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desvio para exercitar a pelo Contra-Almirante
sua força e ficar a conhe- Ball, a fim de render a
cer melhor as qualidades já muito desgastada
náuticas dos navios que a – e castigada – esqua-
compunham. A 9 de Ju- dra portuguesa. Numa
nho recebe, finalmente, clara demonstração de
ordens para seguir para arrogância e de falta de
o Mediterrâneo. cortesia – atitude que se
Chega a Lagos, para tornaria habi tual por
reabastecer, no dia 30. Ali parte dos comandan-
incorpora um brulote (9) tes britânicos (com a
inglês – “Incendiary” – en- implícita conivência
viado por Jervis. Embar- do seu Almirante) em
ca, também, no seu esta- relação aos seus alia-
do-maior, dois tenentes dos lusos – Ball negli-
ingleses para o auxilia- gencia ostensivamente
rem no serviço de sinais as deferências devidas
entre as duas esquadras Batalha do Nilo. a um oficial mais anti-
que, naturalmente, utili- go, sem que alguma vez
zavam diferentes procedimentos. as suas primeiras instruções: efectuar blo- viesse por tal a ser repreendido. Contudo,
No mesmo dia larga com o navio-chefe para queio naval à ilha de Malta, cuja popula- não se mostraria mais competente do que
se encontrar no mar com Jervis. Durante o en- ção se revoltara contra o ocupante Francês. o seu antecessor – muito pelo contrário –,
contro recebe instruções para se ir juntar, no Para lá se dirige sem
Mediterrâneo, aos navios do Almirante Nel- demora, cumprindo a O Navio de Linha
son, ficando acordado que a esquadra conjun- sua missão com exem-
ta ficaria sob o comando do oficial que tivesse plar eficácia: no espaço Foi em finais do séc. XVII que o navio de linha fez a sua aparição. De
sob as suas ordens maior número de navio, ou de um mês nove navios acordo com um novo conceito, os principais navios das esquadras (compri-
mentos da ordem dos 70 m e à volta das 3500 T de deslocamento) passavam
seja do comandante da esquadra inglesa (10). são apresados e é pres- a dispor, no seu costado, de várias fileiras corridas de peças de artilharia,
Regressa a Lagos, reabastece os navios e larga, tado apoio militar e lo- cujo número, oscilava, habitualmente, entre 70 e a centena.
sem demora, em demanda de Nelson. gístico aos revoltosos. Dispondo vários destes navios numa coluna contínua (daí a designação
Já no Mediterrâneo, procura obter infor- Porém, a guarnição de navio “de linha”), oferecendo os seus costados ao inimigo, construía-se
mações do seu paradeiro em Liorne e em Ná- francesa, fortemente uma cerrada e poderosa bateria artilheira, verdadeira muralha de fogo com
um formidável poder de destruição, É desta altura que surge a preocupação
poles, sendo informado que se encontra ao entrincheirada, não se de uniformizar a construção destes navios, de modo a dotá-los de carac-
largo da costa do Egipto. Durante o trânsito rende. Logo este pre- terísticas semelhantes, nomeadamente no que respeitava a comprimento,
perde o bergantim “Falcão” que, devido a texto é aproveitado boca, bordo livre, distância das bocas de fogo à linha de água e, sobretudo,
má manobra, abalroa a “Príncipe Real”. En- pelos ingleses para elementos evolutivos, pois era de toda a conveniência que as manobras fos-
sem executadas em simultâneo, como um gigantesco todo.
contra os navios ingleses a 24 de Agosto, ao comentarem, entre si Embora nos finais do séc. XVIII navios mais ligeiros, como as fragatas, de-
largo de Alexandria, porto ao qual efectua- – muito injustamente, monstrassem, já, um elevado valor militar por mercê da sua grande mobilidade,
vam bloqueio. diga-se –, a suposta in- era o navio de linha o principal interveniente das grandes batalhas navais.
Pouco tempo antes (1 de Agosto), tinha competência dos por- Em Portugal persistiu a sua designação como “nau”.
sido travada a decisiva batalha do Nilo (ou tugueses na condução
de Aboukir (11)), na qual Nelson destroçara de acções independentes. pois em Março do ano seguinte os france-
a esquadra francesa quase por completo e A 15 de Outubro chega a Malta uma for- ses conseguiriam furar o bloqueio e abas-
frustrara a Napoleão o intento de conquis- ça de quatro navios ingleses comandada tecer as suas tropas.
tar o Egipto. Foi, assim, por pouco que a Mas foi ainda ao largo de Malta, antes
Marinha Portuguesa perdeu a ocasião de da rendição ter sido formalizada, que se
participar naquele histórico combate. No deu, finalmente, o encontro com os na-
entanto, Napoleão, ao ter conhecimento vios de Nelson, tendo o Marquês man-
da presença de navios portugueses na- dado efectuar as devidas salvas. Uma
quelas paragens, convence-se de que es- vez rendido, retirou-se para fabricos.
tes tomaram parte na destruição da sua Pouco tempo permaneceu em terra,
esquadra e jura vingança, prometendo pois a 15 de Novembro Nelson decide
que Portugal “pagará com lágrimas de fazer um desembarque em Liorne para
sangue a afronta”. auxiliar o rei de Nápoles na sua tenta-
Como Nelson já ali não se encontrava tiva de expulsar os franceses de Roma
(dirigira-se a Nápoles), o Marquês pros- (apesar de Napoleão se encontrar, ainda
segue as suas diligências para o encontrar. no Egipto (12), a França decidira prosse-
Antes, porém, oferece os seus préstimos a guir a sua anterior campanha da Itália)
Hood, comandante da força inglesa, ten- e pede a sua colaboração. D. Domin-
do estes sido recusados (mais tarde, aque- gos acorre prontamente, depois de ter
le queixar-se-ia ao seu Almirante de falta apressado as reparações dos seus na-
de colaboração por parte dos portugue- vios. A cidade rende-se, sem combate,
ses). Nelson escrevera, porém, uma carta a 29 do mesmo mês.
manifestando o desejo de que a esquadra Entretanto, três navios portugueses –
portuguesa rendesse a inglesa. A verdade “S. Sebastião”, “Benjamim” e “Balão” –
é que estas intenções já não chegaram em são empregues no bloqueio de Génova
tempo útil e Hood não as soube – ou não e na vigilância do porto de Toulon, sob
as quis – transmitir. as ordens do Capitão-de-Mar e Guerra
A 15 de Setembro recebe, finalmente, Almirante Horatio Nelson. Troubridge. Isto veio criar um conflito
REVISTA DA ARMADA U NOVEMBRO 2004 19