Page 17 - Revista da Armada
P. 17

REVISTA DA ARMADA | 555
































                                                                                                                      Foto SAJ ETC Silva Parracho










              MEMORIAL


              GRANDES FEITOS DA MARINHA





              Três vezes do leme as mãos ergueu,                  a memória é subjeƟ va e mutável, sujeita à erosão do tempo e
              Três vezes ao leme as reprendeu,                    às construções narraƟ vas dos homens, mas é também através
              E disse no fi m de tremer três vezes:                da celebração da memória que se mantêm vivos aqueles que
              «Aqui ao leme sou mais do que eu:                   devem ser tomados como exemplo a seguir, daquela que é uma
              Sou um Povo que quer o mar que é teu;
              E mais que o mostrengo, que me a alma teme          herança heroica de um povo que sempre encontrou no mar a sua
              E roda nas trevas do fi m do mundo;                  geografi a mais estrutural e o acesso que possibilitou abrir novas
              Manda a vontade, que me ata ao leme,                oportunidades a um território exíguo.
              De El-Rei D. João Segundo!»                           O  Memorial Grandes Feitos da Marinha materializa em si
                                                                  mesmo essa herança do passado, numa homenagem silenciosa
              Excerto de IV “O Mostrengo.” in Mensagem (1934) de Fernando Pessoa.  e evocaƟ va aos marinheiros que, com a sua imensurável bravura,
                                                                  inscreveram para sempre o nome de Portugal na História e eri-
                                                                  giram, conquista a conquista, ao longo de quase nove séculos, a
              RELEVÂNCIA DA MEMÓRIA HISTÓRICA
                                                                  glória da nossa Marinha.
                consensual que vivemos num contexto de grande volaƟ lidade,
              É  incerteza, complexidade e ambiguidade, num mundo fragmen-  DESTAQUES NA PRIMEIRA DINASTIA
              tado e em rápida mutação, em que a fragilidade do presente nos
              leva a olhar para o passado como forma de ajudar a projetar o futuro   Ofi cialmente, a Marinha Portuguesa – a mais anƟ ga Marinha do
              com sabedoria e prudência, procurando nos que nos precederam   mundo –, iniciou a sua existência heróica há mais de setecentos
              a inspiração para enfrentar desafi os e ultrapassar difi culdades.   anos, fruto da visão estratégica do rei D. Dinis. Contudo, a luta
              Deste passado, que é parte fundamental da idenƟ dade portuguesa,   dos marinheiros portugueses na construção de Portugal começou
              alimenta-se a cultura de um povo, as suas tradições, a sua alma e   muito antes desses tempos, quando ainda se esboçavam os con-
              modo de vida parƟ cular. Este é o passado português consƟ tuído   tornos de um país independente. A criação da Marinha Portuguesa
              pelos feitos daqueles para quem o elemento “desconhecido” não   permiƟ u a D. Dinis consolidar um ciclo, no qual o país ganhou
              representava um fator de desânimo, antes de redobrado denodo.  dimensão no processo de conquista do território, apenas adqui-
               Desta forma, hoje, provavelmente mais do que nunca, é fun-  rindo expressão e liberdade próprias quando se virou para os por-
              damental reter a relevância da memória histórica. É certo que   tos da costa ocidental, assim garanƟ ndo o domínio do mar: o mar


                                                                                                SETEMBRO/OUTUBRO 2020  17
   12   13   14   15   16   17   18   19   20   21   22