Page 19 - Revista da Armada
P. 19
REVISTA DA ARMADA | 522
Foto: Arquivo Nacional Torre do Tombo
surpresas quase todos sócios do Aero Club mais tarde viria a ser fulcral. Havia também agora, este é o primeiro sinal claro que se
de Portugal, incluindo o 2TEN Lopes Vilari- concorrido para piloto o Guarda-marinha conhece da intenção que a Marinha tinha
nho, o 2TEN Rego Chaves e o 2TEN Maqui- de Administração Naval António Joaquim de criar uma componente aérea. Logo em 10
nista Naval Silva Migueis . Estas comissões Caseiro e os dois oficiais partem para França de outubro de 1916 é apresentada uma pro-
1
vão estabelecer a orgânica da escola de em novembro de 1915, para a Escola de posta para instalar este centro no Alfeite, na
aviação e a sua lotação, assim como vão pro- Aviação Militar de Chartres. António Caseiro área que atualmente fica entre a entrada da
por a localização da escola, sendo um dos recebe o brevet em 5 de fevereiro de 1916, estação naval da BNL e o CNOCA, localização
requisitos a proximidade ao rio para permitir cabendo-lhe assim o mérito de ser o primeiro esta que tinha as características ideais para a
o treino com hidroaviões. A localização pre- piloto da Marinha. Já Sacadura Cabral rece- hidroaviação. No entanto, e por motivos que
ferencial seria em Alverca, mas dificuldades beu o brevet no dia 9 de março de 1916, após não estão completamente esclarecidos, esta
diversas vão forçar a escolha de um terreno 222 voos (aterragens) em 28h57m de voo. proposta não foi aceite, pelo que Sacadura
próximo de Vila Nova da Rainha. Desconhe- De Chartres, Sacadura Cabral segue para Cabral contrapropôs a instalação provisória
ce-se para já qual seria realmente a visão da Saint Raphaël para se especializar em hidroa- deste centro na doca do Bom-Sucesso que,
Marinha para a sua aviação, porém os indí- viões, ao passo que Caseiro vai para Ambé- não sendo boa, seria pelo menos aceitá-
cios indicam que na altura o foco da atenção rieu para se especializar em aviões Voisin. vel. Esta segunda proposta foi aceite, mas o
eram os novos submersíveis e a aviação nem Durante esta sua estadia em França, Saca- Bom-Sucesso revelou-se um autêntico pesa-
sequer era uma preocupação. dura Cabral vai adquirir os primeiros hidroa- delo. Não era abrigado nem ao vento nem à
Refira-se também que foi em 1912 que viões da Marinha, dois F.B.A de 100 cv que mareta, o espaço na doca era exíguo, o lan-
o GMAR AN Miguel Freitas Homem fez um vão chegar a Portugal em janeiro de 1917. É çamento dos hidroaviões através da única
requerimento para, à primeira oportuni- também em Saint Raphaël que vai conhecer rampa de madeira era moroso e o movi-
dade, frequentar um curso de pilotagem, Roger Soubiran, que no final do ano vai ser mento de navios ou embarcações no rio e na
sendo por isso o primeiro militar português contratado para mestre geral das oficinas do doca muitas vezes conflituava com os hidros.
a candidatar-se a piloto. Bom-Sucesso, sendo assim este francês o pri- Refira-se também que o Bom-Sucesso
Será em 14 de maio de 1914 que vai ser meiro mecânico de aviação da Marinha. manteve o seu estatuto de “provisório” até
promulgada a histórica Lei nº 162, que cria De regresso a Portugal, em setembro de 1952. Embora a entrada no conflito europeu
a Escola de Aeronáutica Militar (EAM) e que 1916, ambos os pilotos ficam como instru- fosse um objetivo estratégico para Portugal,
marca também o início da aviação militar tores de voo na EAM, onde Sacadura Cabral havia uma clara consciência de que o país
portuguesa. “Para instrução e serviço espe- vai ser também o Diretor de Instrução. O pri- não estava minimamente preparado para
cialmente com os hidro-aeroplanos e ainda meiro curso de Vila Nova da Rainha arranca a guerra. A maior preocupação da Marinha
com o material naval indespensável para o no final de 1916 e conta já com dois alunos era a ameaça dos U-Boat, pelo que grande
funcionamento da Escola haverá anexa à da Marinha: o 2TEN Azeredo e Vasconcelos parte do esforço de modernização foi no sen-
mesma Escola uma secção de marinha”. e o 2TEN Adolfo Trindade. Vai ser também tido de obter acesso às novas tecnologias de
Em 14 de agosto de 1915, o Ministério da na EAM que vão começar a sua formação defesa antissubmarina. No que diz respeito
Guerra abre finalmente um concurso para os os primeiros técnicos: para montadores de à aeronáutica naval, toda a colaboração veio
oficiais do Exército e da Armada que desejas- hidroaviões, os sargentos carpinteiros Joa- de França, tendo-se comprometido este país
sem obter o seu brevet de piloto no estran- quim Caperta e António Tavares, o criado a fornecer o material necessário e a formar
geiro. É aqui que entra em cena aquele que Romão e o 1º artilheiro Gonçalves; para todo o pessoal aeronáutico. Foi também de
viria a ser o grande impulsionador da Avia- mecânico de aviação, o sargento serralheiro França que veio o primeiro estudo de imple-
ção Naval: o 1TEN Artur de Freire Sacadura José de Faria. mentação de um sistema de vigilância aérea
Cabral. Este oficial tinha regressado a Lisboa, Após a chegada de Sacadura Cabral de da costa portuguesa. Este estudo, efetuado
após ter passado os últimos 14 anos em França, o Ministro da Marinha, então o CTEN pelo Lieutenant de Vaisseu Maurice Larrouy ,
2
África, alguns dos quais na equipa do CTEN Victor Hugo de Azevedo Coutinho, designou no final de 1916, preconizava a instalação de
Gago Coutinho, com quem desenvolveu uma aquele aviador para escolher um local para três centros de hidroaviões (Norte, Lisboa e
relação de amizade e respeito mútuo que a instalação dum centro de hidroaviões. Até Sul) e um centro de dirigíveis (Lisboa).
3
SETEMBRO/OUTUBRO 2017 19