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O PRIMEIRO MOTOR DA “SAGRES”
                    O PRIMEIRO MOTOR DA “SAGRES”

                         Coração do Navio, Núcleo de uma Exposição

         A                                  2009, considerámos relevante alertar para esta  (1937), sendo que esta última ilustra a capa do
              velhinha máquina do navio-escola Sa-
                                            situação, sugerindo uma forma de proteger esta  presente número da Revista da Armada.
              gres foi em 1991 substituída pelo ac-
                                                                                 Para além do referido, e fruto das nossas lei-
              tual motor, aquando da segunda fase  peça única do nosso património.
         da grande reparação de que o navio foi alvo.   Desde meados do século XIX que os navios  turas e investigações, estamos convictos de que
         Convém recordar que nessa altura, dos cinco  passaram regularmente a contar com sistemas  provavelmente, no verso da cinta de ré da roda
         navios da classe ainda existentes – Gorch Fock  de propulsão mecânica, substituindo, aos pou-  de leme do navio-escola Sagres, se acha a ma-
         I (1933), ex-Tovarisch ; Eagle (1936); Sagres  cos, as velas, as quais os mantinham reféns da  gnífica gravação que o Albert Leo Schlageter
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         (1937); Mircea (1938); Gorch Fock II (1958) 2   existência de vento. No entanto, um século de-  outrora exibia, no local onde actualmente se
         –, apenas o navio-escola da Ma-                                                 encontram as célebres palavras
         rinha Portuguesa contava ainda                                                  de Luís de Camões – A Pátria hon-
         com o motor original de marca                                                   rae que a Pátria vos contempla –,
         MAN (Machinenfabrik Augsburg-                                                   apanágio dos navios da Marinha
         Nürnberg – modelo W8V30/38-                                                    Foto CTEN António Gonçalves  Portuguesa. Aliás, nessa cinta de
         750 hp / 580RPM), produzido em                                                  latão, tal como na do leme de
         1937, que, equipado com turbo-                                                  emergência que se situa no tom-
         compressor, na sua juventude,                                                   badilho por ante a ré da casa de
         permitia ao navio atingir uma ve-                                               navegação, sem esforço ainda
         locidade máxima de 10 nós.                                                      se conseguem ler os vestígios do
           Quando foi substituído ao fim                                                  período em que o navio navegou
         de 54 anos, o antigo motor da                                                   com a bandeira do Brasil: «Gua-
         Sagres era já uma raridade. No                                                  nabara – Tudo pela Pátria».
         entanto, esta longevidade só se                                                   Atendendo ao vertiginoso pro-
         tornou possível graças à existên-                                               gresso tecnológico com que todos
         cia em stock de sobresselentes                                                  os dias somos confrontados, e le-
         dos motores das antigas lanchas                                                 vando em linha de conta as cres-
         de fiscalização da classe Azevia                                                 centes preocupações relaciona-
         e à cedência, pela Unites States                                                das com as questões ambientais
         Coast Guard (USCG), das peças   O primeiro motor da Sagres nas instalações do Departamento de Propulsão e Energia (DPE).   e com o aquecimento global da
         do primeiro motor do Eagle, idêntico ao da Sa-  pois de tantos navios emblemáticos terem sido  atmosfera, estamos em crer que daqui a trinta
         gres, que havia sido trocado em 1982. Como  abatidos ao efectivo, o Museu de Marinha não  anos, quanto se festejar o centenário do navio-
         anteriormente fizemos referência, as peças do  conta ainda com qualquer exemplar do coração  escola Sagres, este motor será uma verdadeira
         motor do navio-escola americano foram em-  dos navios da Marinha Portuguesa. Neste aspec-  preciosidade. Acrescente-se ainda, que de to-
         barcadas nesse ano a bordo da Sagres, quando  to consideramos, que depois de devidamente  dos os motores originais dos navios desta clas-
         o navio visitou Newport, em vésperas de largar  beneficiado e limpo, o antigo motor do navio-  se, construídos antes de ter tido início a Guerra,
         para a regata em que atravessou o Atlântico até  escola Sagres pode constituir o ponto de partida  actualmente apenas o da Sagres subsiste. Pelo
         Lisboa, a qual logrou vencer .     para que doravante outros se lhe possam juntar.  que nos compete a nós preservá-lo, tendo em
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                                            Uma vez que o património relacionado com os  vista acautelar a história do navio-escola Sagres,
           NAVIO    MOTOR   POTÊNCIA ANO 4  navios que tiveram o nome Sagres assume já  contribuindo-se também, ainda que de forma
          Gorch Fock I  Skoda  550 hp  1952  certa relevância, julga-se que este motor original  modesta, para ampliar e preencher uma im-
            Eagle   Caterpillar  1.000 hp  1982  poderia constituir o núcleo de uma exposição  portante lacuna no vasto e rico acervo do Mu-
            Sagres   MTU     1.000 hp  1991  com o espólio referido, do qual ressaltam, en-  seu de Marinha.
