Page 225 - Revista da Armada
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Como poderemos
                          Como poderemos



           ter mar sem submarinos?
           ter mar sem submarinos?







         INTRODUÇÃO                         aumento de pressão demográfica vinda do  viabilizem a instalação de outros interes-
                                            norte de África, os constantes problemas  ses. Por isso, é preciso ter meios de defesa
               aquisição dos novos submarinos  no médio oriente e na região transcau-  e fiscalização integrados numa verdadeira
               tem gerado alguma polémica   casiana e o terrorismo cada vez mais  estratégia marítima onde também não seja
         Aexpressa em vários artigos e entre-  sofisticado. A título de exemplo, parece-  esquecida a exploração económica do mar
         vistas. Enquanto uns apoiam a aquisição,  -me oportuno referir, por exemplo, que a  e a investigação científica.
         visivelmente orientados por uma visão  Líbia há pouco tempo estava interessada  É provável que nos próximos anos sejam
         estratégica de defesa e segurança, outros,  em mísseis norte-coreanos com alcance  desenvolvidos grandes esforços na explo-
         orientados por condicionalis-                                                  ração do chamado “espaço in-
         mos económicos, refugiam-se                                                    terior” (oceanos). A verdade é
         apenas na elevada soma que                                                     que, volvidas três décadas des-
         este empreendimento irá absor-                                                 de que o homem pisou a Lua,
         ver.                                                                           os oceanos ainda continuam a
           Efectivamente, parece ser                                                    esconder um novo mundo.
         mais fácil argumentar com                                                      Durante o período da guerra
         base no que se poderia fazer                                                   fria, a Marinha Americana e a
         com o dinheiro que os subma-                                                   CIA desenvolveram submari-
         rinos vão custar. É muito fácil                                                nos capazes de colocarem
         usar uma linguagem de econo-                                                   escutas clandestinas em cabos
         mia familiar para atacar a                                                     submarinos (1), inspecciona-
         necessidade dos submarinos,                                                    ram submarinos soviéticos
         dizendo que com esse dinheiro                                                  afundados a mais de cinco
         se poderia adquirir um sem                                                     quilómetros de profundidade
         número de bens na área da                                                      (2) e até recuperaram bombas
         saúde e do bem-estar. É pena                                                   atómicas (3) perdidas a cerca
         que não façam também contas                                                    de mil metros da superfície.
         às contrapartidas que a industria nacional  suficiente para atingir Portugal (um país  Com o final da guerra fria, muita da tecno-
         irá absorver. É preocupante que este tipo  da Europa).  O despertar desta consciência  logia militar passou a ser partilhada com a
         de argumentação tenha sido usado irres-  levou a que muitos políticos europeus pas-  sociedade civil, o que permitiu, a título de
         ponsavelmente por alguns políticos. Dado  sassem a dar valor à ideia do General  exemplo, a filmagem do Titanic a quase
         que se chegou a um momento decisivo na  Charles de Gaulle de criar uma zona de  quatro mil metros de profundidade. Esta
         apreciação do projecto de aquisição dos  segurança do Atlântico aos Urais. Esta  tecnologia permite que actualmente se
         novos submarinos nunca é demais apre-  visão também é partilhada pela própria  possa descer até aos sete mil metros de
         sentar uma reflexão sobre a importância  UE, que quer ter capacidade para resolver  profundidade e está a ser usada na recu-
         dos submarinos no quadro de uma estraté-  problemas regionais e está a estudar a pos-  peração de tesouros afundados, prospec-
         gia nacional.                      sibilidade da criação de uma força de  ção de petróleo e minérios, investigação
                                            reacção rápida, composta por 50 a 60 mil  cientifica e até mesmo às viagens de turis-
         OS DESAFIOS DO FUTURO              homens, altamente equipados e dotados  mo. A título de exemplo, recorde-se que no
                                            de mobilidade estratégica. Os EUA tam-  verão passado esteve nos Açores um navio
           A queda do muro de Berlim não trouxe  bém estão interessados nesta nova estraté-  russo que levava turistas nos seus subma-
         a paz em que muitos acreditavam, abriu  gia, já que assim podem canalizar recursos  rinos até ao fundo do mar.
         sim uma nova era de incertezas onde  para outras zonas de interesse, nomeada-  Em Portugal, também tem sido desen-
         parece ser mais difícil prever o desen-  mente para o Pacífico. Também é certo que  volvido algum trabalho na área da robóti-
         cadear de conflitos. Aliás, a consciência de  os orçamentos para a defesa terão de au-  ca subaquática, mais especificamente a
         que vivemos uma época de potenciais  mentar, se a Europa quiser ter forças  equipa do Prof. António Pascoal, professor
         crises até levou a NATO a assumir uma  armadas com capacidade de intervenção  do Instituto Superior Técnico e investi-
         nova dimensão ampliando o seu carácter  comparável à dos EUA.         gador de Sistemas e Robótica. De entre
         defensivo, para passar a contemplar o  Portugal está intimamente ligado ao mar  outros veículos submarinos, destaca-se um
         direito de ingerência humanitária, as preo-  por laços históricos, culturais, económicos  submarino autómato que foi utilizado no
         cupações relacionadas com o terrorismo, a  e estratégicos. É o mar que valoriza a nossa  levantamento topográfico de fundo no
         sabotagem, o crime organizado e os pro-  posição periférica em relação à Europa.  banco D. João de Castro.
         blemas associados ao abastecimento de  Este mar que nos deu a identidade tem-  Portugal tem uma enorme ZEE e pode
         recursos vitais.                   -nos dado também a nossa independência  vir a ter uma Plataforma Continental ainda
           A própria União Europeia tem a cons-  mercê das muitas alianças que Portugal  maior, de acordo com a Convenção de
         ciência dos inúmeros problemas de segu-  assinou ao longo da história.  Mas este  Direito do Mar (Montego Bay). A tecnolo-
         rança e defesa com que se irá debater nos  enorme espaço estratégico que é a nossa  gia está a abrir novas portas para a explo-
         próximos tempos. Entre eles estão as feri-  ZEE tem de ser por nós ocupado de forma  ração do mar. É, desta forma, evidente que
         das abertas no Kosovo e na Bósnia, o  efectiva para evitar vazios de poder que  Portugal precisa de ter meios para patru- ✎
                                                                                        REVISTA DA ARMADA • JULHO 2000  7
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