Page 20 - Revista da Armada
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corresponder às exigências do desenvolvimen-       do que a debater sem tabus e sem complexos,        Dificilmente antevejo, em prazo útil, a recu-
to sustentável, revelar-se incompatível com os     até porque tem implicações no quadro indivi-     peração dos princípios de solidariedade e coe­
modelos nacionais de desenvolvimento econó-        dual e colectivo.                                são que foram um patamar fundamental e o
mico e programas de ajustamento. Enquanto                                                           elixir do sonho de uma construção europeia
este potencial fracturante não for bem per-          No plano nacional, há que esclarecer o papel   alicerçada na pax perpetua e em padrões con-
cepcionado, corre-se o risco de aprofundar as      dos parlamentos e competências a conserva-       vergentes de nível de vida. E aqui o papel da
divisões na Europa e de contribuir para a sua      rem; espaço para as políticas externas autóno-   Alemanha vai ser decisivo, porque se tornará
desintegração futura.                              mas, assim como para as FA´s face a um futuro    no centro e motor do desenvolvimento indus-
                                                   “exército europeu”;                              trial, financeiro e comercial, a chave da rique-
  Por todas estas razões, a ideia de um gover-                                                      za e do ressurgimento económico. Para que
no económico da UE parece só fazer sentido           No plano europeu, o modelo federal aceita-     lado penderão os seus interesses estratégicos?
se todos reconhecerem nisso “lucro comum”,         ria um Senado de matriz paritária e com plena    Para o projecto europeu ou à custa dele? Será
isto é, uma economia europeia saudável e           igualdade entre os Estados? E se o federalis-    que vai descurar as aspirações e o pensamento
competitiva.                                       mo for o caminho futuro da UE, valerá a pena     das nações da Europa, dos seus parceiros eu-
                                                   continuar a eleger, em cada um dos E-M´s, um     ropeus, condição básica e quadro de partida
A INTEGRAÇÃO POLÍTICA                              Presidente da República, um Parlamento e um      para o revigoramento do projecto europeu?
                                                   1º Ministro? Não será mais prudente um cami-     Confesso que já estive mais optimista.
  Uma das saídas para a actual crise da ZE,        nho de “mais e melhor Europa”, através de um
que têm aparecido com mais ênfase e optimis-       maior grau de integração económica e de um          Por fim, diríamos que, acreditando que o
mo, é a da maior integração política da UE, ou     reforço do método comunitário, em detrimen-      federalismo europeu seja uma meta de desti-
seja a opção do federalismo europeu. É preci-      to dos emergentes poderes directoriais, mas      no, imaginamo-lo, contudo, ainda longínquo
samente sobre essa “terapia” que renascem as       deixando coexistir a solidariedade europeia      do Velho Continente.
velhas dúvidas, na medida em que nos con-          e os patriotismos nacionais? Não será neste
frontamos sempre com as mesmas questões            modelo de compromisso que residirá o virtuo­     NOTAS CONCLUSIVAS
de exequibilidade: é viável uma UEM sem o          sismo do federalismo europeu e o tempero da
respaldo de uma união política? Foi o euro um      sua gradual e bem sucedida construção? Já          Acrise da dívida soberana e do euro vieram
passo integrador maior que a perna europeia?       chegam, mas certamente muitas outras ques-       alertar para o ressurgimento de tendências
                                                   tões deverão merecer respostas convincentes?     do individualismo da soberania, da indese-
  A relevância destas questões merece uma                                                           jável distinção entre parceiros ricos e pobres,
ponderação realista, porquanto uma união             Entre o modelo federal defendido pelos eu-     do Norte “formiga” e do Sul “cigarra”, o que
política (baseada num regime federalista) não      ropeístas, convictos ou românticos, e o reforço  pode levar, rapidamente, a uma ambição de
se decreta, não nasce por tratado ou decreto,      da componente intergovernamental guiada          hierarquização das potências.
assim como não resistem a excessos de vo-          pelos países mais fortes e solventes, julga-se
luntarismo.                                        existir essa possível “3ª via”, um “caminho-       Nesta medida pode afirmar-se que a situa-
                                                   -bissectriz”, cuja escolha não deixará de exi-   ção financeira se transformou numa crise po-
  Analisemos, então, as forças e fraquezas,        gir, igualmente, visão e coragem para refor-     lítica séria da ZE, a questionar a própria exis-
os méritos e deméritos, das duas soluções de       mas institucionais profundas, subsidiariedade,   tência do projecto europeu como um todo,
arquitectura constitucional: federalismo (ou       empenho e mais democracia, contexto que          com o eventual colapso do euro a contaminar
“comunitarismo”) versus confederalismo (ou         faz do federalismo uma meta ainda distante e     toda a economia europeia e, consequentemen-
“inter-governamentalismo”).                        que estaria no pensamento do presidente da       te, mundial.
