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          da  Nação.  E  que,  como  todas  as  formas  do  sagrado,  têm  que   Portugal no mundo, sendo muito justamente conhecido como o nos-
          proteger-se  contra  a  sua  profanação.  Ainda  que  um  sagrado   so Embaixador Itinerante. Pela perseverança dos mais altos deciso-
          laico, os símbolos nacionais têm de ser protegidos contra a sua   res da Marinha Portuguesa, aliada à abnegação e entrega das respe-
          dessacralização e é por isso que todos os Estados inscrevem na   tivas guarnições, o NRP Sagres tornou-se o veículo privilegiado para
          sua ordem jurídica o crime de ultraje aos símbolos nacionais».  levar a cultura, os valores e o quinhão do solo pátrio às comunidades
                                                              portuguesas da diáspora espalhadas pelo mundo. Face ao estatuto
          DIA DE PORTUGAL                                     de navio de Estado, a bordo do ex-libris da Marinha Portuguesa é
          A  primeira  referência  oficial  à  celebração  do  dia  10  de  junho   sempre território nacional, razão pela qual ganha particular relevân-
          encontra-se  num  Decreto  das  Cortes  Reais,  de  27  de  abril  de   cia o seu empenhamento nas visitas oficiais e nas deslocações do
          1880, que contou com o beneplácito do rei D. Luís (1838-1889).   Chefe de Estado e dos membros do governo a países estrangeiros, a
          Visando a comemoração dos 300 anos da morte de Luís Vaz de   que acresce a sua regular participação em grandes eventos interna-
          Camões  (c.1524-1580?),  na  data  apontada  pelos  historiadores   cionais em representação de Portugal.
          para  a  morte  do  poeta,  o  diploma  declarava  o  10  de  junho
          «Dia de Festa Nacional e de Grande Gala», celebração de caráter
          episódico  que  deveria  ocorrer  apenas  naquele  ano.  Porém,
          seria  aproveitada  pela  oposição  republicana  para  sublinhar
          a necessidade de renascimento da pátria e, ao mesmo tempo,
          censurar a participação do poder monárquico nos festejos.
           Mais  tarde,  na  sequência  da  implantação  da  República,  os
          feriados  nacionais  seriam  instituídos  pelo  Decreto  de  12  de
          outubro  de  1910,  que  não  incluía  o  dia  10  de  junho.  Aquele
          diploma  preconizava,  ainda,  que  «as municipalidades poderão,
          dentro da area dos respectivos concelhos, considerar feriado um
          dia por anno, escolhendo-o de entre os que representam as festas
          tradicionaes e caracteristicas do municipio». Foi nesse contexto e
          em honra de Camões que o município de Lisboa adotou o dia 10
          de junho, presumível data de falecimento do autor de Os Lusíadas.
          Uma década mais tarde, o Decreto 17.171, de 29 de agosto de
          1919, consagrou o dia 10 de junho como feriado nacional. Durante
          o Estado Novo deixaria de ser feriado municipal, passando a ser
          festejado a nível nacional como “Dia de Camões, de Portugal e
          da  Raça”,  designação  estreada  por  Oliveira  Salazar  (1889-1970)
          no discurso de inauguração do Estádio Nacional, em 1944. Pelo                                          CTT, Correios de Portugal
          Decreto n.º 38:596, de 4 de janeiro de 1952, «a exemplo do que
          sucede em outros países institui-se em Dia de Portugal, consagrado
          à Festa Nacional, designando-se para o efeito o dia 10 de Junho,
          comemorativo de Camões, pelo alto valor nacional e pela projeção   Com a icónica Cruz de Cristo nas velas, o nome “Sagres”, desde
          universal da obra do nosso grande épico, na qual se consubstanciam   que  associado  aos  navios-escolas  da  Marinha  Portuguesa,  já
          as maiores glórias dos Descobrimentos»,  a  legislação  conferia   ultrapassou o tempo em que o escudo vigorou como nossa moeda
          novo caráter legal à data. Todavia, com a intensificação da guerra   (1911-2002) e que havia substituído o real (1430-1911), derradeira
          colonial,  a  partir  de  1963  este  feriado  seria  transformado  em   moeda da monarquia. Por afortunada deliberação dos respetivos
          homenagem às Forças Armadas e exaltação do regime.  governos, ambas as designações continuam a ser utilizadas por
                                                              alguns países lusófonos, sendo o escudo a moeda oficial de Cabo
           Depois do 25 de abril, o Decreto-Lei n.º 80/77, de 4 de março,   Verde e de Timor-Leste, e o real a moeda oficial do Brasil.
          estabeleceu que «o Dia de Camões, comemorado a 10 de junho,   Foram os navios com a Cruz de Cristo nas velas que disseminaram
          passa a ser dedicado também às comunidades portuguesas no   a língua portuguesa pelos cinco continentes, atualmente a sexta
          estrangeiro». Por indefinição sobre a data de comemoração do   mais  falada  no  mundo,  por  mais  de  290  milhões  de  pessoas,
          dia  nacional,  o  25  de  abril  chegou  a  ser  ponderado  para  esse   e idioma oficial dos oito países lusófonos, além de Macau.
          efeito.  Encontrado  o  equilíbrio,  no  ano  seguinte  o  Decreto-   Finamente  decantado  no  seio  das  melhores  tradições  da
          -Lei n.º 39-B/78, de 2 de março, revogava a anterior legislação,   Marinha Portuguesa e habilmente aprimorado pelos respetivos
          determinando  que  «o  dia  10  de  Junho,  Dia  de  Camões  e  das   marinheiros, o NRP Sagres é hoje um símbolo de enorme prestígio
          Comunidades, melhor do que nenhum outro, reúne o simbolismo   que engrandece Portugal e motivo de orgulho dos portugueses.
          necessário à representação do Dia de Portugal. Nele se aglutinam
          em  harmoniosa  síntese  a  Nação  Portuguesa,  as  comunidades   «Mal dos países que não sentem o legítimo orgulho das suas
          lusitanas espalhadas pelo Mundo e a emblemática figura do épico   tradições, dos seus antepassados, das suas glórias remotas, da
          genial». Desde então, neste dia é prestada homenagem a Portugal   carta de brasão, da sua nobreza secular, que não palpitam, que
          e  aos  portugueses,  a  Luís  de  Camões  e  à  língua  portuguesa,   não  vibram,  que  não  comungam  daquele  culto  de  heroísmos,
          assim  como  à  cultura  lusófona  e  às  comunidades  portuguesas   dos  esplendores,  dos  sacrifícios  e  das  virtudes  do  passado
          espalhadas pelo mundo, sendo o NRP Sagres recorrentemente   indispensável ao próprio sentimento da sua continuidade histórica
          utilizado para este efeito, nomeadamente no estrangeiro.  e à própria permanência da sua identidade nacional».
          NRP SAGRES                                                                             Júlio Dantas (1876-1962)
           Com uma história que se confunde com a lenda, o atual NRP Sa-
          gres herdou do antigo navio-escola homónimo (1924-1962) os prin-                         António Gonçalves
          cipais  elementos  simbólicos.  Tendo  anteriormente  servido  como                                CFR
          navio-escola da Marinha Alemã (1937-1945) e navio-escola da Ma-
          rinha Brasileira (1948-1961), com a bandeira nacional içada no pe-  Agradecimento: Ao senhor José Cabrita, colaborador do Gabinete de Heráldica
                                                              Naval  desde  2012,  pela  cedência  dos  símbolos  nacionais,  desenhados  de
          nol da carangueja alta contribui há seis décadas para a afirmação de    acordo com os critérios oficialmente aprovados.

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