Page 162 - Revista da Armada
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CSR - Sim, o Coman- Repare que no ba-
dante Pinto de Abreu! calhau se ia à vela até
Para os estudantes é de aos Estados Unidos e se
facto muito marcante, Fotos CTEN António Gonçalves fazia um único bordo
vêm muito motivados e que os punha na Terra
para nós é muito estimu- Nova. Nunca se virava
lante. O próprio navio em roda.
presta-se muito pois tem Ora, nesta regata tive-
a borda baixa e muito mos várias viragens de
aberta (para garfar o ba- bordo e cambadelas, e
calhau), cala bem e é pe- num regime excepcional
sadão. Assim, pudemos de bordadas, ou seja di-
ter 13 mergulhadores na vididos em dois grupos,
água o que só seria pos- portanto, ou se estava a
sível com um navio de trabalhar, ou a dormir. É
investigação científica, que é caríssimo. CSR - Outros tempos… que para virar de bordo ou para cambar precisa-
RA - Outra coincidência com a sua vocação RA - Mas mais. Com as comissões de mais de mos de uma hora. É uma manobra pesada para
original que vem mesmo a calhar. dois anos e, na Metrópole, como então se dizia, a uma guarnição treinada e que teve de ser exe-
CSR - Convém notar que o navio, enquanto expansão da televisão, foram-se modificando mui- cutada, de dia ou de noite, com toda a gente em
plataforma, é muito barato. Sendo o nosso motor tos comportamentos. Mais recentemente notá- cima, 70 pessoas.
o de um camião TIR, no ano passado, bastaram- mo-lo, pela positiva, quando regressámos à Arma- RA - Presumimos que tenham também ficado
-nos 100 toneladas de combustível. Uma andaina da, sobretudo na qualidade de tutores do Centro surpreendidos com eles próprios…
de velas parece cara, cerca de 100 000 €, mas Naval de Ensino a Distância. Pena, porém, é que CSR - Certamente! Para nós, militares, é difícil,
dura sete anos, e a guarnição é mui- imagine para aqueles jovens, de 15
to reduzida. aos 18 anos, que viveram onze dias a
RA - Que é de?... bordadas. Já nem sabiam se era de dia
CSR - Seis oficiais, com um médico, se de noite, mais pareciam zombies,
seis sargentos e 28 praças, num total Foto CTEN António Gonçalves mas deram tudo o que podiam dar.
de 40 homens pois, para a manobra, Não houve conflitos. Houve, sim, tra-
contamos com os instruendos. balho, competição entre as bordadas.
RA - Sabemos que já embarcaram Foi para mim a experiência mais gra-
uma médica. Quanto aos instruendos tificante porque, como comandante,
como se distribuem por géneros? reconheço que foi muito duro.
CSR - Bom! Por cobertas, duas de RA - Que organização era essa?
21 beliches e uma de nove. Compe- CSR - Era a Juvemédia que tem vá-
te às instituições decidir as combi- rias iniciativas, desde o Festival do Su-
nações. No caso das autarquias por doeste até ao Comboio de Portugal,
vezes os nove lugares destinam-se que nos dá muitas garantias pois tem
aos mais velhos, para evitar confli- animadores profissionais que gostam
tos geracionais pois ficam mais reca- muito do navio e com quem trabalha-
tados, embora cá em cima todos se dêem bas- se não esteja a saber pôr a fasquia dos valores de mos há anos. É espantoso como a nova geração,
tante bem. modo a puxar pelo brio dos portugueses, antes, bem motivada, com objectivos, reage.
RA - Como é que o conseguem? suicidariamente, pelo contrário. Enfim… RA - Acreditamos. Pensamos que o proble-
CSR - O navio obriga a uma grande disciplina. Dizia? ma reside nas gerações mais velhas que não
Por vezes digo aos mais novos, que quem devia CSR - Que esses jovens foram extraordinários. lhes proporcionam desafios que, no dia a dia,
embarcar eram os pais para verem o que os fi- A manobra do «Creoula», porque tem a armação os possam levar a superarem-se. Comandan-
lhos são capazes de fazer. Os jovens são muito original, é muito pesada. te! Já me apercebi que além de velejador de
generosos e quando motivados fazem muito mais Foto Júlio Tito longa data, é apaixonado pela vela (risos). Os
do que esperamos. Tivemos uma experiência na oficiais, aqui, são escolhidos pelo seu interes-
regata St Malo - Lisboa, nos 50 anos da regata se pela vela?
Torbay - Lisboa, em que viemos com jovens de CSR - Não é uma determinante, mas terão
uma organização nacional englobando elemen- de ter alguma experiência. Tivemos, inclusive,
tos que não se conheciam, dos mais diversos comandantes que não eram profundos conhe-
pontos do país, de todos os estratos sociais (ha- cedores da arte de velejar mas, evidentemente,
via dos mais pobres aos mais ricos), mas como alguém tem de perceber de vela.
todos faziam as mesmas funções não se notavam RA - Um bom mestre?
diferenças entre eles. CSR - Ou um imediato que detenha essas perí-
RA - Curioso! Quando saímos da Naval os ofi- cias. Um bom mestre, com certeza. Mas mesmo
ciais, os únicos que andavam à paisana, vestiam com as praças utilizamos muito o treino on job.
de uma forma muito formal e até a meteorologia RA - Muitos deles serão Manobras…
o impunha pois os Invernos eram mais vincados CSR - Sim, são vinte da classe de Manobra mas
(muita chuva ou muito frio) e os Verões menos como a guarnição é muito pequena, quando toca
quentes. No Ultramar as diferenças sociais esba- a puxar cabos avançam todos, do cozinheiro ao
tiam-se pois os civis vestiam-se duma forma mais padeiro, todos os sargentos… mas tem de haver
ligeira que os oficiais também adoptavam e isso um mínimo de conhecimento. O nosso guarda-
reflectia-se quando as guarnições eram convida- -marinha, que é velejador, gostará necessaria-
das para festas, onde, embora todos nós estivésse- mente de estar aqui ou na «Sagres».
mos de uniforme tropical, se diluíam os postos e RA - Ao almoço, que foi um muito agradá-
outras diferenças e, numa época em que a esco- vel momento de convívio, apercebemo-nos de
laridade era de facto o grande fosso, as atitudes “Giba” que também o seu engenheiro tinha participa-
nivelavam-se, invariavelmente, por cima. do numa regata.
16 MAIO 2007 U REVISTA DA ARMADA