                                                   CE, quando, perante o PE (discurso do esta-
a) A velha querela do (con)federalismo             do da União), se referiu à necessidade de “…       Admitindo que esta difícil conjuntura terá
  O estatuto da UE está muito para além de         um novo impulso unificador, um novo momento      uma saída, ao devir europeu apresentam-se
                                                   federador …”.                                    duas opções extremas: desistência do projec-
uma mera confederação de Estados, embora           b) Especulação prospectiva.                      to de integração ou a progressão, com ritmo
também não preenche os requisitos de um Es-                                                         acentuado, em direcção à governação econó-
tado Federal.Admitimo-la como uma estrutu-           Neste ponto, procuraremos perscrutar a         mica europeia.
ra institucional sem categoria política pré-defi-  prazo mais longo e para além da actual crise
nida e um sistema político que ao longo de 60      do euro, extrapolando os principais traços e       Impõem-se soluções que combinem a mo-
anos veio aperfeiçoando os seus processos de       tendências da difícil conjuntura que a ZE e a    deração com o equilíbrio. Se a Europa seguir
organização e de decisão, em busca de melho-       própria UE atravessam.                           a via rápida da união política, cedo detectará
res condições de vida para os seus cidadãos.                                                        barreiras difíceis de ultrapassar e, aí, poderia
                                                     O futuro da Europa não se pode libertar da     conduzir ao desastre total; por outro lado, uma
  A actual crise fez despoletar algumas vo-        sua génese e, deste simples quanto brutal con-   união que não funcione economicamente, nun-
zes a antecipar que o seu desfecho só poderia      dicionalismo, não podem abstrair-se os líderes   ca poderá almejar ao fim das assimetrias e fun-
passar pela opção federalista, como o único        e decisores europeus, especialmente os que       cionamento político coerente.
remédio para salvar o sexagenário projecto de      apregoam a inevitabilidade do federalismo.
construção europeia. Outros rebateram, invo-                                                          Este é o tempo e a circunstância em que a
cando o enorme fosso que se interpõe entre a         A Europa moderna é o resultado do nacio-       Europa precisa de aprender com a História e
fácil proclamação e a difícil concretização de     nalismo na diversidade das soluções internas     olhar para o futuro com objectivos e estratégia
uns fascinantes “EUE” e de fazer passar um         e concretas verificadas historicamente em cada   claros, afirmando-se, num patamar de União
tal projecto pelo crivo democrático do conjun-     país.Aherança da Europa é nacionalista, com      solidária, coesa e integrada, especialmente
to dos parceiros.                                  prevalência, por enquanto, sobre as realidades   no âmbito da implementação de uma políti-
                                                   “comunidade” e “união”, ilustrada na “Europe     ca orçamental, económica e social comuns. E
  Qualquer das vias (federal ou inter-governa-     des Patries”, reclamada pelo General De Gaulle.  na Defesa também …. com a “solidariedade
mental) pode esbarrar na menor receptividade                                                        transatlântica”.
das grandes capitais – especialmente Berlim e        Não obstante, admitimos que a Europa pos-
Paris, mas também Londres – receosas de per-       sa ensaiar um federalismo financeiro da ZE,                                                         
derem o controlo do processo e porque tendem       impulsionado pela Alemanha, um federalis-                        António Carlos Rebelo Duarte
a desconfiar das instituições como a CE e o PE,    mo mitigado na medida em que não congrega
preferindo, por isso, criar novas instituições     ainda outros elementos estruturantes, nomea-                                                      VALM REF
sem definição clara das suas responsabilida-       damente a identidade e a cidadania, atributos
des e competências.                                com longo percurso a fazer para se assumirem     Notas
                                                   em termos europeus, apesar da matriz judaico-       1 Entrevista do economista director de opinião do
  A questão do “federalismo” ultrapassa a          -cristã comum.
fronteira das “eurobonds”, da harmonização                                                          “Finantial Times” a Nuno Aguiar, in “Público – Di-
fiscal e do “governo económico” da ZE, haven-                                                       nheiro Vivo”, de 07JAN12;
20 ABRIL 2012 • REVISTA DA ARMADA
                                                                                                    N.R.
                                                                                                    O autor não adota o novo acordo ortográfico.
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