Page 335 - Revista da Armada
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equipar um dos hidroaviões Fokker para a dade do Centro do
sua projectada volta aérea ao mundo. Não Bom Sucesso.
chegou, porém, a realizar esse sonho, por ter Foi numa missão de
perdido a vida no voo em que conduzia um patrulha aérea a partir
desses Fokker da Holanda para Portugal, em do Bom Sucesso, voan-
15 de Novembro de 1924, algures no Canal do no Tellier nº 5, que
da Mancha. se perderam no mar o
Em 1927 vieram seis Hanriot H 41 para 2TEN Azeredo de
instrução e treino. Vasconcelos e o seu
Ainda em 1927 receberam-se oito CAMS mecânico, em 23 de
37-A, tendo estes operado até 1935. A sigla Agosto de 1918.
CAMS representa a firma construtora O comando do
“Chantiers Aero-Maritime de la Seine”. Centro de S. Jacinto foi
No total, a Aviação Naval portuguesa teve atribuído ao 1TEN Donnet-Denhaut - Tipo DD8.
ao seu serviço 39 hidroaviões de 5 diferentes Larrouy, tendo sido
tipos de fabrico francês, representando 32% nomeado oficial de ligação da Marinha por- Na transmissão do comando, o 1TEN
do total dos aviões utilizados durante os 35 tuguesa o 1TEN Tavares da Silva (não avi- Larrouy endereçou um ofício ao Director da
anos da sua existência. ador). A nossa Marinha forneceu pessoal não Aviação Marítima Portuguesa, enaltecendo
especializado para serviços auxiliares e mari- as excelentes relações estabelecidas, que,
A AÉRONAVALE FRANCESA nharia. segundo a sua expressão, “...nous ont pér-
EM S. JACINTO Os trabalhos de instalação do Centro ini- suadés que nous travaillons au Portugal dans
ciaram-se em Janeiro. De França, além do la même atmosphere que si nous avions été
Em fins de 1916, os governos português e material de voo, vieram dois hangares de en France”
francês acordaram em analisar a situação das campanha tipo Bessoneau, em madeira com
nossas costas, face à ameaça dos submarinos cobertura de lona, assim como maquinaria, No curto período de operação efectiva da
alemães. O 1TEN Maurice Larrouy, da Ma- equipamento oficial e armamento. O pessoal esquadrilha francesa (Abril a Novem-
rinha francesa, Comandante do Centro de técnico, incluindo Pilotos, chegou em Abril. bro/1918) ocorreram dois factos dignos de
Aeróstatos de Marquise, foi encarregado de As instalações operacionais e os alojamentos referência:
efectuar esse estudo. Do seu relatório resul- das praças localizaram-se em S. Jacinto, O primeiro foi a perda do Piloto Didier,
tou a proposta de instalação em Lisboa de enquanto que os serviços administrativos desaparecido com o seu avião durante uma
uma base de dirigíveis e hidroaviões, e duas ficaram na margem oposta, na zona chama- missão de patrulha ao largo da costa.
outras bases de hidroaviões, uma no Norte e da do Forte. Os oficiais e sargentos alojaram- O segundo, que ficou na História da nossa
outra no Sul de Portugal. A do Norte seria em -se em casas particulares e em pequenas participação na Grande Guerra, foi o encalhe
Leixões ou Aveiro, e a do Sul em Faro ou pensões, na Barra e mesmo em Aveiro. Esta do vapor “Desertas” na costa, próximo da
Lagos. Assim se garantiriam a cobertura de circunstância facilitou um bom relaciona- Vagueira, e seu bombardeamento por um
patrulhamento das águas costeiras e dos por- mento entre franceses e portugueses. O con- submarino alemão, sem a desejável reacção
tos. O Comte. Sacadura Cabral, porém, exa- vívio e as confraternizações desenvolveram- da aviação francesa.
rou um parecer desfavorável à instalação de -se ao bom estilo latino. Um carpinteiro Estes dois factos, que ao longo dos anos
uma base de dirigíveis, devido aos inerentes francês casou com uma lavadeira de S. permaneceram na memória das populações
custos de natureza logística. Jacinto. E o 14 de Julho desse ano foi come- segundo uma versão gerada na voz do povo,
A Convenção entre os dois governos foi morado com a participação de centenas de viriam, inesperadamente, a ser objecto de
estabelecida formalmente em 21 de Junho de portugueses das povoações ribeirinhas, que contestação, com base em documentação
1917, tendo o Governo português aberto um acorreram nas suas embarcações aos festejos fidedigna, que me foi proporcionada na
crédito de 500.000 francos para aquisição de bem providos de “comes e bebes”, no Centro sequência da visita da delegação da
material aeronáutico francês. Francês. Nesse dia à noite, a Marinha Academia de Marinha Francesa. Tal circuns-
Deste programa apenas se concretizou o Portuguesa obsequiou os franceses com um tância justifica uma nova abordagem deste
apetrechamento do Centro do Bom Sucesso jantar em Aveiro, presidido pelo Almirante assunto numa próxima edição da R. A., no
em 1918 com quatro hidros DD 8 e dois Almeida d’Eça. intuito de restabelecer a verdade histórica.
Tellier-T3, tendo a Aéronavale Francesa insta- Em 8/Dezembro/1918, cerca de um mês
lado em S. Jacinto uma base equipada com depois de firmado o Armistício, procedeu-se
uma esquadrilha de oito DD 8 e dois GL. à transferência da Base Francesa para a
Competia a esta base a vigilância da costa Aviação Marítima Portuguesa, tendo assumi- A. J. Silva Soares
a partir de S. Martinho do Porto para norte, do o respectivo comando o 1TEN Aviador CTEN Av. REF.
ficando toda a restante costa à responsabili- Alexandre Moreira de Carvalho.
(Conclusão no número de Janeiro)
Notas
(1) Este texto é um breve resumo da comunicação
apresentada pelo autor na Academia de Marinha em
13/Maio/1999, por ocasião da visita de uma importante
delegação da Academia de Marinha Francesa.
(2) Pode parecer estranho, a qualquer piloto de
hidroaviões, que tenha sido decidido instalar este centro
de Aviação Naval em S. Jacinto, na margem de um
canal que corre N-S, e não na Torreira, onde se encontra
a maior área disponível em toda a Ria de Aveiro. Só vejo
uma razão plausível: é que naquela época, a frota total
de barcos moliceiros atingia cerca de 1.200 unidades, e
grande parte deles andava diariamente na faina de arras-
to nessa zona. Não restava espaço suficiente para os
CAMS 37 - A. hidros manobrarem em segurança.
REVISTA DA ARMADA • NOVEMBRO 2001 9