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REVISTA DA ARMADA | 551
expressa para as leis restriƟ vas desses direitos, e a sujeição dessas na Lei n.º 44/86, de 30 de setembro (na sua redacção actual). Pela
leis aos princípios da exigibilidade ou necessidade, da adequação e sua relevância actual, é úƟ l referir que, em sede do arƟ go 2º do
proporcionalidade. Mas através de um regime transitório que sempre diploma – de epígrafe GaranƟ as dos direitos dos cidadãos –, defi -
visará o restabelecimento da designada normalidade consƟ tucional. ne-se na alínea c), do seu nº 2, que:
Podendo o estado de síƟ o e o estado de emergência ser declara- “Nos casos em que possa ter lugar, a suspensão do exercício de
dos quando ocorra uma “agressão efecƟ va ou iminente por forças direitos, liberdades e garanƟ as respeitará sempre o princípio da
estrangeiras, de grave ameaça ou perturbação da ordem consƟ tu- igualdade e não discriminação e obedecerá aos seguintes limites:
cional democráƟ ca ou de calamidade pública”, tal como se exige no (…) c) Quando se estabeleça o condicionamento ou a interdição
nº 2 do referido arƟ go 19º, o certo é que o legislador consƟ tucional do trânsito de pessoas e da circulação de veículos, cabe às auto-
enquadrou no estado de emergência as situações em que os âmbi- ridades assegurar os meios necessários ao cumprimento do dis-
tos referidos no nº 2 se revistam de menor gravidade, apenas po- posto na declaração, parƟ cularmente no tocante ao transporte,
dendo “determinar a suspensão de alguns dos direitos, liberdades e alojamento e manutenção dos cidadãos afetados;”.
garanƟ as suscepơ veis de serem suspensos”. Mas é ao nível da legislação publicada pelo Governo que a execu-
Ou seja, há direitos que, pela sua natureza e dignidade consƟ tucio- ção da declaração do estado de emergência conhece as medidas e
nal, nunca poderão ser aƟ ngidos ou prejudicados pela declaração procedimentos que devem ser observados durante este período.
do estado de emergência, como sejam o direito à vida, à integrida- Assim, foi através do Decreto nº 2-A/2020, de 18 de Março, do
de pessoal, à idenƟ dade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a Decreto nº 2-B/2020, de 2 de Abril, e do Decreto nº 2-C/2020, de
não retroacƟ vidade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos 17 de Abril, que foram defi nidos – entre outros – os princípios,
e a liberdade de consciência e de religião. Por outro lado, em caso os deveres, as condições de limitação de circulação, a circulação
algum pode a declaração do estado de emergência afectar os regi- de mercadorias, a suspensão do exercício de acƟ vidades, e as re-
mes consƟ tucionais defi nidores da competência e funcionamento gras a observar em matéria de suspensão excepcional da cessão
dos órgãos de soberania e de governo próprio das Regiões Autóno- de contratos. De entre eles, porque absolutamente limitadores da
mas ou dos direitos e imunidades dos seus Ɵ tulares. É exactamente circulação de pessoas – mecanismo imprescindível para evitar a
aquela basilar ressalva de direitos que se encontra estatuída e salva- propagação da doença –, merecem especial destaque o dever de
guardada no arƟ go 5º de ambos os Decretos do Presidente da Re- confi namento obrigatório – pessoas em situações de doença, de
pública – acima mencionados – preceituando, ainda, os seus nºs 2 e infecção e que sejam objecto de vigilância acƟ va –, o dever geral
3, que “os efeitos da presente declaração não afectam igualmente, de protecção, para cidadãos de certas faixas etárias e para aqueles
em caso algum, as liberdades de expressão e de informação”, bem com determinadas condições de saúde, e o dever geral de recolhi-
como se defi ne que nunca poderá “ser posto em causa o princípio do mento domiciliário, como factor determinante para que exista um
Estado unitário ou a conƟ nuidade territorial do Estado”. efecƟ vo confi namento no domicílio, salvo situações e acƟ vidades
Temos assim que ao estado de emergência está reservado o regi- expressamente permiƟ das.
