Page 22 - Revista da Armada

90º Aniversário da
Travessia Aérea do Atlântico Sul
Trinta de março de 1922, Lisboa, estuário
do Tejo, frente à Torre de Belém – partida Numa alocução introdutória, o diretor da Co­ cola Naval em 1949, o Comandante Cyrne de
do hidroavião Lusitânia. 17 de junho do missão Cultural da Marinha,Vice-almiranteVi­ Castro conheceu a realidade da Aviação Naval
las Boas Tavares, lembrou a relevância do feito e, habilitado com o brevet de piloto-aviador, re­
mesmo ano, Rio de Janeiro, baía de Guanabara, de 1922 e daqueles que o concretizaram e ex­ alizou diversas missões de voo, inclusivamente
frente ao ilhéu das Enxadas – chegada do hidro­ plicou a razão de ser de cada um dos eventos após o desaparecimento da componente aérea
avião Santa Cruz. Durante setenta e nove dias acima indicados.Ao fazê-lo, indicou a intenção da Marinha. Dessas missões, merece destaque
teve lugar aquela foi, certamente, uma o sobrevoo do Vulcão dos Capelinhos,
das mais relevantes empresas dos Portu­ Fotos CAB FZ Carmo na Ilha do Faial, aquando da erupção do
gueses no século XX. Os protagonistas mesmo em 1957. As suas palavras estão
foram dois oficiais de Marinha: o Capi­ transcritas, na íntegra, noutro local deste
tão de mar e guerra Gago Coutinho e o número da Revista.
Capitão-tenente Sacadura Cabral. Em
cerca de sessenta e duas horas e meia A VIAGEM
percorreram 4 527 milhas a uma velo­ Apesar deste feito dos dois aviadores
cidade média de 72,5 nós. ter já constituído tema de inúmeros es­
Para evocar esta efeméride, a Marinha tudos e notícias, vale a pena apresen­
promoveu diversas iniciativas, algumas tar aqui alguns aspetos relevantes da
da quais em conjunto com a Força Aérea. viagem. Para se compreender melhor
No dia 22 de abril a Banda da Arma­ o contexto, importa começar por apre­
da realizou um concerto junto ao mo­ Os Chefes dos Estados-Maiores da Armada e da Força Aérea sentar os protagonistas.
numento evocativo daTravessia Aérea, p­residindo à cerimónia. Carlos Viegas de Gago Coutinho.

localizado próximo daTorre de Belém. Nascido em Lisboa, Belém, em 17 de
No dia seguinte, 23 de abril, por inicia­ fevereiro de 1869, veio a falecer na mes­
tiva conjunta da Marinha e da Força ma cidade no dia seguinte a ter com­
Aérea, ocorreu uma cerimónia militar pletado noventa anos, 18 de fevereiro
no mesmo local, singela, mas plena de de 1959. Ingressou na Escola Naval em
significado, pela importância do feito 1888, embarcando em diversos navios
que se evocava. Com guarda de honra após conclusão do curso de Marinha.
e fanfarra, foram executados os toques Em 1898 foi designado para uma mis­
de silêncio, homenagem aos mortos e são de levantamentos geodésicos emTi­
de alvorada. O Almirante CEMA e o mor.A partir daí, e durante mais de vinte
General CEMFA depositaram coroas anos, a sua atividade desenvolveu-se es­
de flores junto ao monumento. Esti­ sencialmente nesta área, tendo sido in­
veram presentes diversas individua­ terrompida pontualmente para exercer
lidades, militares e civis, bem como As coroas de flores da Marinha e da Força Aérea junto ao o comando de dois navios, por períodos
diversos membros da família Sacadura mo­ numento. curtos. Um desses navios foi a canho­

Cabral, nomead­ amente a Dr.ª Helena neira Pátria, que emTimor participou na
Saca­dura Cabral, sobrinha do aviador, repressão da revolta do Manufai. Come­
acompanhada pelo filho Dr. Paulo mora-se exatamente este ano o primeiro
Sa­ cadura Cabral Portas, Ministro dos centenário dessa presença da Pátria em
Negócios Estrangeiros. Timor, sob comando de Gago Coutinho.
Após a cerimónia militar, a celebra­ A sua ligação aos trabalhos de levan­
ção da efeméride prosseguiu no Pavi­ tamentos geodésicos prolongou-se para
lhão das Galeotas do Museu de Mari­ além dos trabalhos de campo que rea­
nha. Seguiu-se um conjunto de eventos lizou, em praticamente todos os territó­
singulares: a evocação da viagem e rios ultramarinos sob dominação portu­
seus protagonistas, a entrega à Biblio­ guesa. Fez parte do quadro da Comissão
teca Central da Marinha de uma placa de Cartografia, entidade que coordena­
que assinala a inclusão dos Relatórios va todos os trabalhos de levantamentos
de Gago Coutinho e Sacadura Cabral, Os Chefes dos Estados-Maiores da Armada e da Força Aérea realizados no Ultramar. Substitui o Al­
relativos à Travessia Aérea do Atlântico c­umprimentam os familiares de Sacadura Cabral. mirante Ernesto deVasconcelos na pre­

Sul de 1922, no Registo Internacional da “Me­ de, na oportunidade, se homenagear igualmen­ sidência desta comissão.
mória do Mundo” da UNESCO, a apresentação te todos quantos integraram a Aviação Naval, O seu relacionamento com Sacadura Cabral
da obra Álbum de Memórias – Aviação Naval extinta há precisamente 60 anos, pois, nas suas iniciou-se numa dessas missões geodésicas, em
1917-1952 e, por fim, a visita a uma mostra palavras, “para além das motivações de ordem Moçambique, 1907. Trabalharam juntos nesta
documental e iconográfica referente a aspetos técnico-científica, aTravessia não poderá deixar área durante cerca de três anos. Nesse período
específicos da Travessia e complementar do de ser vista num quadro da clara vontade de en­ em que estiveram juntos, Sacadura percebeu as
acervo patrimonial já exibido, em permanên­ tão afirmar a componente aérea da Marinha e, enormes capacidades de Gago Coutinho para
cia, no Museu de Marinha e relacionado com também, num contexto analítico da época so­ resolver problemas de posicionamento e a sua
os primórdios da aviação militar em Portugal e bre a sua utilidade e missão”. elevada competência no manuseamento de
com a realização de 1922.A Banda daArmada A evocação da efeméride e seus protago­ instrumentos de observação astronómica. Estes
marcou também presença, através do seu quin­ nistas foi levada a cabo pelo Capitão de mar e fatores foram fundamentais para o convite que
teto clássico que interpretou algumas peças. guerra Cyrne de Castro.Tendo ingressado na Es­ Sacadura lhe dirigiu, no sentido de o ajudar a

22 JUNHO 2012 • REVISTA DA ARMADA