Page 17 - Revista da Armada
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Conceito Desta forma, assegura uma mais eficiente
aplicação dos recursos públicos na con-
Para que os portugueses possam secução de finalidades que, de outro
usar os espaços marítimos onde o País modo, exigiriam estruturas diver-
exerce soberania e jurisdição, os órgãos sificadas e potencialmente redun-
da Marinha desempenham três funções funda- dantes, não proporcionando me-
mentais: lhores resultados globais. Além
disso, permite afirmar com eficácia
• Defesa militar e apoio à política externa; as responsabilidades nacionais no
• Segurança e autoridade do Estado; mar, nos âmbitos interno e externo,
• Desenvolvimento económico,científico e cultural. na observância do princípio da legali-
A função de defesa militar e apoio à política externa concreti-
za-se através das seguintes tarefas: dade. Finalmente, o modelo contribui para
• Defesa militar própria e autónoma; que exista racionalização dos recursos do Esta-
• Defesa colectiva e expedicionária; do para acção no mar, maximizando o custo-eficácia.
• Protecção dos interesses nacionais e diplomacia naval. A Marinha de Duplo Uso dá, assim, uma resposta eficiente ao
A função de segurança e autoridade do Estado engloba as se- imperativo constitucional de racionalização da Administração Pú-
guintes tarefas: blica e às exigências de utilização judiciosa dos recursos existentes.
• Segurança marítima e salvaguarda da vida humana no mar; Este modelo de actuação dá, ainda, resposta à abordagem civil e
• Vigilância, fiscalização e exercício de polícia; militar (comprehensive civil and military approach) preconizada
• Estados de excepção e protecção civil. pela NATO, no seu recente Conceito Estratégico, e pela UE, no Tra-
A função de desenvolvimento económico, científico e cultural tado de Lisboa.
abarca as seguintes tarefas:
• Fomento económico; Génese
• Investigação científica;
• Cultura. A Marinha de Duplo Uso encontra a sua fundamentação legal
originária na publicação do Alvará Real, de 15 de Novembro de
A Marinha de Duplo Uso visa assegurar, em simultâneo, 1802, que desenvolve um outro de 22 de Março de 1797, onde é
uma actuação militar, inerente à função de defesa militar e apoio determinado que os patrões-mores (antecessores dos actuais capi-
à política externa, e uma actuação não militar, respeitante às tães dos portos, a quem cabia o exercício das funções de autoridade
funções de segurança e autoridade do Estado, e de apoio ao de- marítima) fossem propostos e escolhidos entre os oficiais da Arma-
senvolvimento económico, científico e cultural. Desta forma, a da. Desde essa altura, a legislação nacional tem vindo a reforçar o
Marinha, cujo Comandante é, simultaneamente, Chefe do Esta- modelo de Duplo Uso, em que a Marinha desempenha as típicas
do-Maior da Armada e Autoridade Marítima Nacional, pode ser tarefas militares, em paralelo com tarefas não militares, ligadas, não
empregue quer como Armada, quer no quadro das atribuições só, à segurança marítima e ao exercício da autoridade pública no
próprias de uma Guarda Costeira, nas quais tem uma tradição mar, como também à investigação no âmbito das ciências do mar
multi-secular. Para além disso, desempenha um conjunto de res- e à promoção e preservação da cultura marítima. Este modelo de
ponsabilidades históricas nos domínios da ciência e da cultura, e actuação atravessou formas de organização do Estado e regimes
também possui obrigações sociais relativas à economia. políticos distintos. No séc. XXI, conheceu passos fundamentais com
a publicação dos Decretos-Leis n.º 43/2002 e 44/2002, de 2 de Mar-
Uma Marinha com estas características fomenta a comple- ço, e da recente Lei Orgânica da Marinha, de Setembro de 2009.
mentaridade dos órgãos do Estado, promove a mais profunda Esta afirma explicitamente, em sede preambular, dar “corpo ao pa-
cooperação no desenvolvimento de capacidades e cria impor- radigma da Marinha de «duplo uso», materializado numa actua-
tantes sinergias na acção pública marítima nas matérias de de- ção militar e numa actuação não militar, privilegiando uma lógica
fesa, protecção (security), segurança (safety), protecção civil e de economia de esforço e de escala, bem como o desenvolvimento
investigação científica, entre outras. de sinergias, por partilha de conhecimentos e recursos”. Estes são
requisitos particularmente relevantes, quando se sabe que os meios
necessários para actuar no mar são inevitavelmente dispendiosos,
optimizando-se ao máximo, assim, as mesmas estruturas. Neste
contexto, é imperativo saber utilizar os meios da Marinha da ma-
neira mais eficiente e eficaz, empregando-os de forma polivalente.
Conforme se afirmava num Decreto Ministerial de 6 de Agosto
de 1892, “possuindo o país, infelizmente, uma marinha pequena,
aproveitar o que há na execução de serviços que podem praticar-se
ao mesmo tempo e com a mesma despesa, não é só aconselhável, é
uma obrigação indeclinável de quem pretende organizar e consti-
tuir, com o pouco que há, a base do muito que há a fazer”.
17REVISTA DA ARMADA • MAIO 2011