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A CONSTRUÇÃO DO “ALBERT LEO SCHLAGETER”
         A CONSTRUÇÃO DO “ALBERT LEO SCHLAGETER”

                                         Os primórdios da Sagres

           Há muito tempo que na Marinha Alemã –  construtor naval Heinrich Süchting, levando  como responsável no estaleiro o engenheiro
         Kaiserliche Marine (1910-1918), Reichmari-  em conta os critérios mencionados. Em 1933,  Grothe, tendo o navio sido equipado com um
         ne (1919-1935), Kriegsmarine (1935-1945),  ainda o Gorch Fock não se encontrava concluí-  motor diesel, da marca MAN (Machinenfabrik
         e Bundesmarine (desde 1956) –, se considera  do e já a marinha alemã estabelecia contactos  Augsburg-Nürnberg), com uma potência má-
         que os seus melhores quadros têm como de-  com o estaleiro com vista à construção de mais  xima de 750 hp.
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         nominador comum o facto de haverem rece-  três navios-escolas . Esta súbita necessidade   No dia 30 de Outubro, três meses e meio de-
         bido parte da sua formação a bordo de um  encontrava explicação no facto da componen-  pois assentada a quilha, o Albert Leo Schlageter
         navio-escola veleiro.              te naval do desenvolvimento militar alemão,  foi lançado à água. Como se pode observar na
                                            que Adolf Hitler secretamente iniciou ainda  capa da Revista da Armada, navio e estaleiro
             m Novembro de 1916, durante a Primei-  antes de assumir o poder absoluto, exigir um  encontravam-se devidamente engalanados
             ra Guerra, os alemães capturaram o ve-  número de homens e navios muito para além  com a bandeira alemã em vigor naquela épo-
         Eleiro norueguês Tyholm, que posterior-  daquele que se encontrava consignado no Tra-  ca, terminando a cerimónia com a entoação
         mente, em 1922, foi aumentado ao efectivo  tado de Versalhes. De acordo com a filosofia  de um grito de triunfo ao Führer.
         da Marinha como navio-escola Niobe. Dez  naval alemã, só em navios deste tipo, nave-  Atracado no cais do estaleiro até ao início de
         anos mais tarde, no decurso de uma viagem  gando à vela e a baixa velocidade, obrigando  Fevereiro de 1938, o navio foi então acabado
         de instrução no Báltico, debaixo de mau tem-  consequentemente a longas estadias no mar,  no que respeita à instalação dos equipamentos
         po, o navio adornou demasiado e acabou por  era possível ganhar o treino adequado para que  e aprontamento do aparelho.
         naufragar, perdendo a vida                                                          Os três geradores de ener-
         um total de 69 homens. Esta                                                       gia eléctrica MWM – Moto-
         tragédia preparou o terreno                                                       ren Werke Mannheim – per-
         para o aparecimento de um                                                        Foto Blohm+Voss GmbH  mitiam ter uma cozinha com
         novo navio-escola, tendo                                                          fornos e fogões eléctricos,
         sido contactados vários es-                                                       além de alimentarem a giro-
         taleiros alemães com vista à                                                      bússola que contava com um
         sua construção, com a esco-                                                       total oito repetidoras.
         lha a recair na firma Blohm                                                          Também existia aqueci-
         & Voss, de Hamburgo, essen-                                                       mento nos camarotes e cober-
         cialmente devido à sua enor-                                                      tas, bem como água quente
         me expe riência na construção                                                     para o banho. Todo o apare-
         de grandes veleiros.                                                              lho, incluindo os dois cabres-
           No entanto, antes de enco-                                                      tantes, era exclusivamente
         mendar o navio, e com base                                                        manual. O de vante era uti-
         nas conclusões que terão le-                                                      lizado tanto na manobra dos
         vado à perda do Niobe, a                                                          cabos de amarração, como
         Marinha Alemã definiu dois                                                         para suspender a amarra, sen-
         requisitos que deveriam nor-                                                      do no segundo caso guarne-
         tear a sua construção. Por um   O Albert Leo Schlageter em construção nos estaleiros da Blohm & Voss.  cido por 30 cadetes ou mari-
         lado, era fundamental garantir que em caso de  futuramente os seus homens pudessem desem-  nheiros em instrução.
