Page 226 - Revista da Armada
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lhar a três dimensões este enorme pa-  especiais, até ao também muito importante  submarino o estatuto de arma dissuasora
         trimónio.                          treino dos aviões e navios de superfície.   com um enorme potencial. E para quem,
           Para terminar esta introdução fica, para  Quando se fala de submarinos é vulgar  ainda assim, tem dúvidas recordo que há
         reflexão, uma frase de Graham Hawkes,  lembrar o papel que as matilhas de sub-  pouco mais de um ano, na Austrália, um
         construtor do submarino Deep Flight II,  marinos alemães tiveram na Batalha do  torpedo MK48 partiu ao meio e afundou,
         capaz de descer às quatro milhas (7400m)  Atlântico. Também podemos falar do con-  em dois minutos, uma velha fragata desar-
         de profundidade, que disse: “Ainda estão  flito das Falklands/Malvinas em que um  mada. Podemos imaginar o que poderá
         a ser dados os primeiros passos na des-  único submarino argentino Type 209 (San  fazer uma arma mais moderna, mais rápi-
         coberta do fundo do mar, não se sabe o  Luis) conseguiu manobrar e iludir mais de  da, com características “stealth” (evitar
         que se irá seguir, mas por certo que será  15 navios da Royal Navy  conseguindo dis-  detecção), de maior alcance, melhor guia-
         uma coisa em grande, seja ela o que for.”   parar 3 torpedos (embora sem o êxito espe-  mento e capaz de evitar contra-medidas. É
                                            rado). Neste mesmo conflito um submarino  caso para pensar que as forças de superfí-
         A IMPORTÂNCIA DO SUBMARINO         da Royal Navy afundou o cruzador General  cie correm grandes perigos...
                                            Belgrano e, segundo consta, depois disso os
           No âmbito específico da segurança e fis-  navios argentinos nunca mais saíram dos  COMENTÁRIOS FINAIS
         calização, está a ser iniciada a importante  portos. A Guerra do Golfo também teria
         empresa da substituição das corvetas e dos  sido diferente se Saddam Hussein tivesse  O resultado do último conflito nos
         patrulhas. Para a renovação da compo-  uns seis submarinos modernos e bem  Balcãs mostrou que as guerras do futuro
         nente estratégica do sistema de forças da  treinados e colocasse três deles nas margens  são essencialmente guerras tecnológicas.
         Marinha é vital proceder, a curto prazo, à  do Estreito de Ormuz. E se o Irão tivesse  “O ideal da vitória, servido pela imagi-
         substituição dos submarinos e aquisição  comprado os seis Type 209 que tinha nego-  nação humana, leva constantemente a téc-
         de um navio que permita mobilidade  ciado antes de estalar a revolução?  nica à criação de novas armas, cada vez
         estratégica. A importância dos submarinos  A verdade é que actualmente há 47 paí-  mais aperfeiçoadas. Fazer errada aprecia-
         reside no facto de eles serem por si só a  ses a operarem mais de 600 submarinos,  ção das possibilidades da técnica e não
         arma dissuasora por excelência, perante  nucleares e convencionais, desde os SSBN,  avaliar com justeza as consequências das
         fortes e fracos, sendo um importante con-  equipados com mísseis balísticos, voca-  possibilidades tácticas das armas por ela
         tributo para a defesa nacional e para o  cionados para missões de dissuasão  criadas, é caminhar para o insucesso. Não
         futuro sistema de defesa europeu. Neste  estratégica, até aos discretos submarinos  analisar, do ponto de vista das suas possi-
         sentido, o submarino pode em muito con-  convencionais, equipados com torpedos  bilidades presentes e futuras, com base na
         tribuir para prestigiar e valorizar a acção  mortíferos, cuja existência é por si só um  sua provável evolução, as novas armas
         política externa portuguesa. Por força dos  grande factor de dissuasão, e que desequi-  aparecidas no decurso das batalhas, para,
         tratados assinados, Portugal tem de ter  libram no mar qualquer grande poder de  dessa análise, se deduzirem as suas formas
         meios para disponibilizar ou então correrá  superfície. Talvez por isto, não haja conheci-  de emprego e as indispensáveis medidas
         o risco de um outro país o fazer, mas  mento de uma Marinha que tenha aban-  de reacção, é aceitar tácita e criminosa-
         obviamente requerendo, como contraparti-  donado a sua capacidade submarina depois  mente a derrota. A história militar está
