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REGATAS
                                             REGATAS


                                    2. Newport – Lisboa (1982)

         O                                  das comunidades portuguesas locais.  sível tão-pouco observar as bandeiras que com
                                                                                 Sendo o vento demasiado fraco, não foi pos-
               navio-escola Sagres largou de Lisboa  norte-americanas e ainda 11 jovens oriundos
               no dia 4 de Maio de 1982, para a via-
                                              Cumpre assinalar que aquando da estadia  o mesmo objectivo se encontravam içadas no
               gem que o levaria pela sexta vez aos
         Estados Unidos. Apesar de no trajecto até Te-  em Newport foram embarcadas inúmeras cai-  USS Barry, navio onde se achava embarcado
         nerife, nas Ilhas Canárias, o vento ser favorá-  xas contendo os componentes do velho motor  o júri desta regata, e que, com a mencionada
         vel, ainda assim durante o primeiro dia optou-  de origem do Eagle (1936), igual ao da Sagres  bóia, definia a linha de largada.
         -se por navegar a motor. Esta decisão encontra  nessa época, que recentemente havia sido subs-  Como se toda esta falta de coordenação
         explicação no facto das obrigatórias pro-          APORVELA – Foto CTEN António Gonçalves  não bastasse, toda a área foi literalmente
         vas de máquinas, levadas a cabo poucos                                    invadida por centenas de pequenas em-
         dias antes, terem sido efectuadas com os                                  barcações. Assim, «havendo necessidade
         tempos reduzidos ao mínimo.                                               absoluta de se esclarecer a situação, resol-
           Na manhã seguinte foi finalmente larga-                                  veu-se entrar em contacto por morse lu-
         do o pano, tendo-se navegado à vela com                                   minoso com o navio donde deveria “sair”
         ventos compreendidos entre NNW e NE,                                      o sinal de partida». Algum tempo depois
         chegando a sua intensidade a ser força 6                                  chegou finalmente a informação de que a
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         (22 a 27 nós) . Nesta tirada alcançaram-se                                largada havia sido dada oito minutos an-
         com frequência os 13 nós de velocidade,                                   tes, às 15h30. Pela eventual necessidade
         que de resto só foram limitados pelo car-                                 de manobrar para evitar as inúmeras em-
         regar de algumas velas.                                                   barcações que por ali se multiplicavam,
           Quatro dias depois de ter atracado no                                   a máquina só foi definitivamente parada
         porto canário a Sagres soltou rumo para                                   às 15h43. Quando se iniciou a regata o
         Hamilton, na Bermuda, na tarde do dia                                     vento soprava de SE força 2 (4 a 6 nós) e
         12 de Maio. Dado o fraco vento (força 1),                                 a Sagres contava com todo o pano caça-
         navegou-se a motor até ao final da manhã                                   do, vergas encostadas a estibordo, aproa-
         do dia 14. A partir daí, e tirando partido                                da a SSW. No final do dia o vento passou
         dos ventos alísios que então se instalaram,                               a força 3 (7 a 10 nós) e a sua direcção al-
         toda a navegação foi praticamente feita à                                 terou-se para SSE. Em qualquer dos casos
         vela «segundo um largo arco […] arra-                                     um mau prenúncio para uma tirada que
         sando o paralelo dos 25ºN no meridiano                                    com razão todos anteviam longa.
         dos 40º W».                                                                 Cumpre referir que esta regata, deno-
           Durante esta segunda tirada aproveitou-                                 minada New World Tall Ships’ Race, foi
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         se para substituir a andaina  que se en-                                  organizada pela American Sail Training
         contrava envergada desde Novembro de                                      Association (ASTA), congénere norte-ame-
         1981 e que havia sido utilizada aquando   A antiga Sagres retratada num poster publicitário alusivo ao   ricana da Sail Training Association (STA). O
                                        Lisbon Sail’82.
         da viagem ao Médio Oriente.                                               objectivo era juntar em Portugal, por oca-
           Tal como previsto, os cadetes do curso Ro-  tituído. A sua estiva na zona de ré terá contribuí-  sião do Lisbon Sail’82, tanto os veleiros oriun-
         berto Ivens (1º ano) apresentaram-se em Ha-  do para melhorar o caimento do navio, com  dos da América, entre os quais se encontrava o
         milton para a partir daquele porto efectuarem  consequências directas no bom comportamen-  navio-escola Sagres, como também os partici-
         a respectiva viagem de instrução, chegando de  to na regata que estava prestes a iniciar-se.  pantes europeus da Cutty Sark Tall Ships’ Races.
