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REVISTA DA ARMADA | 552

              envolvido numa dessas intentonas, a Abrilada. D. Miguel exilou-  Maria da Glória, princesa do Grão-Pará (2 de maio). Dois dias
              -se primeiro em Paris, na França, mas foi depois acolhido na corte   antes, a 29 de abril, reiterando perante o Brasil e o mundo as
              de Viena de Áustria.                                suas convicções liberais, outorgou uma Carta Cons  tucional aos
               D. Miguel assumira-se desde cedo como forte opositor às ideias   portugueses” .
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              liberais, que via consubstanciadas na maçonaria e nas ideias   As intensas negociações entre absolu  stas, apoiantes de D. Miguel,
              democrá  cas, como fi ca bem claro nas palavras que proferiu no   e liberais, que davam o seu suporte polí  co a D. Maria, levou
              seu Grito durante a Abrilada – “Esmagar duma vez a pes  lenta   a um acordo que passava pelo regresso de D. Miguel do exílio
              cáfi la de pedreiros livres... ou acabar na gloriosa luta em que   e pelo seu casamento com Dona Maria, sua sobrinha. Assim a
              estamos empenhados, ou cortar pela raiz o mal que nos afronta,   abdicação de D. Pedro fi cava sujeita a essas duas condições: o
              acabando de uma vez com a infernal raça maçónica, antes que   juramento da Carta Cons  tucional pelas cortes e por D. Miguel
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              ela acabe connosco” .                               e o casamento deste com Dona Maria. Esta aparentemente hábil
               Logo que soube da no  cia da morte de D. João VI, D. Pedro,   solução parecia contentar ambas as partes, garan  a a con  nui-
              então Imperador do Brasil, percebeu que não podia reunir as   dade dinás  ca pela linha do primogénito D. Pedro, dando, no
              duas coroas, pelo que teria de optar por uma delas. “D. Pedro   entanto, alguma preponderância a D. Miguel dada a idade de
              optou pela coroa imperial e abdicou da portuguesa em sua fi lha   Dona Maria, que teria então 8 anos.

                                          ESTRATÉGIA DIRETA VS ESTRATÉGIA INDIRETA

               In Strategy the longest way around is o  en the shortest way there.  con  nuação através da batalha a produzirá com toda a certeza.
                                                        Liddell Hart  Por outras palavras, o obje  vo da estratégia é conseguir a desar-
                                                                    culação; a sua consequência pode ser tanto a desagregação do
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                A palavra Estratégia tem a sua raiz e  mológica no vocábulo   inimigo ou a derrota em batalha” .
               grego an  go stratēgía (στρατηγία) que signifi cava general ou   Assim ações visando deslocar o centro de gravidade do ini-
               condução do exército. A palavra forma-se de stratos – exército   migo, atacá-lo pelas costas, cortar as suas linhas de abasteci-
               – e de ago – condução, direção.                    mento e reservas, impedir a sua capacidade de comunicação,
                Muitos autores tem avançado com defi nições de Estratégia   destruir o moral e a vontade de combater quer nos dirigentes
               todas rela  vamente coincidentes mas com ligeiras fl utuações.   quer nas tropas, enganá-lo quanto aos obje  vos a a  ngir, sem-
               Uma das mais famosas é a de Clausewitz, que diz que a Estra-  pre deram bons resultados e levaram à vitória mesmo em situa-
               tégia é a “Arte de u  lizar as batalhas para a  ngir os fi ns da   ções de inferioridade numérica e material. A um plano de ação
               guerra”, a qual defi ne numa ainda mais famosa frase como “a   geral de condução da guerra assente nesta perspe  va chamou
               con  nuação da polí  ca por outros meios”. Já o General Beaufre   Estratégia Indireta.
               avança com a ideia “l’art de la dialec  que des volontés emplo-  A perspe  va indireta evita enfrentar o inimigo em batalha
               yant la force pour résoudre leur confl it”.         aberta antes que este esteja desar  culado e enfraquecido
                Em Portugal o General Cabral Couto assume-se como o grande   moral e materialmente, só avançando para o confronto depois
               teorizador nacional da estratégia, tendo-a defi nido da seguinte   de assegurada uma situação de vantagem estratégica.
               forma: “a ciência e a arte de desenvolver e u  lizar as forças   A estratégia indireta mantém hoje plena atualidade. Atente-se
               morais e materiais de uma unidade polí  ca ou coligação, a fi m de   nas palavras do Gen. Sco   Morrison quando Comandante das
               se a  ngirem obje  vos polí  cos que suscitam, ou podem suscitar,   Forças Especiais da NATO estacionadas no quartel-general em
               a hos  lidade de uma outra vontade polí  ca”.      Mons, na Bélgica, referindo-se à guerra contra o extremismo islâ-
                A estratégia pode ser direta ou indireta. Direta quando visa   mico, nomeadamente através do apoio a forças moderadas em
               imediatamente a batalha e o cruzar de forças com o inimigo.   países muçulmanos: “Uma estratégia de apoio e de infl uência
               Indireta quando recorre a outros meios para a  ngir o mesmo   procura obter uma vantagem posicional, exercida primariamente
               obje  vo.                                          por forças locais com vista a minar as fundações e o ambiente
                Basil Liddell Hart (1895-1970) foi o grande pensador da estra-  que permitem o equilíbro e a harmonia de um adversário ”.
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               tégia indireta. Apoiado num monumental estudo das guerras,   A guerra ganha-se com ações que visem perturbar a cadeia
               desde a an  guidade até à Primeira Guerra Mundial, Hart escre-  de comando e controlo, recusar santuário, interditar linhas de
               veu a sua obra principal que in  tulou de Estratégia (Strategy).   comunicação e a obtenção de informação que permita anteci-
               Nela defende a superioridade da estratégia indireta sobre a   par comportamentos e decisões .
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               estratégia direta.                                   Veremos de seguida como a Marinha foi integrada pelas for-
                Para Hart a estratégia é a “arte de distribuir e aplicar os meios   ças liberais na sua estratégia indireta de reposição da legalidade
               militares para a  ngir  os  fi ns determinados pela polí  ca” .   dinás  ca no trono de Portugal.
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               Assim a Estratégia confi na-se à esfera militar, sendo subordi-
               nada do que chama a Grande Estratégia (Grand Strategy) que
               seria do domínio da polí  ca e comandada pelo governo e, em              APROXIMAÇÃO ESTRATÉGICA
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               que se inseriria como um dos seus pilares principais, mas que
               não único, a Estratégia.                                                         DIRETA    INDIRETA
                Da experiência histórica Hart conclui que um ataque direto
               a forças fortes e defensivas, bem posicionadas, pra  camente   APROXIMAÇÃO      FAVORECE   FAVORECE
               nunca resulta mesmo quando o atacante tem superioridade   ESTRATÉGICA   DIRETA  ATOR FORTE ATOR FRACO
               numérica. De facto, Hart defendia o princípio da economia de   DUM ATOR FORTE
               meios e que o obje  vo do estratega militar “não é tanto procurar    INDIRETA   FAVORECE   FAVORECE
               a batalha mas antes procurar uma situação estratégica tão van-                 ATOR FRACO ATOR FORTE
               tajosa que se ela própria não produz uma solução imediata a sua   In Arreguín-To   “Strategic Interac  on Tipology” (2001)




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