (adoptada directamente disputa do rico comércio com o Oriente (acaba-
do Português) e “cá” (em Napolitano “ccà”). ria derrotada quando a descoberta do caminho
E encontramos Portugal também no nome marítimo para a Índia por Vasco da Gama, em
das laranjas (purtuallo)1. 1498, fez deslocar para o Atlântico as principais
ligações comerciais entre a Europa e a Ásia).
Até n’Os Lusíadas encontramos um ponto
de contacto: sabendo que Camões recebeu Mas se o reino napolitano parece ter esta-
uma notória influência de Virgílio e que, por do ausente da epopeia marítima portuguesa,
sua vez, o famoso escritor romano se inspirou basta recuarmos até 1415, ano da conquista de
para a Eneida durante a sua longa estadia em Ceuta para encontrarmos uma curiosa coinci-
Nápoles, podemos dizer que também o maior dência: antes da expedição militar, espiões por-
poeta português teve uma parcela de inspira- tugueses encarregaram-se de difundir boatos
ção napolitana. sobre o destino da esquadra que se preparava,
de modo a despistar os nossos rivais aragone-
Por conseguinte, não é de admirar que en- ses e castelhanos. Um dos boatos referia que os
tre os dois povos existam tantas semelhanças navios se dirigiam às costas italianas com uma
decarácter,sobretudonadespreocupaçãoe na embaixada encarregada de propor o matrimó-
desorganização, embora nessas características nio entre o príncipe D. Duarte e a rainha viúva
os napolitanos nos levem a palma e, por outro Joana II de Nápoles.
lado, os portugueses surjam demasiado sérios
quando comparados com o povo partenopeu2. Mas se a vocação de Portugal era atlântica e
não mediterrânica, não deixamos de encontrar,
HISTÓRIA nas suas particulares maritimidades, outras
semelhanças entre os dois povos: se os portu-
Portugal e o antigo reino de Nápoles/Sicí- gueses souberam adaptar o astrolábio ao uso
lia partilham o berço histórico: no mesmo ano a bordo dos navios, terão sido os napolitanos
em que D. Afonso Henriques era aclamado – ou melhor, os amalfitanos – a adaptar a agu-
como Rei de Portugal pelos seus soldados de- lha magnética à navegação marítima cerca de
pois da Batalha de Ourique (1139), o norman- três séculos antes, ambos instrumentos indis-
do Rogério era reconhecido pelo Papa como pensáveis para as longas viagens oceânicas
Rei da Sicília. que se preparavam.
Além da coincidência histórica, os dois mo- Entre os monarcas que mais incentivo de-
narcas estavam, ainda, ligados por laços de pa- ram às explorações marítimas, não podería-
rentesco: tanto a mãe de D.Afonso Henriques, mos deixar de mencionar o rei D. João II, que,
22 AGOSTO 2012 • Revista da Armada entre 1483 e 1484, se viu forçado a submeter,