Page 306 - Revista da Armada
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cional. Há tempos, numa conversa, falou-se  que 45% do tempo fê-lo à vela. Em milhas per-  timizar as nossas viagens…
         de um Serviço Social Obrigatório, para rapa-  corridas, o navio fez, em média, o equivalente   RA – É nesta viagem que os cadetes fazem
         zes e raparigas, que após uma fase de enqua-  a meia volta ao mundo por ano.  treino de Navegação Astronómica?
         dramento militar os libertasse para acções co-  RA – Significativo! Ao Brasil…  CVM – Sim, sim! Além de outras actividades.
         lectivas de Serviço Público que aproveitasse,   CVM – Tem lá voltado, a última vez em  Interessante observar é o confronto dos jovens
         quanto possível, as suas vocações profissionais  2000. Em 1993 foi. Na ida ao Japão foram pelo  com a indisponibilidade de rede de telemóvel.
         e neles desenvolvesse um interactivo sentido  Cabo da Boa Esperança e na volta pelo Suez.  Na viagem anterior isso era referido por vá-
         de Cidadania.                      Esteve em Cape Town, em Maputo e na Ilha  rios dos cadetes que todos os dias a navegar
           Essas viagens têm realmente servido o seu  de Moçambique.           vinham, em grupos de três, rotativamente, jan-
         objectivo?                           RA – Nunca tal aconteceu antes de 1975,  tar à camarinha, comigo e mais dois oficiais, um
           CVM – Inquestionavelmente. Agora,                                        do navio e outro da Escola Naval. Esses
         enquanto nas viagens de instrução os                                       jantares servem para conversarmos, os
         cadetes, enquadrados em funções para                                       conhecermos melhor e também para os
         que foram preparados, são sujeitos a                                       habituar a um ambiente de maior forma-
         uma avaliação que tem várias compo-                                        lidade e onde, no fim, fazem um peque-
         nentes e que é quantificada em notas, os                                    no discurso…
         candidatos, que são muito mais e estão                                       RA – Ser Oficial da Armada, ça,
         a bordo muito menos tempo, recebem                                         convenhamos… oblige! Continue
         uma avaliação que é apenas Apto ou                                         por favor…
         Não Apto.                                                                    CVM - …  e apercebi-me que aqueles
           RA – Eles  próprios farão a sua auto-                                    vinte e tal dias de mar, sem comunicação
         -avaliação?                                                                com as famílias, os amigos, as namoradas
           CVM - Só fiz uma viagem de adap-                                          e, agora, os namorados, eram motivo de
         tação como comandante do navio mas                                         alguma ansiedade mas, após concluída
         senti, que todos a encaravam como uma   Postos de Honra militares no gurupés.  essa maior tirada, quando lhes pergun-
         etapa final de um processo em que acabavam  creio. Deve ter feito furor! Qual terá sido a re-  tava, respondiam… «É muito mais fácil do que
         por querer ficar.                   acção local?                       imaginávamos!»
           RA – Como o souberam?              CVM – Não sei! Aquela, foi a única vez que   RA – Sorrimos! Conseguir, em 1965, uma li-
           CVM – Fizemos, aliás, um opinograma para  esteve em Moçambique. Estive várias vezes em  gação telefónica de Setúbal para Lisboa levava
         saber como este Plano de Viagem tinha sido aco-  Cabo Verde e uma vez em S. Tomé e no Prínci-  cerca de uma hora, no mar estávamos semanas,
         lhido pelos candidatos, quanto aos resultados  pe, na fragata «Vasco da Gama», e fomos sem-  nas Ilhas, meses e no Ultramar, anos…
         e níveis de satisfação atingidos, à sua avaliação  pre bem recebidos.   CVM – Ao fim de alguns dias entramos
         da utilidade da viagem em termos de percepção   RA – Mas a «Sagres» é um navio emblemá-  numa rotina que esbate isso.  Entre as várias ac-
         da sua aptidão para a vida no mar e do que a  tico. Até havia uma «morna»…  tividades, existem diariamente, de manhã, Brie-
         vida de oficial da Marinha embarcado envolve,   CVM – Exactamente, «A Barca Sagres»! Este  fings de Navegação em que dois cadetes fazem
         em termos de experiência pessoal e marinhei-  ano, a caminho do Recife, vamos mais uma vez  uma  apresentação da Análise e Previsão Mete-
         ra, e avaliação das várias actividades, meios e  ao Mindelo, o segundo porto mais visitado pela  orológica, e depois, mediante o nosso Plano de
         interacção proporcionada. As respostas que ti-  “Sagres” fora de Portugal Continental, logo a  Navegação e das Condições, são estimulados a
         vemos foram muito positivas.                                            darem-me recomendações; se devemos con-
           RA – A adaptibilidade?…                                               tinuar à vela ou passar a motor, guinar ou só
           CVM – Nos primeiros dias pode ser mais                                bracear, içar e caçar ou carregar pano.
