Page 22 - Revista da Armada
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27 PRINCÍPIOS DE DIREITO MARÍTIMO
OS CASE STUDY DOS NAVIOS CHEM DAISY E BETANZOS
PARTE II
O NAVIO BETANZOS DR
al como o sinistro maríƟ mo que envolveu o na-
Tvio CHEM DAISY e que tratámos na primeira
parte do arƟ go, também o navio BETANZOS, com
pavilhão de Espanha, pertencente e operado por
armador espanhol, sediado em Vigo, conheceu um
processo complexo quando, na madrugada do dia
6 de março de 2018, ao largar o porto de Lisboa,
encalhou em plena barra, junto ao Farol do Bugio,
factor que lhe deu uma visibilidade pública acresci-
da, situação que manteve uma acuidade constante
DIREITO DO MAR E DIREITO MARÍTIMO
até ao seu desencalhe 10 dias depois.
Como em qualquer acontecimento de mar desta
natureza, e atenta a específi ca localização do navio
– em pleno canal de navegação –, e bem assim o
facto de ter ocorrido no Inverno, a prioridade do
Capitão do Porto (CP) de Lisboa como Autoridade
MaríƟ ma Local (AML) direccionou-se para a questão ambien- de caução que garantam a remoção do navio, caso se venha a
tal, face ao combusơ vel que o navio Ɵ nha a bordo (130 tone- verifi car o abandono deste por parte do seu proprietário. Não
ladas e ainda 20 toneladas de resíduos oleosos), bem como sendo tão prioritários como as questões de segurança e de
para as questões respeitantes à segurança da tripulação e dos protecção do meio marinho, estes procedimentos técnico-ad-
intervenientes envolvidos nas operações de salvação do navio, ministraƟ vos com acrescida densidade jurídica são nucleares
tanto mais que se estava perante um navio com 119 metros, para o sucesso do processo de remoção de navios encalhados.
encalhado em local extremamente sensível na foz do Rio Tejo Depois de, formalmente, estarem asseguradas as cauções
e em situação meteorológica diİ cil. com vista a garanƟ r a remoção do navio e as relacionadas com
Estando-se perante uma plataforma encalhada no canal de eventual derrame de produto poluente, negociadas direta-
acesso ao porto, o Capitão do Porto, enquanto autoridade mente com elementos do Clube de Protecção e Indemnização
competente para coordenar as operações em espaços sob (P&I) do navio e os representantes legais do proprietário/P&I,
jurisdição maríƟ ma, iniciou os procedimentos previstos no decorreram outras diligências de cariz administraƟ vo respei-
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quadro legal respeitante à remoção de navios e destroços , tantes à instrução do inquérito do sinistro maríƟ mo determi-
formalizando contactos com o agente de navegação do navio nado pelo Capitão do Porto – conforme se esƟ pula na alínea
com vista a serem assumidas as responsabilidades inerentes d), do nº 2, do arƟ go 13º, do Decreto-Lei nº 44/2002, de 2 de
ao regime de propriedade do navio, bem como da autoridade Março, e no nº 1, do arƟ go 5º, da Lei nº 18/2012, de 7 de Maio
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portuária, enƟ dade relevante na condução destas operações, –, tendo os respecƟ vos procedimentos instrutórios sido de-
a qual já havia sido interveniente aquando do sinistro ocorri- senvolvidos em âmbito do Comando Local da PM de Lisboa. 3
do com o navio TOKYO SPIRIT, em Outubro de 2015, em Cas- No caso do navio BETANZOS – que se encontrava abrangido
cais. Assim, e até o proprietário e/ou armador do navio ter por um mecanismo de seguro comum em âmbito maríƟ mo ,
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assumido formalmente a direcção técnica das operações, o garanƟ do por um P&I Club –, bastou a apresentação dos cer-
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que ocorreu no dia 9 de março – dia em que se apresentaram Ɵ fi cados de seguro (válidos) existentes, neste caso da Wreck
nas instalações da Capitania –, o comando operacional destas Removal e Bunkers ConvenƟ on, para se aferir da sua situação.
correu sob a direcção do agente de navegação que, seguindo Uma vez que com o recurso aos rebocadores nacionais não
determinação que lhe foi imposta pela AML, contratou uma surƟ u – no início – o efeito desejado, com consequente remo-
empresa de rebocadores nacionais para tentar movimentar o ção do navio de onde encalhou, os proprietários decidiram en-
navio do local onde fi cou encalhado. tão contratar uma salvage team (holandesa) com experiência
Sempre que ocorre um sinistro envolvendo um encalhe, além e valências neste Ɵ po de operações, a qual, no prazo de três
das diligências de cariz operacional a terem lugar, tendentes à dias, conseguiu fazer chegar ao território nacional um dos re-
remoção do navio do local onde encalhou (que podem passar bocadores atualmente a operar com maior capacidade insta-
desde recolocar o navio a fl utuar ou até ao seu desmantela- lada, bem como determinado material especifi camente uƟ li-
mento, como ocorreu em 2001 com o CORAL BULKER, numa zado para estas operações e adequado para as dimensões do
operação extraordinariamente complexa no molhe do porto navio BETANZOS. Reunido o material e os recursos humanos,
de Viana do Castelo), decorrem outras de cariz administraƟ vo faltava aguardar pela janela de tempo favorável para a realiza-
e averiguatório, como sejam o contacto com o Consulado da ção da operação de desencalhe.
bandeira do navio e a negociação com os representantes do Logo que foi recolocado a navegar (pelas 02h30 de 16 de
proprietário com vista a serem estabelecidos os mecanismos Março) o navio foi sujeito, no Cais do Beato, a uma inspecção