Page 16 - Revista da Armada
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10 MAR TERRITORIAL
O REGIME DA CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS
SOBRE O DIREITO DO MAR DE 1982
PARTE 4
DIREITO DO MAR E DIREITO MARÍTIMO
Mar Territorial (MT) é o espaço marítimo de referência sendo de sublinhar, pela sua importância material, o estabe-
O do exercício da nossa soberania como Estado Costeiro, lecido quanto aos deveres do Estado Costeiro e aos dois prin-
atento o princípio de extensão definido no nº 1, do artigo cípios que constam das duas alíneas do nº 1 do artigo 24º: o
2º, da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar da proibição de impor a navios estrangeiros obrigações que
(CNUDM), o qual – observado o preceituado nos artigos 3º e correspondam à negação ou limitação daquele direito, e o que
4º desta Convenção – deve ser juridicamente conjugado com se refere à proibição da discriminação em função de determi-
o estatuído na alínea a), do nº1, do artigo 84º da Constitui- nada bandeira, sendo esta uma premissa nuclear em termos
ção da República Portuguesa (CRP), com o estabelecido na de avaliação no quadro da actual geopolítica marítima³.
alínea a), do artigo 3º, da Lei nº 54/2005, de 15NOV, e com Em termos de exercício dos poderes públicos, é absolutamente
o definido nos artigos 2º, 5º e 6º, todos da Lei nº 34/2006, fundamental atentar na forma como é delimitado na CNUDM o
de 28JUL. O MT é, portanto, um espaço onde a soberania direito de passagem de navios de outras bandeiras, factor que
nacional se exerce de forma exclusiva, o que significa que constitui um pressuposto de intervenção das autoridades do
não pode ser objecto de qualquer exercício soberano por Estado Costeiro, impedindo a imposição de determinações que
outro Estado. extrapolem o quadro do direito internacional ou que, na prá-
A CNUDM dedica-lhe toda a Parte II, com as suas 4 Secções¹, tica, correspondam a abusos de exercício que podem ter con-
sendo utilizado um método regulador em que se estatui o sequências extremamente nefastas até para o relacionamento
regime dos limites do MT e as bases da sua marcação geo- bilateral entre Estados. Esta questão está directamente relacio-
gráfica, estabelecendo-se nos artigos 17º a 26º, no âmbito nada, por exemplo, com os regimes estabelecidos nos artigos 3º
do tratamento jurídico da passagem inofensiva, o conteúdo a 5º do Decreto-Lei nº 43/2002, e nos nºs 2 e 4, do artigo 13º,
material do exercício dos poderes que o Estado Costeiro do Decreto-Lei nº 44/2002, ambos de 2MAR, e bem assim com
detém neste espaço, bem como se define o âmbito da regu- o definido nos artigos 13º e 14º da Lei nº 34/2006 e no artigo
lamentação que aquele pode fazer aprovar e os quadros dos 2º do Decreto-Lei nº 370/2007, de 6NOV⁴, que caracterizam, e
seus deveres e direitos de protecção. Estes são normativos densificam, quadros de exercício da Autoridade Marítima Local,
fundamentais para a boa percepção funcional dos limites de aqui assumida como autoridade com poderes públicos inter-
execução dos poderes soberanos. vindo a título de Estado Costeiro.
O MT tem uma largura máxima de 12 milhas náuticas, esta- Isto é, os artigos 18º e 19º da Convenção definem o quadro
tuindo a alínea e), do artigo 4º, da mencionada Lei nº 34/2006, jurídico internacional do que pode ser permitido a título de
que a milha náutica é uma distância que corresponde a 1852 passagem⁵, sendo essencial para as autoridades do Estado
metros. O nº 2, do artigo 2º, da Convenção estabelece que a Costeiro ter a percepção de quando a passagem deixa de ser
soberania que se exerce no MT se estende “ao espaço aéreo tida como inofensiva, o que permite uma intervenção mais
sobrejacente ao mar territorial, bem como ao leito e ao sub- robusta nos termos enquadrados e estabelecidos pelo nº 1, do
solo deste mar”. seu artigo 25º, quando estiverem em causa qualquer uma das
Os poderes que o Estado Costeiro exerce no MT² são exclu- 11 situações estabelecidas nas alíneas a) a k), do nº 2, daquele
sivos, na premissa que supra se aferiu, mas não são exercidos artigo 19º. Mas a limitação de cariz substantivo está no corpo
de forma plena, existindo limitações objectivas que o direito deste nº 2, quando a Convenção estatui que: “A passagem de
internacional do mar estabelece quanto à navegação de um navio estrangeiro será considerada prejudicial à paz, à boa
navios de outras bandeiras. É por esta razão que a Convenção ordem ou à segurança do Estado Costeiro, se este navio reali-
dedica ao direito de passagem inofensiva toda a Subsecção A zar, no mar territorial, alguma das seguintes actividades. (…)”.
da Secção 3, em especial os artigos 17º a 20º, aprofundando É, portanto, esta a matriz do que pode ter assumido como
algumas características do seu regime nos artigos 21º a 26º, sendo uma actividade ilícita, não permitida pela Convenção.