         difícil, mas navegando à vela o balanço é                                 RA – Interessante…
         mais suave…                                                               CVM - Antes do jantar, temos o Briefing
                                                                                           4
           RA - … Lembramo-nos (no meio de ri-                                   de Comando , envolvendo um dos quatro
         sos) de camaradas que ficaram …verdes,                                   grupos de cadetes, em que são abordados,
         mas depois normalizaram.                                                além dos aspectos da Navegação, os diferen-
           CVM -  Acontece quando há logo maior                                  tes dados da Logística e do Material, incluin-
         agitação marítima mas, felizmente, não foi                              do na área médica, os casos verificados ou
         o caso. Os candidatos chegam a ser mais de                              em acompanhamento, os níveis e consumos
         70. Quanto a cadetes em viagem de instru-                               da aguada e do combustível e nos equipa-
         ção, este ano, contamos ter 49, dos quais, dois                         mentos, as avarias ocorridas e se estão a ser
         angolanos, um deles do sexo feminino, e um                              ou foram já reparadas. O que é curioso no-
         de Cabo Verde.                                                          tar é o seu crescente interesse e cuidado em
           RA – As viagens de adaptação estão por-                               obter informações que lhes permita, para
         tanto a ocorrer?                                                        além de uma apresentação bem estruturada
           CVM – Sim.                                                            e ligada, formular, de uma forma prática e
           RA – Houve outras viagens longas além                                 bem consubstanciada, uma síntese relevan-
         das duas de circum-navegação?                                           te e sobretudo o evoluir nas recomendações
           CVM – Em 1992 houve a Regata «Co-                                     porquanto ao princípio é-lhes, naturalmente,
         lombo», à América, em 1993 a viagem co-                                 muito difícil fazê-las.
         memorativa dos 450 anos da chegada dos   Visitas no porto de St. Malo.    RA- Aos poucos e poucos vão captando
         Portugueses ao Japão. O meu Imediato fez essa  seguir ao Funchal.     o essencial…
         viagem como jovem oficial.            RA – Vão passar à vista dos minúsculos   CVM - No fim deste processo fazem já re-
           RA - Houve também uma ida a Luanda?  Penedos de S. Pedro e S. Paulo? Evocar a  pri-  comendações muito consistentes e chamo-os
           CVM – Duas! Em 1966 e 68.        meira viagem com Navegação Aérea Astro-  e digo-lhes, «Está a ver, segui as suas recomen-
           No cômputo geral destes 45 anos na Marinha  nómica e também o Traçado Rápido de Rec-  dações e só não fiz isto ou aquilo, porque …» e
         Portuguesa o navio passou um terço desse tem-  tas de Altura? Sobrevoei-os, de dia, a trinta e  explico-lhes o porquê dessa decisão, para eles
         po com missão atribuída fora da Base Naval de  tal mil pés…           perceberem que as coisas têm uma utilidade,
         Lisboa e do qual, dois terços a navegar, sendo   CVM – Obviamente procuramos sempre op-  um fim e um enquadramento e essa evolução

         16  SETEMBRO/OUTUBRO 2007 U REVISTA DA ARMADA
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