Page 231 - Revista da Armada
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tituindo uma experiência inigualável para
os motores Diesel, ainda então na sua
infância, sendo o primeiro navio equipado
com este tipo de motores a efectuar uma
travessia de 1 300 milhas sem escolta.
De imediato se iniciaram os prepara-
tivos para a viagem, focando a principal
preocupação na pouca confiança nos
motores Diesel, pelo que foi estabelecido
o seguinte procedimento de segurança:
1.º - Navegar sempre apenas com um
motor de combustão, mantendo-se o
outro como reserva;
2.º - Manter a bateria sempre carrega-
da para garantir o maior raio de acção
dos motores eléctricos;
3.º - Arribar ao primeiro porto logo
que deixasse de haver motor de reserva;
4.º - Só prosseguir a viagem com os
dois motores de combustão disponíveis e Primeira viagem do “Espadarte”: La Spézia – Lisboa, 1300 milhas, 76 dias.
a bateria carregada;
5.º - Escalar Gibraltar para reabastecer bordo, ficando pronto no dia 18. Foi grande a te continuou viagem com destino a Gibraltar,
de combustível, atendendo ao elevado curiosidade despertada pelo submersível onde chegou após 40 horas de navegação, a
preço do combustível em Lisboa. durante a sua estadia em Barcelona, sendo uma velocidade média de 8,5 nós, desta vez,
objecto de muitos artigos na imprensa local. E sem qualquer avaria digna de registo.
A primeira largada de La Spézia fez-se em não era caso para menos, afinal o "Espadarte" Após reabastecido, o "Espadarte" largou no
4 de Maio de 1913, mas avarias diversas nos era o primeiro submersível na Península dia 2 Agosto com destino à baía de Lagos,
motores de combustão, obrigaram a arribar Ibérica, após a vizinha Espanha ter abandona- onde fundeou no dia seguinte. Na manhã do
novamente a La Spézia. Após a sua reparação do o projecto "Peral" em 1890. dia 4 largou de Lagos, fundeando na baía de
voltou a largar no dia 21 de Maio. No dia 22, No dia 20 largou de Barcelona. No en- Sagres ainda durante a manhã com uma
foi decidido arribar ao porto de Marselha face tanto, após diversas avarias, ao pôr-do-sol é avaria num dos motores eléctricos e no com-
a nova avaria surgida no motor Diesel de BB. tomada a decisão de entrar no porto de pressor do motor de combustão de EB. Após
Na aproximação ao porto o motor de EB tam- Valência para serem reparadas as embraia- reparação com recurso aos sobressalentes de
bém avariou, sendo feita a entrada utilizando gens dos dois motores e isolar um cilindro do bordo, suspendeu ferro e seguiu viagem com
apenas os motores eléctricos. O estaleiro ita- motor de EB. Durante a estadia neste porto a destino a Lisboa, onde entrou pela Barra Sul,
liano enviou a Marselha uma equipa de guarnição colaborou na extinção dum subiu o Tejo e ficou amarrado a uma bóia do
reparação, tendo ficado pronto a 31 de Maio. grande incêndio que deflagrou a bordo do Quadro dos Navios de Guerra, em frente ao
Mas, após uma tentativa de prosseguir vapor espanhol "Cortés", o que mereceu altos Terreiro do Paço, às 09h45mn do dia 5 de
viagem, entendeu-se preferível voltar para louvores das autoridades espanholas. Largou Agosto. Dois dias depois o "Espadarte" foi vi-
Marselha devido ao enorme temporal que se no dia 30 de Junho, com algumas limitações, sitado pelo Ministro da Marinha, Comandan-
fazia sentir no Golfo de Leão. Retomou a rumo ao cabo Palos. Novas avarias nas em- te José de Freitas Ribeiro, após o que seguiu
viagem no dia 8 de Junho, iniciando então a braiagens obrigam a arribar a Alicante no dia para a Doca de Belém que passaria a ser,
travessia do Golfo de Leão em linha recta 1 de Julho, tendo sido solicitado diverso ma- desse dia em diante, a sua casa e o local
aproveitando o bom tempo. No dia seguinte terial sobressalente ao estaleiro construtor onde nasceria a primeira base de submer-
o "Espadarte" arribou a Barcelona por nova para repor os equipamentos operacionais. síveis portuguesa, com as respectivas oficinas
avaria nos motores de combustão. As Este material chegou no dia 8, ficando a re- e serviços de apoio.
reparações foram executadas pelo pessoal de paração concluída no dia 21. No dia seguin- Concluiu-se, assim, uma viagem que foi
uma autêntica odisseia, digna dos perga-
minhos da história naval portuguesa, que
serviu simultaneamente como uma ver-
dadeira prova de resistência aos motores de
combustão Diesel, ainda dentro do período
de garantia. Foi concluída em 76 dias, não
contando com a 1ª largada de La Spézia.
Batista de Figueiredo
CFR EMQ
Barroso de Moura
CTEN EMQ
Costa Canas
1TEN M
(Conclusão na próxima edição)
Notas:
1) ALBERGARIA, José Maria Soares de, Motores
Diesel do Submersível Espadarte: Primeiros “Diesel”
em Portugal?, Anais do Clube Militar Naval,
Abril-Junho 1995.
O “Espadarte” em Barcelona. O 1º submersível da Península Ibérica, despertou grande curiosidade 2) A Vacuum Oils era o único fornecedor de óleos
e entusiasmo entre os locais. e combustíveis que na altura existia em Portugal.
REVISTA DA ARMADA • JULHO 2000 13