Page 157 - Revista da Armada
P. 157

MARINHA, ARMADA
                                     MARINHA, ARMADA
           OU MARINHA DE GUERRA PORTUGUESA?
           OU MARINHA DE GUERRA PORTUGUESA?

         OS PRIMÓRDIOS                      bilidades atribuídas a esses governantes,   A diferenciação do ramo militar da Mari-
                                            facilmente se verifica que os seus Minis-  nha vai-se apurando com o tempo, no âm-
             ara se perceber melhor que a dificul-  térios tutelavam não só a Marinha mili-  bito do Comando Geral da Armada.
             dade com que nos deparamos tem  tar, como também outros sectores do Esta-  Todavia, um Decreto de 14 de Agosto de
         Praízes históricas, vamos retroceder  do, nomeadamente os assuntos da Coroa  1892, extingue o Comando Geral da Arma-
         no tempo até ao período em que o proces-  nos domínios ultramarinos, através de  da e outros órgãos, passando a Armada a
         so organizativo da Marinha já evidenciava  Direcções-Gerais. Esta situação manteve-  ser dirigida por um Conselho do Almiran-
         estruturas relativamente elaboradas, con-  -se durante largos anos, tendo a Secretaria  tado, situação hoje comparável a um Con-
         quanto pudéssemos recuar muito mais.  de Estado dos Negócios da Marinha e do  selho de Administração.
           À semelhança de outros países, Portugal  Ultramar sido extinta e recriada mais do   Esse mesmo Decreto de 1892 contém um
         procurou institucionalizar no século XVIII,  que uma vez.             vasto conjunto de preceitos que enformam
         o recrutamento de oficiais para a Armada   Em 1859 passou a haver um Chefe do Es-  um verdadeiro Estatuto do Oficial da Ar-
         Real. Com esse objectivo, foi publica-                                     mada, sem acolher tal designação,
         do o Decreto de 2 de Julho de 1761,                                        mas estabelecendo o Quadro da Cor-
         cujo preâmbulo anunciava: “Consi-                                          poração dos Oficiais da Armada.
         derando o muito que convém ao re-                                           A experiência não foi muito boa e
         gular serviço na Marinha, que nele                                         poucos anos depois, por Decreto de
         haja educação de oficiais que se fa-                                        21 de Dezembro de 1897, é recriada
         çam dignos…”.                                                              a Majoria Geral da Armada, que veio
           Assim, em 1 de Janeiro de 1770                                           substituir o anterior Comando Geral
         foi elaborado o “Mapa dos Oficiais                                          da Armada, no respeitante às suas
         do Corpo da Marinha”, considerado                                          principais atribuições.
                                    1
         como a primeira Lista da Armada ,                                           Assim, permanece a dificuldade
         sendo então Capitão General da Ar-                                         de distinguir com exactidão formal,
         mada o Senhor D. João .                                                    a “Marinha” da “Armada”, saben-
                           2
           Uns anos mais tarde, a Rainha D.                                         do-se, contudo, que a primeira con-
         Maria I assina, em 14 de Dezembro                                          tinha a segunda, sendo portanto mais
         de 1782, o Decreto que cria (ou re-                                        abrangente.
         cria) uma Companhia de Guardas
         Marinhas, que pode ser considerada                                         A REPÚBLICA
         o embrião da Escola Naval, dada a                                          E O ESTADO NOVO
         regulamentação que se seguiu. Neste
         diploma pode ler-se “…consideran-                                           Com o advento da República, o De-
         do o muito que convém ao meu Real ser-  tado-Maior da Marinha, mas uma Carta de  creto da Assembleia Constituinte de 23 de
         viço que na Marinha haja Oficiais hábeis  Lei de 13 de Julho de 1863 extingue o cargo  Agosto de 1911, instaura dois Ministérios
         e instruídos…” e mais adiante “…Tenho  e restabelece o de Major General da Arma-  distintos, o Ministério da Marinha e o Mi-
         determinado ao Marquês de Angeja, Ca-  da, que já anteriormente existira.    nistério das Colónias. Depois, passa-se por
         pitão General dos Galeões da minha Ar-  Entretanto, os termos “Marinha” e “Ar-  uma curta fase em que é criada uma Secre-
         mada Real…”                        mada” continuaram a ser usados nos de-  taria de Estado da Marinha mas, a partir de
           Estes normativos legais, que corres-  partamentos do Estado e nos cargos, sendo  1920, o Ministério da Marinha fixou-se na
         pondem a algumas das primeiras e mais  já visível uma tendência crescente para uma  orgânica do Governo até à mudança de re-
         importantes iniciativas para estruturar a  diferenciação formal, na medida em que a  gime, com a revolução de Abril de 1974.
         profissionalização dos oficiais na Marinha  “Armada”, consubstanciava a função mi-  Entretanto, em 1929, surge o primeiro Es-
         Portuguesa revelam que a utilização das ex-  litar no âmbito operacional, embora ainda  tatuto do Oficial da Armada, formalmente
         pressões “Marinha” e “Armada” já se fazia  de forma mitigada.         designado como tal, através do Decreto n.º
         de uma forma pouco esclarecedora.    Através do Decreto de 28 de Outubro de  17807, de 21 de Dezembro.
           Pelo exposto, afigura-se que as desig-  1869 é criado o Comando Geral da Armada   Em 1937, fruto da enorme confusão de
         nações “Armada” ou “Armada Real” sig-  que tinha autoridade sobre todos os corpos  termos usados no Ministério da Marinha,
         nificavam, tão só, o conjunto dos navios  de oficiais, propunha os nomes dos coman-  o Ministro faz publicar um Despacho, data-
         de guerra.                         dantes dos navios e tinha competências de  do de 19 de Agosto de 1937, determinando
                                            Inspecção e Superintendência sobre todos  o significado preciso que devia ser atribuí-
         A ORGANIZAÇÃO                      os navios do Estado.               do a um rol dessas expressões, tendo tido
         NOS SÉCULOS XVIII E XIX              Por seu turno, a Direcção-Geral da Mari-  o cuidado de acrescentar que, na análise
                                            nha tratava da organização, constituição e  de textos ou diplomas anteriores, se deve-
           Por Alvará de 28 de Julho de 1736, foi ins-  movimento das forças navais, nomeava os  ria ter em consideração o significado que,
         tituída a Secretaria de Estado dos Negócios  comandantes dos navios e tinha autoridade  porventura, lhes podia ser conferido.
         da Marinha e Ultramar, tendo até ao final  sobre as capitanias, entre outras funções. A   Ainda hoje vale a pena percorrer essa lis-
         do Século XVIII existido sempre Ministros  Direcção-Geral do Ultramar dedicava-se à  ta de mais de duas dezenas de itens, pela
         da Marinha e do Ultramar ou Ministros da  administração ultramarina. Todos estes ór-  precisão dos conceitos enunciados.
         Marinha, entre os quais Martinho de Melo  gãos pertenciam à Secretaria de Estado dos   Vejamos, pois, algumas das explicações
         e Castro, que tomou posse em 1770 e foi o  Negócios da Marinha e do Ultramar. É tam-  encontradas de maior interesse para o as-
         artífice de importantíssimas reformas.   bém desta época a constituição do Corpo  sunto em apreço:
           Pela leitura do conteúdo das responsa-  de Oficiais da Marinha Militar.  Ministério da Marinha: O departamento de
                                                                                       REVISTA DA ARMADA U MAIO 2009  11
   152   153   154   155   156   157   158   159   160   161   162