Page 199 - Revista da Armada
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A Comissão Cultural Publica o Diário

                 de Uma Viagem de Guardas-Marinhas


              s viagens de instrução de guardas-  poneses foi evidente e face à chegada maci-  cinco unidades navais portuguesas efectua-
              -marinhas constituem habitualmente  ça de refugiados de Hong-Kong e da China a  ram conjuntamente o périplo de África.
         Arecordações inesquecíveis na carreira  população cresceu exponencialmente, o que   Ao longo da obra, escrita na cidade da Hor-
         do oficial da Armada e se essas recordações  mais agravou a situação.Apesar de assober-  ta em 1931, o 1TEN Andrade e Silva descreve
         foram redigidas diariamente, quando ainda  bado por múltiplos afazeres o Comandante  a sua viagem de guarda-marinha, exprimin-
         são sentidos fortemente os momentos recen-  Andrade e Silva redigiu semanalmente, para  do as impressões recolhidas quer durante as
         temente vividos, a sua descrição, apesar de  o jornal macaense “A União”, uma crónica  navegações quer nas estadias nos 31 portos
         subjectiva, permite ao leitor um conhecimen-  que intitulou “A Luta no Mar” em que descre-  e baías em que fez escala.
         to muito próximo da realidade passada.  veu e comentou, com base nos noticiários da   Todo o texto é enriquecido por fotografias
           Uma das viagens que ficou                                                       que reproduzem além dos na-
         famosa foi a que deu volta a                                                     vios da Força, interessantes as-
         África nos recuados anos de                                                      pectos paisagísticos e arquitec-
         1924 a 1925 e da qual feliz-                                                     tónicos e onde a figura humana
         mente existem dois volumes                                                       tem uma significativa presença.
         manuscritos que, escritos por                                                    Também para melhor esclareci-
         um guarda-marinha que a efec-                                                    mento do leitor o Tenente An-
         tuou, relata o seu dia-a-dia.                                                    drade e Silva inclui preciosos
           A Comissão Cultural da Ma-                                                     desenhos a tinta da China da
         rinha, considerando que tão                                                      sua autoria, correspondentes a
         preciosos testemunhos mere-                                                      mapas, croquis e diversas per-
         ciam uma maior divulgação e                                                      sonagens. A vida a bordo é con-
         tendo os mesmos sido pronta-                                                     tada de um modo admirável. O
         mente disponibilizados pelo                                                      calor, o balanço, a limitação do
         ALM Andrade e Silva, filho do                                                     espaço, as restrições da aguada,
         autor, decidiu promover a sua                                                          os quartos feitos debai-
         publicação.                                                                            xo de chuvas tropicais,
           Assim, no passado dia 12 de                                                          as dificuldades de toda
         Maio, na Biblioteca Central, foi lançado o li-  rádio e da imprensa, o evo-            a ordem, nomeada-
         vro “Périplo de África (1924-1925)” da autoria  luir da guerra. Igualmente             mente no âmbito da
         do 1TEN António de Andrade e Silva.  foi salientado o seu livro “Eu                    alimentação, são, entre
           O evento, presidido pelo VALM Pires Ne-  estive em Macau durante a                   muitas outras, situações
         ves no exercício das funções de CEMA e rea-  Guerra”, onde relata o que                referenciadas.
         lizado perante numerosa assistência da qual  foram as dificuldades por-                  A sempre divertida
         se salientava o ALM Andrade e Silva acom-  que passou e cuja leitura é                 festa da passagem da li-
         panhado pelos seus familiares e amigos, foi  fundamental para quem de-                 nha está excelentemen-
         iniciado com uma exposição do Presidente  sejar conhecer um período                    te descrita e acompa-
         da Comissão Cultural, CALM Leiria Pinto, que  tão conturbado da história               nhada de elucidativas
         deu a conhecer, em primeiro lugar, as princi-  de Macau.                               fotografias, assim como
         pais notas biográficas dos autor.     Vários louvores que re-                           assinalada a tragédia da
           Da carreira naval do Comandante Andrade  cebeu foram citados, os                     morte do mestre de um
         e Silva, que decorreu de 1923, data em que  quais de comum enaltecem                   dos navios e a como-
         concluiu o curso da Escola Naval, a 1960,  as suas qualidades de inte-                 vente cerimónia que
         ano do seu falecimento, foram historiadas as  ligência, desembaraço e                  acompanhou o lança-
         suas várias comissões a bordo, das quais uma  sociabilidade aliadas a uma forte dedicação  mento do seu corpo ao mar.
         das primeiras foi o périplo de África, e os seus  pelo serviço e excelente espírito de colabo-  As transcrições do jornal de bordo  “O Bo-
         comandos no mar: a canhoneira “Bengo” e a  ração e camaradagem.       jador” e o guião de uma récita, tipo revista à
         canhoneira “Zaire”.                  O CALM Leiria Pinto concluiu as notas bio-  portuguesa, que nunca chegou a realizar-se,
           Das suas diversas comissões em terra me-  gráficas do autor do “Périplo de África” afir-  são de um humorismo notável. Nas impres-
         receram destaque as realizadas nos Açores,  mando: em Agosto de 1960 deixou o mundo  sões das terras visitadas ressaltam, de um
         1930 a 1936, como Director da Estação Me-  dos vivos aquele que criou amigos em todas  modo preciso, a sua história, a sua arquitec-
         teorológica da Marinha no Atlântico e do Pos-  as situações, onde devotadamente sempre  tura, os costumes das suas gentes e como é
         to Radio-Naval da Horta e em Peniche, nas  prestigiou a sua Marinha.  óbvio o comportamento dos guardas-mari-
         funções de Capitão do Porto, de Dezembro   Reportando-se ao livro publicado o Presi-  nhas sempre procurando impetuosamente a
         de 1938 a Maio de 1941.            dente da Comissão Cultural esclareceu que  companhia das beldades nativas.
           Foi depois referida, com mais pormenor, a  o mesmo narra uma viagem à volta do conti-  O CALM Leiria Pinto terminou a sua expo-
         sua espinhosa e delicada comissão de servi-  nente africano, de Outubro de 1924 a Junho  sição recomendando vivamente a leitura do
         ço nas funções de Capitão dos Portos e Chefe  de 25, de uma força naval portuguesa, a Divi-  “Périplo de África”, magnífico relato de uma
         dos Serviço de Marinha de Macau, de Maio de  são Naval Colonial. Apesar de se viver então o  viagem, realizada há já oito décadas, que um
         1941 a Janeiro de 46, isto é durante a II Guerra  período instável da 1ª Republica e a carência  guarda-marinha que nela participou teve a fe-
         Mundial no Pacífico, em que apesar do terri-  de meios da Marinha ser de tal modo con-  liz iniciativa de o redigir e a Comissão Cultural
         tório ser neutral viveria desde Janeiro 1941 até  frangedora que nas palavras do seu Ministro,  a honra de o publicar.
         Agosto de 45, data do fim da Guerra, tempos  Coman dante Pereira da Silva, se tinha atingido           Z
         terríveis em que o controlo por parte dos ja-  o zero naval, foi a primeira e única vez que   (Colaboração da Comissão Cultural da Marinha)
                                                                                      REVISTA DA ARMADA U JUNHO 2005  17
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