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REVISTA DA ARMADA | 551
OS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA
E A ESTRATÉGIA NO PACÍFICO
3ª PARTE
CARACTERÍSTICAS DIFERENCIADORAS DAS Devotado à nobre ideia de uma paz mundial duradoira, o presi-
DUAS GUERRAS MUNDIAIS dente Warren Gamaliel Harding, eleito em 1920, senƟ u-se na obri-
gação de fazer algo que mostrasse ao mundo essa mesma vocação
pesar de os Estados Unidos da América (EUA) terem parƟ ci- dos EUA. Assim, logo em 1920, é anunciada a criação de um forum
Apado na Grande Guerra (GG) de forma vigorosa, a natureza designado por “Naval Arms LimitaƟ on Conference”, que reuniria
desta parƟ cipação foi muito diferente do que viria a ser o seu as cinco grandes potências mundiais (Grã-Bretanha, EUA, Japão,
envolvimento na Segunda Guerra Mundial (II GM). No primeiro França e Itália), para negociar a limitação de armamentos, em par-
confl ito, a Marinha operou num só oceano e o Exército num só tea- Ɵ cular para limitar a construção de mais navios.
tro de operações. No segundo, a Marinha desenvolveu operações Esta conferência reuniu-se pela primeira vez em Washington, a
em dois oceanos e o Exército em cinco teatros separados. Entre 12 de novembro de 1921, e abriu com os EUA a proporem a demo-
1917 e 1918 não houve recontros navais de superİ cie, enquanto lição de uma grande parte da tonelagem de navios de guerra da
de 1941 a 1945 ocorreram cerca de 20 grandes batalhas e incontá- esquadra americana, exigindo em contraparƟ da que os outros
veis recontros menores.
Os soldados americanos, na GG, foram DR
transportados por mar e desembarcaram
em portos seguros; na II GM a doutrina de
guerra anİ bia teve que ser revista e desen-
volvida, perante a necessidade de se efetua-
rem desembarques com oposição. O poder
aéreo no primeiro confl ito foi praƟ camente
negligenciável, ao passo que no segundo foi
um fator determinante. Da mesma forma,
enquanto o couraçado, no confl ito de 1917
a 1918, era ainda o navio capital e a ação
arƟ lheira de superİ cie era a manobra táƟ ca
mais usada, no confl ito de 1941 a 1945,
desenvolveu-se o conceito de “força capi-
tal” cujo núcleo era o porta-aviões, com a
sua escolta anƟ ssubmarina e anƟ aérea,
havendo que desenvolver novas doutrinas O USS Michigan, um couraçado da classe South Carolina, dispunha de quatro reparos duplos de peças de
operacionais. 305 mm. Entrou ao serviço em 1910 e foi desmantelado 12 anos depois, em resultado do Tratado de Limitação
Os EUA entraram tarde na GG e, devido Naval de 1922.
à falta de preparação, Ɵ veram que uƟ lizar
equipamento emprestado por outros países. Por esse moƟ vo, dei- países deixassem de construir mais navios. A proposta foi consi-
xaram uma impressão de boa vontade mas, simultaneamente, de derada indecorosa pelos outros delegados, pois consideravam que
grande amadorismo. Ao contrário, na II GM, os EUA tornaram-se os EUA Ɵ nham uma capacidade industrial superior e que podiam,
não só no “arsenal das democracias”, por terem entrado logo de em caso de necessidade, voltar rapidamente a construir navios. Os
início como “associados” dos aliados, mas também pela parƟ ci- acordos alcançados nesta conferência vieram a ser confi rmados no
pação maciça em pessoal, em armamento, em poder naval e em tratado assinado a 6 de fevereiro de 1922, em Washington. Este
poder terrestre. tratado estabelecia que a Grã-Bretanha e os EUA podiam cons-
truir 5 navios capitais cada e o Japão 3: a famosa regra de 5:5:3. A
O TRATADO DE LIMITAÇÃO NAVAL DE 1922 França e a Itália apenas poderiam construir navios capitais daí a 10
anos, com a limitação de a construção, no total, não ultrapassar as
Logo após a GG, os EUA viraram as costas à Europa, na ilusão 35.000 toneladas.
de que o isolamento do país e o seu desarmamento levariam a Para chegar a acordo com o Japão, os EUA renunciaram à forƟ fi -
uma paz duradoira sem precedentes. Um dos fatores mais rele- cação militar de bases no Pacífi co a oeste do Havai, como Guam e
vantes para esta aƟ tude foi a rejeição, por parte do Congresso dos Manila, e a Grã-Bretanha renunciou à forƟ fi cação de Singapura e do
EUA, em 1920, do Tratado de Versalhes e da Liga das Nações. Esta norte da Austrália. Na verdade, este tratado favorecia o Japão na
rejeição, embora Ɵ vesse na sua origem uma espécie de vingança proporção 5:3:2, permiƟ ndo que este país se tornasse na potência
políƟ ca contra a teimosia do presidente Woodrow Wilson, era naval mais poderosa do oeste do Pacífi co (os EUA Ɵ nham dois ocea-
também fruto de um forte senƟ mento popular de frustração que nos para defender e a Grã-Bretanha 3). Os EUA e a Grã-Bretanha
resultou da Conferência de Paz de Paris. Os americanos senƟ am- viriam a constatar amargamente este facto 20 anos mais tarde.
-se traídos pelos franceses e pelos ingleses e consideravam que a
adesão à Liga das Nações levaria o país a entrar em outros confl itos Piedade Vaz
contrários aos interesses nacionais. CFR REF
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