         da, mais poder e influência...     de a ter adquirido.                cheia de factos que o comprovam.” Assim
           A história já demonstrou que o submari-  A diminuição de importância da ameaça  escreveu, há meio século, o Cap. Hermes
         no é uma arma muito eficaz em operações  nuclear soviética, transportada em especial  de Araújo Oliveira no seu livro “O Sub-
         de interdição do uso do mar por marinhas  em submarinos SSBN, levou a que o empre-  marino”. Efectivamente, apesar da tecnolo-
         de superfície inimigas, e uma arma impres-  go das forças navais se deixasse de centrar  gia ter evoluído muito, os sensores e as
         cindível em qualquer estratégia que preve-  nas “blue waters” e se deslocasse para as  armas empregues pelos navios de superfí-
         ja o controlo do uso do mar. Neste último  “brown waters” (shallow waters) onde cada  cie na detecção e ataque, continuam a não
         caso, o submarino é usado a vante da força  vez mais se desenvolvem operações anfíbias.  vencer a vantagem que o meio dá ao sub-
         naval em especial para a recolha de infor-  Nestes novos cenários estratégicos a profun-  marino. Facilmente se reconhece que os
         mações sobre o inimigo e eventual ataque  didade média das águas ronda os 300m,  submarinos podem perturbar significativa-
         do mesmo. A vantagem do submarino em  dando ao submarino uma vastidão de  mente a navegação marítima, contribuindo
         qualquer missão está na sua discrição e  espaço para se esconder e mascarar entre o  decisivamente para o uso, interdição ou
         capacidade de explorar o factor surpresa,  ruído ambiental e a irregularidade magnéti-  controlo do mar. Mas não chega ter tecno-
         na sua auto-sustentação logística, na sua  ca existente nas águas costeiras. Nestes  logia, é preciso saber usá-la e para isso é
         grande imunidade às ameaças aéreas, de  cenários os submarinos podem explorar os  necessário estudar, formar, analisar, trei-
         aviões e mísseis, e no baixo custo relativo  perfis térmicos e de salinidade, bem como as  nar, realizar exercícios, etc. Daí o valor da
         das suas missões. Ele pode operar indepen-  condições do fundo marinho, para difi-  Escola de Submarinos.
         dentemente em ambientes hostis, por lon-  cultarem a vida dos navios ASW que ouvem  O espanhol Miguel Unamuno escreveu
         gos períodos, sem ser detectado. Esta capa-  uma sinfonia acústica onde é difícil catalogar  “o que faz Portugal é o mar”, o mar é tridi-
         cidade permite-lhe rapidamente deixar de  o “instrumento” submarino. Estes dados  mensional, daí a pergunta: como podemos
         ser uma plataforma não provocatória de  levam-me a pensar que as SLOC (linhas de  ter mar sem submarinos?
         vigilância e colheita de informação e se  comunicação marítimas) do futuro deverão
         transformar num navio multi-missão em  tentar tirar o máximo partido das “blue         Armando Dias Correia
         que as únicas limitações são o número de  waters” onde, aparentemente, é mais fácil                 1TEN
         armas que pode transportar.        detectar um submarino.                   http://www.terravista.pt/portosanto/1143
           Para uma Marinha de escassos recursos,  Os modernos submarinos diesel eléctri-
         como é o caso da nossa, o submarino é  cos são muito silenciosos e têm uma gran-  NOTAS:
         uma arma económica que pode ser em-  de autonomia em imersão (um mês, se  (1) No fundo do Mar de Okhotsk e em redor de
                                                                               da base da Frota Setentrional sitiada em Archangel
         pregue num vasto leque de missões, que  necessário) graças aos modernos sistemas  e Severomorsk, na costa noroeste da ex-URSS.
         podem ir desde a luta anti-submarina e  AIP (Air-Independent Propulsion). Além  (2) Caso do submarino nuclear estratégico soviético
         anti-superfície, ao ataque ou defesa de li-  disso, as modernas armas anti-navio per-  que se afundou em 1968 no Norte do Pacífico.
         nhas de comunicação, à minagem, ao  mitem ataques a grande distância (por  (3) Caso de uma bomba de hidrogénio que caiu de
                                                                               um B-52, em 1966, no Mediterrâneo, perto da costa
         reconhecimento, vigilância, recolha de  exemplo a 90 milhas com mísseis Harpoon  de Espanha, a cerca de novecentos metros de
         informações, à projecção de operações  lançados por torpedos) o que confere ao  profundidade.
         8 JULHO 2000 • REVISTA DA ARMADA
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