         acidente e parcialmente alagado, o novo na-  penhar funções bem mais exigentes em navios   Por seu turno, a chapa do convés foi co-
         vio se mantivesse à superfície, o que implicava  tecnologicamente mais evoluídos.  berta com madeira de teca de 63 milímetros,
         a divisão do seu interior em compartimentos   A quilha do Albert Leo Schlageter, terceiro  enquanto que os pavimentos interiores – co-
         estanques. Não menos importante, até porque  navio da classe, foi assentada a 15 de Julho de  bertas, camarotes, salas de aula, corredores e
         já se pressentia alguma tensão política na Eu-  1937, constituindo a construção número 515  paióis – contavam com madeira de pinho (ore-
         ropa, era imperioso que este pudesse passar  dos estaleiros da Blohm & Voss. Foram para o  gon pine) da mesma espessura.
         do Mar do Norte para o Mar Báltico, locais  efeito utilizados os planos do segundo navio,   O navio atravessou o canal de Kiel a 14 de
         onde a Reichmarine dispunha das suas princi-  o Horst Wessel, ligeiramente maior do que o  Fevereiro de 1938, tendo realizado todo um
         pais bases navais – Wilhelmshaven e Kiel, res-  Gorch Fock, também eles elaborados pelo  conjunto de exigentes provas entre os dias 17
         pectivamente –, sem ter de navegar por águas  mesmo construtor naval. No estaleiro foram  e 24, na base e nas águas da baía com o mes-
         potencialmente hostis, utilizando-se preferen-  nomeados os engenheiros Schubert e Leiss  mo nome. No que respeita ao lastro fixo, o Al-
         cialmente o Nordostsee Kanal, vulgo canal  para supervisionar toda a construção, compe-  bert Leo Schlageter contava com 90 toneladas
         de Kiel. No entanto, para que fosse possível o  tindo ao segundo todos os aspectos relaciona-  de lingotes de ferro e mais 270 toneladas em
         navio praticar esta via, o seu aparelho deveria  dos com o aparelho.  pedra. Além do mais, o navio dispunha ain-
         ser concebido de maneira a que a altura dos   Cumprindo as exigências do projecto, na  da de bons equipamentos de comunicações
         mastros não fosse superior a 39,5 metros, ou,  construção do casco foram utilizadas chapas  – dois transmissores e dois receptores –, um
         em alternativa, como na realidade veio a suce-  de aço de 10 milímetros de espessura, rebita-  rádio-goniómetro, duas sondas, uma delas es-
         der, que os respectivos mastaréus pudessem ser  das e parcialmente soldadas. A espessura da  pecialmente concebida para operar em águas
         acachapados, não ultrapassando, nessa posi-  chapa que se encontrava na base dos diferen-  pouco profundas.
         ção, o limite estabelecido. Esta restrição resul-  tes pavimentos, incluindo o próprio convés,        Z
         tava no facto das várias pontes que se encon-  era de 6 milímetros, enquanto que a utilizada   António Manuel Gonçalves
         tram ao longo do percurso terem uma altura  para dividir os compartimentos estanques não            CTEN
         de 40,5 metros, em relação ao nível médio de  ia além dos 5 milímetros.  Nota            am.sailing@hotmail.com
         água do canal.                       Relativamente ao espaço de máquinas –   1  Sobre esta questão ver «A Sagres e os seus Irmãos»,
           O navio foi concebido pelo engenheiro  motor principal e geradores –, estas tiveram   Revista da Armada, Fevereiro a Junho de 2004.
                                                                                REVISTA DA ARMADA U SETEMBRO/OUTUBRO 2007  7
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