            Mircea   MaK     1.100 hp  1966  tre outros, a roda do leme e a figura-de-proa da                   Z
          Gorch Fock II  Deutz  1.600 hp  1991  antiga Sagres, um sino fissurado que pertenceu   António Manuel Gonçalves
                                                                                                            CTEN
          Remotorização dos navios.                                                              am.sailing@hotmail.com
           Pese embora a vox pupuli asse-                                                  Agradecemos a colaboração do
         verar que o antigo motor da Sa-                                                 CTEN EN-MEC Pereira Cavaco, chefe
         gres teria sido levado pela MTU                                                Foto CTEN António Gonçalves  do Depar tamento de Propulsão e Ener-
         – Marine Truckparts Unlimited,                                                  gia (DPE) da Escola de Tecnologias Na-
                                                                                         vais (ETNA) em Vila Franca de Xira, que
         empresa do grupo Mercedes-                                                      desempenhou as funções de engenheiro
         Benz –, para o seu museu na                                                     do navio-escola Sagres, entre Dezembro
         Alemanha, na sequência da ins-                                                  de 1998 e Abril de 2002.
         talação a bordo da nova unida-                                                  Notas
         de propulsora, o facto é que ele                                                  1  Ver «A Sagres e os seus Irmãos»,
         repousa serenamente nas insta-                                                  Revista da Armada, Fevereiro e Maio
         lações da Escola de Tecnologias   Placa identificadora do primeiro motor da Sagres, também ele construído em 1937.   de 2004.
                                                                                          2  De notar que o Gorch Fock II, actua l
         Navais (ETNA) – Departamento de Propulsão e  ao actual navio, os quadros de Roger Chapelet   navio-escola da Marinha Alemã, foi construído cerca
         Energia (DPE), em Vila Franca de Xira. O ano de  (1903-1995), modelos de ambos os navios-es-  duas décadas mais tarde do que os restantes navios, em-
         construção, que consta na respectiva placa de  colas, etc. A este propósito recordamos ainda,   bora com base nos mesmos planos. O ano entre parênte-
         identificação, a qual fotografámos há uns anos  que dos três navios que receberam o nome Sa-  sis reporta àquele em que os navios foram construídos.
                                                                                 3  Ver «Regatas – 2. Newport-Lisboa (1982)», Revista
         atrás, não deixa margem para quaisquer dúvi-  gres, existem imagens que testemunham o seu   da Armada, Junho de 2006.
         das quanto à sua proveniência. Antevendo-se o  lançamento à água: corveta Sagres (1858), an-  4  Ano em que o motor original foi substituído pelo
         encerramento daquele polo da ETNA no ano de  tiga Sagres (1896) e actual navio-escola Sagres   actual.
                                                                              REVISTA DA ARMADA U SETEMBRO/OUTUBRO 2007  11
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