Page 25 - Revista da Armada
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DEPOIS DA CONQUISTA chineses no porto que se ofereceram- cia foram diversos – sobretudo porque
-se para colaborar na conquista, mas o as cumplicidades religiosas eram muito
A principal preocupação de Afonso de governador não aceitou a proposta por fortes – mas não consigo imaginar que
Albuquerque, depois da conquista, foi cons- razões de segurança. Em 1512 foram eles esta viagem não tivesse outro percurso
truir uma fortaleza que garantisse a sobera- que tomaram precauções e não vieram que aquele que seguiam todos mercado-
nia nacional na cidade e apoiasse uma es- à cidade, mas voltaram em 1513, tencio- res do sul, pousando de terra em terra,
quadra que exerceria a soberania no estreito. nando continuar a sua actividade normal vendendo e comprando por aqui e por
Queria também que Malaca não perdesse com a nova administração. De resto Jorge ali, até chegarem a Banda, onde adqui-
a sua prosperidade económica e, para isso, Álvares e um escrivão (de que não sabe- riam a noz moscada, o macis e o cravo
necessitava de manter as antigas relações co- mos o nome) lograram alcançar o litoral que os molucos ali vinham vender.
merciais e permitir o acesso aos mercadores chinês, embarcando num dos seus juncos
que ali se dirigiam todos os anos. Como dis- e fazendo a viagem com espaço alugado, Malaca conquistada há cinco séculos
se atrás, a importância daquele ponto tinha à maneira de todos os comerciantes do (10 de Agosto) tentou continuar o pa-
a ver com a sua localização geográfica e com Extremo Oriente. Foi a abertura da porta pel que sempre tivera, mas a distância
as circunstâncias climáticas que ali juntavam para uma relação intensa, que teve mui- a que estava dos centros decisórios e a
diversas rotas, mas assentava também nas tas vicissitudes e variantes, mas com um re- dificuldade de compreensão, por parte
condições criadas pelos homens, no sentido gularidade representativa de Portugal que do poder régios e do próprio governo
de apoiar os navios e os viajantes com suas da Índia, das singularidades do mundo
fazendas. A compo-
nente genética era oriental, foram de-
fundamental e ex- teriorando a sua vo-
pressava-se na pres- cação inicial. Numa
tação de serviços primeira fase, a
apoiada pelo po- coroa interessou-
der do sultão que, -se por todo o tipo
agora, tinha de ser de comércio, mas
mantido, sob pena as taxas e a forma
do fluxo comercial como era exercido
ser desviado para o poder sobre os
outro porto. O go- comerciantes fez
vernador manteve com que nascesse
a maioria das estru- uma diáspora de
turas existentes, não portugueses e seus
excluindo nenhu- descendentes, que
ma comunidade se estabeleceram
de comércio que se em vários locais do
sujeitasse às regras Extremo Oriente,
já definidas para a internando-se na
Índia, pagando as imensa teia das ro-
taxas necessárias Malaca tas orientais, com
para a obtenção da A. Bocarro - Livro das Plantas de todas as Fortalezas, Cidades e Povoações do relacionamentos
licença (o “cartaz”). Estado da Índia Oriental. que não eram con-
Nina Chatu obteve uma posição de durou de 1557 até 20 de Dezembro de 1999. troláveis. Não vi-
Afonso de Albuquerque tratou tam- nham a Malaca desde que não fosse ab-
privilégio decorrente do apoio que tinha solutamente necessário, e ganharam as
dado a Rui Araújo e do esforço que fez bém de proceder à exploração comercial suas próprias formas de poder, assentes
para promover a vinda dos portugue- das ilhas do Extremo Oriente e, ainda em cumplicidades que pouco ou nada
ses, mas também pela sua importância no ano de 1511, fez sair uma pequena tinham a ver com a sua condição de
enquanto comerciante e investidor, com armada de duas naus e uma caravela nacionais. Encontraram o seu próprio
capacidade de armar navios, manter ou que foram até às chamadas Ilhas das Es- espaço no Extremo Oriente, ali casaram,
desenvolver relações de comércio e cola- peciarias. Muitas especulações abusivas tiveram filhos que falavam o português
borar no que deveria ser uma paulatina têm sido feitas acerca desta expedição, e a língua de suas mães asiáticas, e, em
substituição de soberania. De chefe e co- nomeadamente atribuindo-lhe a missão muitos casos alcançaram um notável su-
ordenador da comunidade tâmil (xaban- de alcançar as Molucas, o que, de todo, cesso. Foi através deles que se reataram
dar), com o encargo dos mercadores de não aconteceu. Os documentos da épo- as relações com a China e que se conse-
Bengala, Pegu e Paçem, passava a assu- ca – as cartas escritas pelo próprio Albu- guiu o estabelecimento em Macau em
mir funções semelhantes às do anterior querque e pelos primeiros capitães de 1557. A soberania nacional sobreviveu
Bandara e assumindo esse título. Malaca – referem-se às ilhas de Banda, até à conquista pelos holandeses em Ja-
onde os navios chegaram efectivamen- neiro de 1641 e a cidade foi a porta de
Outra comunidade importante para te. A viagem foi apoiada por Nina Cha- entrada num mundo onde milhares de
a administração portuguesa era a dos tu e precedida por um navio a seu cus- portugueses tiveram sucesso e obtive-
chineses. Os primeiros contactos com os to e mando, que deveria anunciar por ram riqueza. Uns regressaram à pátria –
viajantes que vinham do Celeste Império toda a parte a nova situação de Malaca, como Fernão Mendes Pinto – outros por
a Malaca tinham sido feitos pelo pró- convidando os múltiplos entrepostos lá ficaram e se adaptaram.
prio Diogo Lopes de Sequeira, em 1509, comerciais da Insulíndia a procederem
transmitindo uma excelente impressão com os novos senhores, como sempre
deles. Em Julho de 1511, quando chegou tinham feito com os anteriores. É evi- J. Semedo de Matos
a armada de Albuquerque, havia navios dente que os resultados desta diploma- CFR FZ
25REVISTA DA ARMADA • AGOSTO 2011