Page 17 - Revista da Armada
P. 17

REVISTA DA ARMADA | 566

          ção aos vários teatros de guerra possíveis de ocorrer, conforto da   à C.U.F., um influente e poderoso grupo económico português.
          guarnição, aparelho motor seguro e de baixo custo de manuten-  Escreveram-se, então, cartas ao Chefe do Governo . O Ministro
                                                                                                     12
          ção” . Este conceito foi apresentado ao ALM CEMA em fevereiro   da Marinha respondeu. A decisão não foi alterada.
             7
          de 1966, que desde logo aprovou o Programa .         Para  permitir  a  conclusão  do  projeto  básico,  efetuou-se  uma
                                             8
           Já numa fase mais avançada, a firma que tinha efetuado a in-  análise de custo/benefício para a escolha dos motores principais.
          terpretação dos requisitos antes da interrupção do programa de   O princípio da comunalidade logística teve um peso elevado, re-
          substituição dos avisos, ficou com o “trabalho de pormenoriza-  caindo assim a escolha em motores muito semelhantes aos que
          ção, sob a direção da Inspeção das Construções Navais” . Por ou-  equipavam as fragatas da classe Cte João Belo. Também aqui a
                                                    9
          tras palavras: a responsabilidade do projeto era da Marinha.  escolha foi acertada, pois os resultados foram excelentes e o ciclo
           Faltava ainda uma decisão importante. Onde construir os navios.  de manutenção cumprido sem limitações. O facto da Marinha ter
           De acordo com o transmitido pelo CALM Rogério d´Oliveira, “es-  28 motores do mesmo fabricante, tipo e geração, permitiu erguer
          teve sempre no propósito da Marinha construírem-se os navios   capacidades de reparação e de formação inigualáveis ao longo de
          em estaleiros nacionais, mas a experiência das construções ante-  mais de 50 anos.
          riores tinha evidenciado que a capacidade de produzir navios den-  Numa lógica de integração e coordenação, além de assegurar
          tro de prazos úteis e preços razoáveis era duvidosa” , o que levou   a colaboração das Marinhas dos países da construção, foi neces-
                                                 10
          o Governo a abrir um concurso limitado de âmbito internacional,   sário estabelecer uma delegação da DCN junto do estaleiro em
          tendo sido consultados 3 estaleiros nacionais e 3 estrangeiros.  Hamburgo e uma outra em Cartagena e Cádis, pois, em Espanha,
           A decisão foi adjudicar a construção de 2 navios ao estaleiro ale-  a terceira corveta foi construída num outro estaleiro do mesmo
          mão B+V e 2 navios ao estaleiro do Estado espanhol E. N. Bazan,   consórcio. A supervisão da construção dos motores foi, também,
          embora, logo de seguida, tenha sido adjudicada a construção de   efetuada na fábrica em França.
          mais um navio a cada um dos estaleiros . Foram as seis corvetas   Quem já acompanhou a construção de um navio, ou mesmo
                                        11
          da 1ª série.                                        um processo de reparação no 3º escalão, sabe que é uma tarefa
                                                              cheia de imponderáveis. Imagine-se a construção de 6 navios, por
                                                              dois estaleiros diferentes, em locais bastante afastados e sem os
                                                              meios informáticos e de comunicação de hoje. A este propósito,
                                                              refere o CALM Rogério d´Oliveira: “foi necessário estabelecer um
                                                              sistema de informação e de coordenação entre os dois estaleiros
                                                              e entre as duas delegações, debaixo duma orientação central”.
                                                              Sem sombra de dúvidas, foi uma realização notável. Foi também
                                                              um embrião da cooperação internacional, pois todos os estalei-
                                                              ros participantes projetaram e construíram navios baseados nes-
                                                              te projeto nacional. As 6 corvetas da 1ª série foram entregues
                                                              num prazo de quinze meses.







          Corveta António Enes, cerimónia de lançamento ao mar, E. N. Bazan, Cartagena,
          agosto de 1969 (Foto do espólio do CALM ECN Rogério d´Oliveira/Museu de Marinha)
           Lição aprendida. Havendo uma vulnerabilidade no Sistema de
          Forças e, assim, uma necessidade, os sucessivos atrasos na deci-
          são poderão conduzir mais tarde a decisões apressadas e menos
          pensadas, condicionadas pelo fator urgência. E a urgência limita o
          racional da decisão. Em 1966 o abate dos avisos era já inevitável,
          e as exigências da guerra de África “apressaram” a urgência. Pode
          afirmar-se que, para a Marinha, os resultados imediatos foram
          bons, mas também é lícito afirmar que, numa perspetiva de futu-
          ro, foi uma decisão sem visão e que fez parar o desenvolvimento   CALM  ECN  Rogério  d´Oliveira,  câmara  de  oficiais,  assinatura  do  ato  de  receção
          da construção naval militar no País. A necessidade e o fator finan-  da corveta João Coutinho, março de 1970 (Foto do espólio do CALM ECN Rogério
          ceiro falaram mais alto.                            d´Oliveira/Museu de Marinha)
                                                               Relativamente  a  estas  corvetas  importa  esclarecer  (mais  uma
          ORGANIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO                       vez) que foram navios projetados para todas as missões da Mari-
          DO PROGRAMA                                         nha tanto no Ultramar como no Atlântico Norte. No entanto, por
                                                              força das circunstâncias, foram utilizados sistemas e equipamentos
           A organização e o desenvolvimento do Programa também fica-  de navios abatidos, depois de reparados, outros adquiridos usados
          ram condicionados pela decisão (nada pacífica) de não adjudicar   e desatualizados – método utilizado para reduzir o custo inicial e,
          a construção a estaleiros nacionais. Por um lado, Portugal estava   assim, tornar possível a concretização do projeto, mas sobretudo
          muito condicionado na aquisição de material de guerra em con-  pelos RO serem menos exigentes, dado que os teatros de opera-
          sequência da política ultramarina, ficando assim limitado nas op-  ções em que iriam ser utilizados eram compatíveis com essa con-
          ções no estrangeiro. Por outro, a nível nacional provocou uma re-  figuração. Para ultrapassar esta limitação, esteve sempre pensada
          ação muito violenta do estaleiro líder da construção das fragatas   uma modernização, a concretizar oportunamente, pelo que foram
          da classe Almirante Pereira da Silva – a Lisnave – que pertencia   previstas generosas margens de crescimento.


                                                                                           SETEMBRO / OUTUBRO 2021  17
   12   13   14   15   16   17   18   19   20   21   22