Page 31 - Revista da Armada
P. 31

REVISTA DA ARMADA | 573

          primeiro monumento nacional dedicado à Imaculada Conceição,    «A Bandeira Nacional é bipartida verticalmente em duas côres
          no  Monte  do  Sameiro,  Braga,  a  que  se  seguiu  a  construção  do   fundamentaes,  verde-escuro  e  escarlate,  ficando  o  verde
          respetivo santuário, cuja imagem seria coroada em 1904.  do lado da tralha. Ao centro, e sobreposto á união das duas
           O culto do divino assenta em premissas como a fé e aspetos da   côres, terá o escudo das Armas Nacionaes, orlado de branco
          religiosidade  local,  comprovada  pelo  facto  de  a  grande  maioria   e assentando sobre a esfera armilar manuelina, em amarello
          dos títulos atribuídos à Virgem Maria ter tido origem na devoção   e  avivada  de  negro.  As  dimensões  e  mais  pormenores  do
          popular. Se os milagres de Ourique e da Nazaré ocorreram nos   desenho,  especialização e  decoração da bandeira são as do
          primórdios  da  nacionalidade,  de  permeio  sobrevieram  outras   parecer da commissão nomeada por decreto de 15 de outubro
          revelações inauditas, coroadas com as aparições na Cova da Iria,
          Fátima. Em conjunto, conferiram corpo à tríade onde pontificam    de 1910, que serão immediatamente publicados no Diário do
          o divino, o povo português e Portugal.               Governo. O comprimento da bandeira será de vez e meia a altura
           Com uma história quase milenar e pródiga em vicissitudes, quando   da tralha. A divisória entre as duas côres fundamentaes deve ser
          analisada  retrospetivamente  muitos  estudiosos  consideram    feita de modo que fiquem dois quintos do comprimento total
          a existência de Portugal um milagre. Com o Estado edificado no   ocupado pelo verde, e os três quintos restantes pelo vermelho.
          binómio ungido na sua génese – nação e monarquia – nas palavras   O emblema  central occupará metade  da altura da tralha,
          de  Eduardo  Lourenço  (1923-2020)  «Portugal é esse rebento   ficando equidistante das orlas superior e inferior».
          incrivelmente frágil para ter podido aparecer, e misteriosamente   No  sentido  de  fundamentar  a  escolha  da  nova  bandeira
          forte  para  ousar  subsistir.  O  religioso  é  onde  tudo  se  desenha,   nacional, a 15 de outubro de 1910 havia sido criada uma comissão
          mesmo quando não sabemos».                          constituída pelo Primeiro-tenente Ladislau Parreira (1869-1941),
                                                              pelo Capitão Afonso Palla (1861-1915), pelo escritor Abel Botelho
                                                              (1854-1917),  pelo  jornalista  João  Chagas  (1863-1925)  e  ainda
                                                              pelo pintor Columbano Bordalo Pinheiro (1857-1929), autor do
                                                              desenho oficial.
         https://www.cm-vilavicosa.pt                         da esperança, apresentou-se como a alteração mais radical, uma
                                                               De acordo com o estudo apresentado, o verde, doravante a cor

