Page 17 - Revista da Armada
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REVISTA DA ARMADA | 482
A GÉNESE
DA MARINHA
PORTUGUESA
(1147-1325)
PARTE 2
ESTABILIZAÇÃO E
ORGANIZAÇÃO (1190-1325)
Recuo e Recuperação Fig. 6 - O rei D. Dinis, grande organizador e impulsionador da Marinha portuguesa (litografia de Auguste Toussaint
Lecler, 1829).
A conquista de Silves dá origem a uma
contra-ofensiva almóada que retomará que foram desfeitos para a construção de simus in Christo” de Gregório IX aos cris-
aquele porto, passados apenas três anos máquinas com que tomaram o castelo de tãos de Portugal para acompanhar o seu
sobre a sua conquista, e levará Portugal Alcácer” fiquem em Portugal, o que, se- rei a “combater, por terra como por mar,
a perder, num ápice, todos os territórios gundo Vasconcellos e Menezes, terá, por- os inimigos da cruz”. Entre os navios da
conquistados a Sul do Tejo (à excepção da ventura, contribuído para a aquisição de frota estaria, provavelmente, uma arma-
praça de Évora). A Leste, também os cas- tecnologia marítima. da de galés (que interditaria o espaço ma-
telhanos se verão a braços com uma in- rítimo a eventuais reforços inimigos), uma
vasão moura, em resposta às suas acções Em 1238, após avanços no Alentejo, D. vez que neste reinado já temos, efectiva-
militares contra Sevilha, que culminará, Sancho II empreende a conquista de Mér- mente, registos da sua construção2. Ou-
em 1195, no desastre de Alarcos. Só em tola1 e de Aiamonte, dominando o curso tros navios procederiam, por mar, ao rea-
1212, com a vitória conjunta em Navas de inferior do Guadiana e isolando o reino do bastecimento das hostes cristãs, como o
Tolosa (em que participa um corpo de in- Algarve, a cuja conquista se lança, come- comprova o conselho tomado por D. Paio
fantaria enviado por D. Afonso II), se de- çando por Castro Marim, Cacela e Tavira, Peres Correia, aquando da conquista de
tém a ofensiva sarracena e se abre aos e acabando com a emblemática recupera- Tavira, com um tal Garcia Rodrigues, que
cristãos a bacia do Guadalquivir, embora ção de Silves. Nestas operações, que con- faria trato de mercadorias com cristãos e
com vantagem para Castela, que não tar- tornam a costa Sul desde o rio Guadiana, mouros daquelas paragens.
dará a lançar-se sobre ela. Será, porventu- a Esquadra terá, decerto, desempenhado
ra, neste momento que Portugal verá limi- um papel importante, o que parece ser No entanto, as querelas entre o Rei e a
tada a sua eventual expansão para Leste. confirmado pela bula papal “Cum Caris- nobreza acabarão por impedir a conquista
Não se registam acções navais portu-
guesas de monta neste período, pois os
mouros parecem andar mais empenha-
dos em transportar tropas para a Andalu-
zia. É, no entanto, de registar, em 1211,
por ocasião das primeiras Cortes de Coim-
bra, a Lei dos Salvados, que pretende li-
mitar as rapinas das populações costeiras
sobre os naufrágios e denota a preocupa-
ção da Coroa com o tráfego marítimo que
já então se faz sentir na costa portuguesa.
Já em 1217, é de assinalar a retomada
de Alcácer do Sal com o auxílio de uma
frota de cruzados (originalmente compos-
ta de 150 naus, embora muitas se tives-
sem perdido num temporal). Não se co-
nhece a dimensão da frota portuguesa
enviada na ocasião, embora se refira a to-
mada de uma nau com 200 homens por
galés mouras (de um total de 10, integra-
das numa frota) enviadas em socorro da-
quela praça. Na altura, o Papa acede a que
“os cruzados pobres e os dos oito barcos
FEVEREIRO 2014 17