Page 345 - Revista da Armada
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desvio para exercitar a                                                              pelo Contra-Almirante
         sua força e ficar a conhe-                                                            Ball, a fim de render a
         cer melhor as qualidades                                                             já muito desgastada
         náuticas dos navios que a                                                            – e castigada – esqua-
         compunham. A 9 de Ju-                                                                dra portuguesa. Numa
         nho recebe, finalmente,                                                               clara demonstração de
         ordens para seguir para                                                              arrogância e de falta de
         o Mediterrâneo.                                                                      cortesia – atitude que se
           Chega a Lagos, para                                                                tornaria habi tual por
         reabastecer, no dia 30. Ali                                                          parte dos comandan-
         incorpora um brulote (9)                                                             tes britânicos (com a
         inglês – “Incendiary” – en-                                                          implícita conivência
         viado por Jervis. Embar-                                                             do seu Almirante) em
         ca, também, no seu esta-                                                             relação aos seus alia-
         do-maior, dois tenentes                                                              dos lusos – Ball negli-
         ingleses para o auxilia-                                                             gencia ostensivamente
         rem no serviço de sinais                                                             as deferências devidas
         entre as duas esquadras   Batalha do Nilo.                                           a um oficial mais anti-
         que, naturalmente, utili-                                                            go, sem que alguma vez
         zavam diferentes procedimentos.    as suas primeiras instruções: efectuar blo-  viesse por tal a ser repreendido. Contudo,
           No mesmo dia larga com o navio-chefe para  queio naval à ilha de Malta, cuja popula-  não se mostraria mais competente do que
         se encontrar no mar com Jervis. Durante o en-  ção se revoltara contra o ocupante Francês.  o seu antecessor – muito pelo contrário –,
         contro recebe instruções para se ir juntar, no  Para lá se dirige sem
         Mediterrâneo, aos navios do Almirante Nel-  demora, cumprindo a       O Navio de Linha
         son, ficando acordado que a esquadra conjun-  sua missão com exem-
         ta ficaria sob o comando do oficial que tivesse  plar eficácia: no espaço   Foi em finais do séc. XVII que o navio de linha fez a sua aparição. De
         sob as suas ordens maior número de navio, ou  de um mês nove navios   acordo com um novo conceito, os principais navios das esquadras (compri-
                                                                 mentos da ordem dos 70 m e à volta das 3500 T de deslocamento) passavam
         seja do comandante da esquadra inglesa (10).  são apresados e é pres-  a dispor, no seu costado, de várias fileiras corridas de peças de artilharia,
         Regressa a Lagos, reabastece os navios e larga,  tado apoio militar e lo-  cujo número, oscilava, habitualmente, entre 70 e a centena.
         sem demora, em demanda de Nelson.  gístico aos revoltosos.   Dispondo vários destes navios numa coluna contínua (daí a designação
           Já no Mediterrâneo, procura obter infor-  Porém, a guarnição   de navio “de linha”), oferecendo os seus costados ao inimigo, construía-se
         mações do seu paradeiro em Liorne e em Ná-  francesa, fortemente   uma cerrada e poderosa bateria artilheira, verdadeira muralha de fogo com
                                                                 um formidável poder de destruição, É desta altura que surge a preocupação
         poles, sendo informado que se encontra ao  entrincheirada, não se   de uniformizar a construção destes navios, de modo a dotá-los de carac-
         largo da costa do Egipto. Durante o trânsito  rende. Logo este pre-  terísticas semelhantes, nomeadamente no que respeitava a comprimento,
         perde o bergantim “Falcão” que, devido a  texto é aproveitado   boca, bordo livre, distância das bocas de fogo à linha de água e, sobretudo,
         má manobra, abalroa a “Príncipe Real”. En-  pelos ingleses para   elementos evolutivos, pois era de toda a conveniência que as manobras fos-
                                                                 sem executadas em simultâneo, como um gigantesco todo.
         contra os navios ingleses a 24 de Agosto, ao  comentarem, entre si   Embora nos finais do séc. XVIII navios mais ligeiros, como as fragatas, de-
         largo de Alexandria, porto ao qual efectua-  – muito injustamente,   monstrassem, já, um elevado valor militar por mercê da sua grande mobilidade,
         vam bloqueio.                      diga-se –, a suposta in-  era o navio de linha o principal interveniente das grandes batalhas navais.
           Pouco tempo antes (1 de Agosto), tinha  competência dos por-  Em Portugal persistiu a sua designação como “nau”.
         sido travada a decisiva batalha do Nilo (ou  tugueses na condução
         de Aboukir (11)), na qual Nelson destroçara  de acções independentes.   pois em Março do ano seguinte os france-
         a esquadra francesa quase por completo e   A 15 de Outubro chega a Malta uma for-  ses conseguiriam furar o bloqueio e abas-
         frustrara a Napoleão o intento de conquis-  ça de quatro navios ingleses comandada  tecer as suas tropas.
         tar o Egipto. Foi, assim, por pouco que a                                 Mas foi ainda ao largo de Malta, antes
         Marinha Portuguesa perdeu a ocasião de                                  da rendição ter sido formalizada, que se
         participar naquele histórico combate. No                                deu, finalmente, o encontro com os na-
         entanto, Napoleão, ao ter conhecimento                                  vios de Nelson, tendo o Marquês man-
         da presença de navios portugueses na-                                   dado efectuar as devidas salvas. Uma
         quelas paragens, convence-se de que es-                                 vez rendido, retirou-se para fabricos.
         tes tomaram parte na destruição da sua                                    Pouco tempo permaneceu em terra,
         esquadra e jura vingança, prometendo                                    pois a 15 de Novembro Nelson decide
         que Portugal “pagará com lágrimas de                                    fazer um desembarque em Liorne para
         sangue a afronta”.                                                      auxiliar o rei de Nápoles na sua tenta-
           Como Nelson já ali não se encontrava                                  tiva de expulsar os franceses de Roma
         (dirigira-se a Nápoles), o Marquês pros-                                (apesar de Napoleão se encontrar, ainda
         segue as suas diligências para o encontrar.                             no Egipto (12), a França decidira prosse-
         Antes, porém, oferece os seus préstimos a                               guir a sua anterior campanha da Itália)
         Hood, comandante da força inglesa, ten-                                 e pede a sua colaboração. D. Domin-
         do estes sido recusados (mais tarde, aque-                              gos acorre prontamente, depois de ter
         le queixar-se-ia ao seu Almirante de falta                              apressado as reparações dos seus na-
         de colaboração por parte dos portugue-                                  vios. A cidade rende-se, sem combate,
         ses). Nelson escrevera, porém, uma carta                                a 29 do mesmo mês.
         manifestando o desejo de que a esquadra                                   Entretanto, três navios portugueses –
         portuguesa rendesse a inglesa. A verdade                                “S. Sebastião”, “Benjamim” e “Balão” –
         é que estas intenções já não chegaram em                                são empregues no bloqueio de Génova
         tempo útil e Hood não as soube – ou não                                 e na vigilância do porto de Toulon, sob
         as quis – transmitir.                                                   as ordens do Capitão-de-Mar e Guerra
           A 15 de Setembro recebe, finalmente,   Almirante Horatio Nelson.       Troubridge. Isto veio criar um conflito
                                                                                    REVISTA DA ARMADA U NOVEMBRO 2004  19
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