                                                              vez que nunca fora tradicional na bandeira de Portugal. De índole
                                                              marcadamente  republicana,  visava  romper  com  o  simbolismo
                                                              monárquico e religioso presentes na anterior bandeira. Com efeito,
                                                              desde a insurreição republicana de 31 de janeiro de 1891, o verde
           Para  assinalar  os  375  anos  da  Coroação  de  Nossa  Senhora   e o vermelho eram as cores do Partido Republicano Português.
          da Conceição, Vila Viçosa acolheu no passado dia 27 de março    O  vermelho  foi  escolhido  por  ser  «a  cor  combativa,  quente
          a  exposição  Três  Coroas,  a  mesma  Padroeira,  onde  estiveram   e viril, por excelência. É a cor da conquista e do riso. Lembra o
          patentes as Coroas de Nossa Senhora da Conceição, de Nossa   sangue e incita à vitória». O branco representa «uma bela cor
          Senhora  do  Sameiro  e  de  Nossa  Senhora  de  Fátima.  O  Papa   fraternal, em que todas as outras se fundem, cor de singeleza,
          Francisco associou-se à celebração e na sua mensagem enfatizaria   de harmonia e de paz [...] salpicada pelas quinas [...] se ferem as
          a ligação histórica de Portugal à figura de Maria: «Porventura, não   primeiras rijas batalhas pela lusa nacionalidade [...] é a mesma
          nasceu Portugal em territórios que então davam já pelo nome   cor que, avivada de entusiasmo e fé pela cruz vermelha de Cristo,
          de Terra de Santa Maria? Pois bem, os filhos da Terra de Santa   assinala o ciclo épico das nossas descobertas marítimas».
          Maria hão de mostrar que nunca a esquecem […] Portugal, destes   A esfera armilar, adotada como símbolo pessoal por D. Manuel I
          novos  mundos  ao  mundo;  deverás  dar  estes  mundos  a  Deus».
          Aludindo ao gesto de D. João IV, suplicou aos presentes para que    (1469-1521),  alude  «à  epopeia  marítima  portuguesa  [...]  feito
          «não voltem a envergar a coroa do próprio reino, mas deixem aos   culminante, essencial da nossa vida coletiva». O escudo branco
          pés de Maria as próprias seguranças».               com as quinas simboliza «o milagre humano da positiva bravura,
           Com  o  advento  do  constitucionalismo  no  primeiro  quartel    tenacidade, diplomacia e audácia que conseguiu atar os primeiros
          do século XIX, os portugueses passaram de súbditos a cidadãos,   elos  da  afirmação  social  e  política  da  lusa  nacionalidade».
          tendo  os  seus  direitos  fundamentais  sido  progressivamente   O escudo encontra-se rodeado «por uma larga faixa carmezim,
          aprovados  no  quadro  dessa  premissa.  Apesar  da  pequena   com sete castelos», que constituem os símbolos «mais enérgicos
          extensão  Portugal  é  um  dos  países  mais  antigos  do  mundo    da integridade e independência nacional». Tendo a grande maioria
          e desde a sua origem teve o mar como desígnio, sublinhado nas   sido construídos entre os séculos XII a XIV para vigia e proteção,
          primeiras palavras da letra do hino nacional.       Portugal é o país onde subsistem mais castelos e fortificações,
                                                              existindo várias centenas espalhados por todo o território.
          BANDEIRA NACIONAL                                    Se a proposta da bandeira nacional não cumpria os preceitos
                           De  acordo  com  o  artigo  11.º  da   subjacentes  à  heráldica,  a  sua  aprovação  seria  alcançada  por
                          Constituição  da  República  Portuguesa,   maioria  de  um  voto.  De  resto,  a  aceitação  da  nova  bandeira
                          os  símbolos  nacionais  são  a  bandeira   nacional não foi um processo pacífico nem tão-pouco imediato,
                          nacional  e  o  hino  nacional.  Assim,    tendo  constituído  a  primeira  querela  do  novo  regime.  Seria  a
                          «A  Bandeira  Nacional,  símbolo  da   perenidade  –  aspeto  crucial  no  domínio  do  simbólico  –  aliada
                          soberania da República, da independência,
          unidade e integridade de Portugal, é a adotada pela República   às  vicissitudes  políticas  e  militares,  que  viriam  a  conferir
          instaurada pela Revolução de 5 de Outubro de 1910».   legitimidade à nova bandeira nacional, na altura produzida em
           Na  sequência  da  implantação  da  República,  o  Decreto  da    grande quantidade e diversas dimensões pela Cordoaria Nacional
          Assembleia  Nacional  Constituinte,  de  19  de  junho  de  1911,   à Junqueira, estabelecimento fabril da Marinha Portuguesa.
          instituiu a bandeira nacional e os demais símbolos nacionais nela   A  primeira  bandeira  foi  simbolicamente  entregue,  a  1  de
          inspirados,  como  o  estandarte  nacional,  o  jaque  nacional  e  a   dezembro  de  1910,  pelo  presidente  da  Câmara  Municipal  de
          flâmula nacional, utilizados pelas Forças Armadas e, em particular,   Lisboa, Braancamp Freire (1849-1921), aos cadetes da Escola Naval
          pela Marinha Portuguesa. De acordo com aquele diploma:  e da Escola do Exército, que no ato solene afirmou:


                                                                                                     MAIO 2022  31
   26   27   28   29   30   31   32   33   34   35   36