         Lisboa em dois grupos, o primeiro a 1 de Junho   No último dia, precedendo a largada para a  Estes últimos também chegariam em competi-
         e outro no dia seguinte.           regata Newport-Lisboa, teve lugar o habi tual  ção à capital portuguesa, mas a partir do porto
           Dadas as condições de vento fraco e variável  desfile dos veleiros na baía de Narragansett.  de Falmouth, no sul de Inglaterra.
         experimentadas, grande parte da navegação até  Dificuldades de ordem diversa, desde a falta   A partir da meia-noite confirmaram-se os
         à base americana de Little Creek, em Norfolk,  de rebocadores na manobra de largar até uma  piores receios, com o aparecimento de nevo-
         foi feita a motor.                 miríade de pequenas embarcações por toda a  eiro muito intenso, que «só [permitia observar]
           Antes de chegar a Filadélfia o navio quedou-  baía – uma embarcação à vela chegou mes-  contactos [no] radar em virtude de a visibili-
         -se algum tempo pelo fundeadouro de Marcus  mo a estar debaixo da roda de proa e a roçar  dade estar má». Esta complicada situação iria
         Hook, onde se procedeu ao acachapar dos  pelo costado do navio –, impediram que a Sa-  manter-se por quase dois dias, sensivelmente
         mastaréus, «manobra que demorou cerca de 7  gres estivesse exactamente à hora marcada na  até meio da tarde do dia 29 de Julho.
         horas a executar, em virtude, principalmente,  linha de partida.        Ainda que fraco, no dia 28 o vento começou
         de o tempo decorrido entre esta e a anterior (5   O referido cenário complicou-se ainda mais  por rodar para sul, fixando-se em SW a partir
         anos) ser demasiadamente longo, o que trou-  pelo facto de as comunicações na frequência  da tarde e «às 2245 foi lançado o odómetro
         xe acrescidos trabalhos pelas dificuldades em  prevista se terem revelado de todo impraticáveis.  de linha». Esta alteração do vento permitiu sair
         remover e/ou manobrar algum material que se  Além disso, a bóia que deveria assinalar uma  da situação pouco confortável de navegar com
         encontrava calcinado».             das extremidades da linha de largada não che-  má visibilidade a cerca de duas milhas da cos-
           Para gáudio dos muitos milhares de especta-  gou a ser avistada, talvez por ser de reduzidas  ta, amurado pelo bordo do mar. O dia seguin-
         dores dispersos ao longo das margens, apesar  dimensões ou por pura e simplesmente não se  te trouxe consigo melhorias progressivas e um
         de se encontrarem acachapados os mastaréus  encontrar no local. Acrescente-se ainda que na  aumento da intensidade do vento, mantendo-
         foi possível caçar papafigos e gáveas baixas du-  véspera havia sido promulgada a alteração do  se a sua direcção do quadrante sul. Com o na-
         rante o desfile até Filadélfia.      sinal de largada, devendo este ser feito com to-  vio finalmente aproado a Lisboa, atingiram-se
           Na navegação para o próximo porto, New-  ques de sereia em vez de um tiro de peça. Mes-  as 269 milhas na singradura de 29 para 30 de
         port, embarcaram duas equipas de televisão  mo este sinal não chegou a ser ouvido…  Julho. Beneficiando de vento força 6 (22 a 27
                                                                                      REVISTA DA ARMADA U JUNHO 2006  17
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