me que será menos gravoso para o quadro dos direitos fundamen- No âmbito dos arƟ gos 45º e 46º – ambos do arƟ culado do De-
tais, apenas podendo restringir alguns deles com menor intensidade creto nº 2-C/2020 – o diploma prevê (45º) que os actos adminis-
que aquela que é inerente ao estado de síƟ o. traƟ vos que executem as medidas do diploma são efi cazes através
É, contudo, fulcral atentar no que estabelece o nº 6 do mencio- da mera noƟ fi cação ao desƟ natário, sendo dispensadas as demais
nado preceito (arƟ go 19º), no qual se estatui que a declaração do formalidades aplicáveis, estando previsto (46º), ainda, em sede de
estado de emergência confere às autoridades “competência para fi scalização, o regime de observância das ordens legíƟ mas ema-
tomarem as providências necessárias e adequadas ao pronto resta- nadas pelas forças de segurança, bem como, no aplicável, o regi-
belecimento da normalidade consƟ tucional”, o que implicará, na es- me de aplicação do crime de desobediência, o qual é conjugado
trita medida do permiƟ do e do necessário, que a suspensão apenas com a violação dos princípios e medidas defi nidos nos arƟ gos 3º
possa abranger os direitos cujo exercício possa colocar em causa os (confi namento obrigatório), e arƟ gos 9º a 11º (sobre proibição de
objecƟ vos defi nidos para o estado de excepção declarado, e bem as- desenvolver acƟ vidades, e encerramento de instalações e estabe-
sim que a intensidade – da suspensão – seja limitada ao estritamen- lecimentos).
te exigido na declaração, e pelo menor período de tempo possível. Especifi camente nos espaços integrantes do Domínio Público
Aliás, em observância ao esƟ pulado no nº 5, do arƟ go 9º, da CRP, e MaríƟ mo, áreas balneares e demais espaços costeiros com ap-
no nº 1, do arƟ go 5º, da Lei nº 44/86, de 30 de Setembro, o próprio Ɵ dão de uso balnear, zonas portuárias, águas interiores e águas
arƟ go 3º de ambos os Decretos do Presidente da República defi ne territoriais, tem parƟ cular importância o defi nido no arƟ go 9º do
que o estado de emergência tem a duração de 15 dias, situando, Decreto e remissão para as acƟ vidades elencadas nos n 1 e 4 do
os
com rigor, os respecƟ vos início e termo. seu Anexo I, bem como o estabelecido no arƟ go 11º – proibição
Quanto à formalidade do procedimento, e antes da defi nição e de- de desenvolvimento de acƟ vidades no âmbito da prestação de
claração, pelo Presidente da República, do estado de emergência, serviços.
o Governo deve ser auscultado antes de ser exarado o pedido de No respeitante aos órgãos da AMN, em especial as Capitanias
autorização à Assembleia da República, sendo que o Parlamento se dos Portos e os Comandos Locais da Polícia MaríƟ ma, existem
pronuncia através de uma Resolução a qual, no caso do Decreto nº mecanismos específi cos que visam a execução das medidas e
14-A/2020, correspondeu à Resolução nº 15-A/2020, de 18 de Mar- procedimentos nos respecƟ vos espaços de jurisdição, mas essa
ço. Intervindo a Assembleia da República através do mecanismo de será matéria que, a par de outras, abordaremos na Parte II do
autorização prévia, a sua não existência indicia uma situação de in- arƟ go.
consƟ tucionalidade da declaração fi nal.
Dr. Luís da Costa Diogo
Diretor Jurídico da DGAM
A EXECUÇÃO DA DECLARAÇÃO DO ESTADO
CTEN TSN-JUR Susana Ramos
DE EMERGÊNCIA Consultora Jurídica da DIRJUR (DGAM)
O regime consƟ tucional do estado de emergência é regulamen-
tado e complementado pela legislação ordinária, estando previsto N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfi co
MAIO 2020 23