Page 200 - Revista da Armada
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nós), chegou-se a navegar em alguns períodos  quando este se encontrava umas 210 milhas à  dure, nem bem que nunca acabe», permanece
         à velocidade de 15 nós. A chuva também apa-  popa da Sagres.          tão ajustado quanto actual.
         receu em força, colocando o regime de agua-  A 8 de Julho foi possível recuperar algum   A 21 de Julho, dois dias depois de ter sido pos-
         ceiros que se lhe seguiu alguns problemas aos  alento já que o vento soprou, ainda que com  sível navegar alguma coisa que se visse, apro-
         oficiais de quarto na avaliação da melhor ges-  fraca intensidade (10 a 16 nós), regularmente,  ximou-se da Sagres o veleiro-escola Our Sva-
         tão do pano caçado.                ao longo de todo o dia. Se os mais optimistas  nen que, tendo desistido seis dias antes, seguia
           Por esta altura e com vento favorável, ha-  ainda regozijaram com o facto, o mesmo não  a motor rumo a Lisboa. Encetadas as habituais
         via toda a intenção em levar o navio um pou-  se pode dizer dos mais cépticos, que, nos dias  comunicações via rádio, e uma vez que as con-
         co para norte da latitude das ilhas dos Açores,  seguintes, viram confirmar-se os seus maiores  dições meteorológicas vigentes não inspiravam
         com vista a minimizar, durante o trajecto, a  temores. Efectivamente, da análise das pági-  grandes cuidados, foi mandado arriar o bote do
         influência perniciosa do anticiclone. Como  nas do Diário Náutico do navio até ao dia 14,  navio para que este fosse até à escuna inglesa.
         se sabe, o seu efeito nessas paragens por esta  o mais que se consegue ver são referências ao  No regresso, conforme previamente combina-
         época do ano é frequentemente sinónimo de  pouco vento (Calma – menos de 1 nó e Ara-  do, trouxe consigo o próprio comandante, a es-
         grandes calmarias.                 gens – 1 a 3 nós), e um estado do mar consen-  posa, que também seguia a bordo, e ainda três
           No dia 1 de Julho deu-se nova alteração nas  tâneo com essa mesma triste realidade (Chão  jovens que cumpriam o respectivo treino de
         características do vento, pela diminuição da  ou Estanhado). Não admira, pois, que as cir-  mar. Tiveram assim, seguramente quando me-
         sua intensidade e rondar para NW. Nesse dia  cunstâncias fizessem mais uma vítima no dia  nos esperavam, o privilégio de jantar, em pleno
         surgiu a primeira ocorrência séria de aragens (1  subsequente. Foi então a vez do veleiro inglês  Atlântico, a bordo do navio-escola Sagres. Ter-
         a 3 nós), anulando quase por completo a velo-  Our Svanen desistir, por impossibilidade de,  minada a agradável refeição, que também trou-
         cidade do navio.                   não o fazendo desde logo, ver impossibilitada  xe alguma descontracção à guarnição do veleiro
           Só no dia 3 por volta do meio-dia este pas-  a sua chegada a Lisboa a tempo de integrar os  português, regressaram ao seu navio.
         so se alterou, quando   Des. José Cabrita
         o vento do quadrante
         sul atingiu novamente a
         força 5 (Fresco – 17 a 21
         nós). Os maus momen-
         tos pareciam ter definiti-
         vamente acabado, pois a
         passagem de uma super-
         fície frontal fez aumentar
         o vento até força 8 (Mui-
         to forte – 34 a 40 nós),
         no período compreendi-
         do entre o final do dia 4
         e a madrugada do dia 5.
         No entanto houve que
         refrear todo o entusias-
         mo inusitado pois logo
         nessa tarde o vento ron-
         dou para NW, caindo
         quase de imediato para
         os 10-15 nós.
           Os dois dias que se
         seguiram quase levaram
         ao desespero e a consi-  Plano com as derrotas da Sagres e dos restantes veleiros da classe A, durante a regata Newport-Lisboa. Aqui se pode avaliar com algum rigor tanto a evoluçã
         derar seriamente a hipó-  vento correspondem apenas às experimentadas pelo navio-escola Sagres ao longo do trajecto, reportando-se as diferentes posições do navio ao meio-dia, ho
         tese de que não seria possível chegar a Lisboa à  eventos previstos no programa oficial. No mo-  Dois dias depois do referido evento, mais
         vela. Aliás, o navio-escola Gloria, da Marinha  mento do abandono achava-se cerca de 450  exactamente durante a tarde do dia 23 de
         da Colômbia, foi o primeiro a desistir nesta  milhas a ré da Sagres.  Julho, foi a vez de o navio-escola Esmeral-
         regata. Tal ocorreu no final do dia 5 de Julho,   Na tarde do dia 14 o emissário junto de Eolo 3   da, da Marinha do Chile, renunciar à sua
                                                      pareceu finalmente ter conse-  continuação em prova. Tal decisão, segundo
       Arquivo Museu de Marinha                       mento de algum vento. Mesmo  durante dois dias os ventos contrários que o
                                                      guido interceder pelo apareci-
                                                                               apurámos, ter-se-á ficado a dever ao facto de
                                                      sem soprar muito intenso (10 a  afectaram terem feito o navio perder longitu-
                                                      20 nós), foi suficiente para que  de em relação a Lisboa. No momento em que
                                                      a bordo da Sagres alguns ânimos  ocorreu o seu abandono a Sagres detinha uma
                                                      rejubilassem de novo. Até o ron-
                                                      dar para norte e logo depois para   vantagem na ordem das 440 milhas.
                                                                                 A 24 de Julho, no termo de entrega do seu
                                                      NNE, pareceu indiciar que era  relatório, escrito no final do quarto das 0h00
                                                      chegado o momento de ganhar  às 4h00, o então Primeiro-tenente Sajara Ma-
                                                      a latitude de Lisboa.    deira registou: «[…] entrego ao 1ºTEN AN
                                                        No entanto, e uma vez mais,  Calado a pairar a várias proas […]». Julga-
                                                      o desengano só afectou os mais  mos que a forma lacónica deste testemunho
                                                      ingenuamente iludidos, já que o  dispensa quaisquer comentários. De resto, a
                                                      traquejo adquirido no mar tem  falta de vento nos dias que se seguiram leva-
                                                      ensinado os mais tarimbados  ram o próprio Comandante do navio-esco-
                                                      que o tempo atmosférico é por  la Sagres, CMG Engrácio Lopes Carvalheiro
                                                                                             4
         O memorável momento em que o navio-escola Sagres «corta» a linha de   demais efémero e que o velho  (21/1/80 – 20/8/82) , a admitir no seu relató-
         chegada, vencendo a regata Newport-Lisboa.   ditado «não há mal que sempre  rio que «em 26JUL PM, já se tendo perdido a
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