Page 25 - Revista da Armada
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meira vez O Verda-                                                                                                                   passado marcado pela
deiro Método de Estu-                                                                                                                tutela das grandes po-
dar de Luís António                                                                                                                  tências continentais,
Verney (1713-1796).                                                                                                                  sempre manteve uma
Estabelecido em                                                                                                                      forte ligação ao co-
Roma desde 1736, o                                                                                                                   ração do continente
célebre humanista                                                                                                                    europeu. Só mesmo
português dirigiu-se                                                                                                                 quando os dois reinos
a Nápoles em 1746,                                                                                                                   se uniram tempora-
de modo a evitar a                                                                                                                   riamente sob a coroa
apertada censura ro-                                                                                                                 espanhola – cujo im-
mana. Convém dizer                                                                                                                   pério teve um carácter
que naqueles tempos                                                                                                                  simultaneamente con-
a Imprensa napolita-                                                                                                                 tinental e ultramarino
na era mundialmente    D. Maria Leopoldina, Fernando IV e D. Maria II.                                                               - os dois povos terão

famosa pela sua liberdade.                        cismo, um movimento de libertação iniciado tido a oportunidade de estabelecer uma con-
Podemos dizer que o intercâmbio cultural com a revolta dos “Quatro Dias de Nápoles” vivência mais sólida, a qual se viria a manter
entre Nápoles e Portugal começou verdadei- contra os ocupantes alemães, enquanto Portu- até à integração de Nápoles no reino da Itália.
ramente no século XVII. Entre os grandes ar- gal celebra a “Revolução dos Cravos” de 1974. Naturalmente, muito do que é dito neste
tistas italianos que influenciaram o Barroco No entanto, ambas as efemérides evocam um breve artigo pode e deve ser desenvolvido por
português,encontram-sedoisescultoresnapo- valor comum: a Liberdade.                                 quem tenha interesse em estudar o assunto e,
litanos: Francesco Borromini e Gian Lorenzo E uma ligação afectiva permaneceu. Muitos sobretudo, se sinta imbuído de um genuíno
Bernini (através do seu discípulo Ercole Ferra- partenopeus recordarão ainda a exibição de sentimento de amizade luso-napolitano.
ta), que deixaram as suas marcas, respectiva- Amália Rodrigues em Nápoles, em 1973 e de- EntreNápolesePortugalhámaissemelhan-
mente, no altar da igreja de S. Bento, em Lis- certo não esquecerão a sua soberba interpreta- ças e relações do que se pode imaginar, mas,
boa (1634) e na Fonte de Neptuno, no palácio ção d’ “A Tarantella” (entre outras canções) em acima de tudo, há a amizade entre dois povos
nacional de Queluz (1677). Já no século XVIII dialectonapolitano.ADivavoltariaacantarem irmãos, quase gémeos, que jamais se domina-
(1719) encontramos o arquitecto siciliano Filip­  Nápoles ainda um par de vezes (1974 e 1996).      ram ou combateram entre si.
po Juvarra envolvido no concurso para o                                                                                              
convento de Mafra, embora o seu projec-
to não tenha sido escolhido por D. João V.                                                                                           J. Moreira Silva
                                                                                                                                     CFR

Em 1721 a corte portuguesa conheceu                                                                           Notas
                                                                                                                 1 À semelhança do que sucede na Turquia (por-
o músico napolitano Domenico Scarlatti,                                                                       takal) e na Grécia (portokali), entre outros países, me-
convidado por D. João V para ensinar mú-                                                                      mória do séc. XVI, em que a laranja doce foi trazida
sica à sua filha Maria Madalena Bárbara.                                                                      pela primeira vez da China para a Europa a bordo
Em 1752 foi a vez de D. José I de convidar
                                                                                                              das naus portuguesas.
David Perez, que, renunciando a uma car-                                                                         2 De Partenope, nome dado a Nápoles pelos fun-
reira internacional, permaneceu em Portu-                                                                     dadores gregos.

gal até à sua morte, em Lisboa, no ano de                                                                     Bibliografia
1778. Com Perez, Portugal teve a oportu-                                                                         CAPRARA, Gilda, G. Caprara, António Vieira, Na-
nidade de diversificar o repertório musi-         Amália Rodrigues, em Nápoles, interpretando “A Tarantella”  poli e il Portogallo: alcune ipotesi di ricerca, in «Archivio
cal do reino – demasiadamente religioso           (1973).                                                     Storico per le Province Napoletane», CXXVI, Società
– com um pouco de ópera italiana.                                                                             Napoletana di Storia Patria, Nápoles, 2008

                                                                                                                 CASSITTO, Luigi Vincenzo, Per la solenne inco-
Uma das alunas de Perez foi a famosa can- Já em pleno século XXI, a cidade aguarda a ronazione di Sua Maestà D. Giovanni VI..., ragionamento re-
tora lírica Luísa Todi (1753-1833). Casada com    requalificação da Piazza Municipio e as suas      citato... nella festa per detta faustissima occasione celebrata in
o violoncelista napolitano Francesco Saverio      novas estações de metro, segundo o projecto       Napoli nella real chiesa di S, Ferdinando dalla legazione porto-
Todi em 1769, conheceu grande sucesso in-         conjunto de Álvaro Siza Vieira e Eduardo Sou-     ghese presso S.M. il Re delle Due Sicilie, Nápoles, Stamperia
                                                                                                    di Angelo Coda, 1817
ternacional, de Lisboa a São Petersburgo, sem to Moura. Embora esta obra tenha suscitado ESPARTEIRO, António Marques, O Almirante Mar-
excluir, naturalmente, Nápoles. Contratada        várias polémicas, estas, no fundo, não são di-    quês de Nisa, Lisboa, Edições Culturais da Marinha, 1987
pela corte napolitana em 1796, terminou a sua     ferentes das que, de um modo geral, surgem           GLEIJESES, Vittorio, La storia di Napoli dalle origini ai
carreira nesta cidade 3 anos depois, após o que   em todas as intervenções que a cidade tem so-
regressou a Portugal.                             frido ao longo dos tempos.                        nostri giorni, Nápoles, Società Editrice Napoletana, 3ª
E tal como Nápoles tem o “San Carlo”, tam-                                                          edição, 1978

                                                                                                       MARTINEZ, Pedro Soares, História Diplomática de
                                                                                                    Portugal, 3ª edição, Lisboa, Almedina, Setembro de 2010
                                                                                                       MASIELLO, Nino, Il Mercante: L’avventura di don
bém Lisboa tem o seu teatro “São Carlos”,         CONCLUSÃO                                         Miguel Vaaz, un portoghese nel Regno di Napoli, Nápoles,
inaugurado em 1793 com a ópera “La Balerina                                                         Massa, 2010
Amante” do compositor napolitano Domeni-            É difícil encontrar uma verdadeira relação
co Cimarosa. Embora a sua fachada nos faça        de causa-efeito entre as semelhanças culturais       SERRÃO, Joaquim Veríssimo (dir.), História de Portugal,
                                                                                                    19 vol., s.l., Editorial Verbo, 1979-2007
recordar o “Teatro alla Scala” de Milão, o seu    e de carácter entre portugueses e napolitanos.       STRIANO, Enzo, Il resto di niente. Storia di Eleonora de
arquitecto também se inspirou na mítica casa      Talvez a herança greco-romana comum, o cli-       Fonseca Pimentel e della rivoluzione napoletana del 1799, Ná-
de ópera napolitana.                              ma mediterrânico e a influência norte-africana    poles, Avagliano 1999

DEPOIS DA UNIFICAÇÃO DA ITÁLIA                    o possam explicar em parte.                       Documentos
                                                    No entanto, embora as suas histórias como          ARQUIVO HISTÓRICO-DIPLOMÁTICO DO MINIS-
  Não se encontram muitos sinais de relacio-
                                                  nações tenham tido vários pontos de contacto,     TÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS
                                                  nunca houve entre elas uma verdadeira con-           Correspondência da Legação Portuguesa em Nápoles,

                                                                                                    caixa 159 (1855-1860)
namento específico entre Nápoles e Portugal fluência e mesmo as respectivas maritimida- Correspondência do Consulado de Portugal em Ná-
depois da unificação da Itália, mas ainda en-     des se revestiram de caracteres completamente     poles, caixa 742/743 (1840-1924)
contramos algumas coincidências, como a ce-       diversos. Isto deveu-se, essencialmente, ao fac-     BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL
lebração do 25 de Abril. AItália festeja o 25 de  to de Portugal ter uma vocação predominan-           Instrucçam secreta que o Senhor Rey Dom Joam IV deu ao

                                                                                                    Pe. Antonio Vieyra da Companhia de Jesus, mandando-o à cúria
Abrilde1945,quandofoilibertadadonazi-fas- temente atlântica, enquanto Nápoles, com um de Roma, 14 de Outubro de 1649, BN COD. 1540

                                                                                                              Revista da Armada • AGOSTo 2012 25
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