Page 342 - Revista da Armada
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observar o poço interior, em virtude da porta se
         encontrar abatida. À noite o efeito do sistema   Pequenos Grandes Navios
         de luzes é soberbo, transportando-nos inevi-
         tavelmente para um qualquer rio das mágicas   Senhor Almirante Chefe do Estado-Maior da  zer transportar por terra, de Nacala e do
         noites africanas…                   Armada                            Lumbo no Oceano Índico para o Lago
                                             Senhores Almirantes               Niassa, 5 LFP’S, 4 LDM’S e 3 LDP’S, numa
         AS LANCHAS MÉDIAS                   Senhores Oficiais, Sargentos e Praças  demonstração indescritível de vontade e de
         E PEQUENAS NO ULTRAMAR              Ex-Patrões das LDM’S              esforço humano perante os inúmeros obs-
                                             Ilustres Convidados               táculos que, embora sendo muito difíceis,
           O arranque das primeiras unidades de fu-                            foram sucessivamente ultrapassados com
         zileiros, na sequência do eclodir da guerra   Achou por bem V. EXª, senhor Almirante  êxito. Igual tarefa, embora de menor grau
         em África em 1961, veio criar a necessidade   CEMA, convidar-me para hoje, aqui, proferir  de dificuldade, foi o transporte de 3 LDP’S
         da construção de lanchas de desembarque.   algumas palavras alusivas a esta justa home-  de Luanda, do Lobito e de Moçâmedes
         Depois de adquiridas algumas embarcações   nagem da Marinha a todos os marinheiros e  para o Leste e Sudeste de Angola.
         em segunda mão, foram adquiridos os pla-  fuzileiros que, como combatentes ao servi-  Nunca será demais relembrar o estoicismo
         nos de construção das lanchas utilizadas no   ço de Portugal, ser-                     dos fuzileiros e de
         último conflito mundial, e desenvolvidos   viram nas lanchas                            todo o pessoal das
         os projectos de execução em estaleiros na-  de desembarque na                          lanchas que servi-
         cionais. Foram construídos então três mo-  guerra em África de                         ram na Esquadrilha
         delos de lanchas: pequenas (LDP), médias   1961 a 1974, em con-                        de Lanchas do Zai-
         (LDM) e grandes (LDG), estas últimas fora   dições particular-                         re, do Niassa e mais
         do contexto deste artigo. As classes peque-  mente difíceis.                           tarde no Rio Zam-
         nas abrangeram as classes LDP 100, LDP 200   Estou certo que a                         beze, Rio Cuando e
         e LDP 300. Nas lanchas médias foram cria-  lancha inserida neste                       Rio Cuito no Leste e
         das as classes LDM 100, LDM 200, LDM 300   local, irá simbolizar,                      Sudeste de Angola.
         e LDM 400. No total foram, entre 1961 e 1976,   para sempre, uma oração de agradecimento  Respeitamos muito o empenho e generosi-
         construídas 26 LDP`s e 65 LDM`s, o que para   e louvor, a todos quantos lutaram no Ultra-  dade, quantas vezes anónima, das guarni-
         a altura se podia considerar um esforço ver-  mar, morreram ou sobreviveram.    ções das LDM’S e LDP’S que, juntamente
         dadeiramente excepcional.             A História da Pátria não admite lacunas.  com os fuzileiros embarcados, em condições
           A sua distribuição pelo Ultramar foi a se-  Decorridos tantos anos, é tempo de os mili-  particularmente difíceis de risco, de isola-
         guinte: Guiné - 51, Angola - 15 e Moçam bi-  tares assumirem a sua inteira responsabilida-  mento, de habitabilidade e rigor do clima,
         que - 7, ficando algumas na Metrópole para   de na nossa História porquanto, por decisão  cumpriram durante anos seguidos sempre
         treino dos fuzileiros. As LDM`s dispunham   política, combateram em África, como em  prontos e sem desfalecimentos as suas mis-
         de uma peça Oerlinkon Mk II de 20 mm e   qualquer outro lado, sempre convictos de  sões de fiscalização, de apoio logístico e de
         duas metralhadoras MG 42, a sua velocida-  que esta seria a maneira mais adequada de  desembarque das nossas forças.
         de máxima era na ordem dos 9 nós e podiam   defender o interesse nacional.    Embora hoje seja muito difícil de avaliar ou
         transportar uma força de 80 homens.   No propósito de perpetuar o nosso re-  mesmo de imaginar o esforço exigido a todo
           O esforço de guerra para estas lanchas, nos   conhecimento, sinto-me particularmente  este pessoal, acabo sempre por recordar os
         três teatros ultramarinos atingiu a sua maior   honrado e grato, por ainda poder participar  patrões das LDM’S da Guiné, cabos da clas-
         expressão na Guiné, não só pelo maior volu-  pessoalmente nesta merecida evocação, que  se de manobra, alguns felizmente ainda hoje
         me de patrulhas e acções, mas também porque   testemunha o respeito, a admiração e a ver-  aqui presentes que, uma vez entregues a si
         registaram as únicas baixas em combate. Dada   dadeira gratidão de toda a Marinha para com  próprios, percorriam as unidades sob seu co-
         a especificidade daquela ex-província – recor-  os seus servidores que, quando necessário,  mando milhares de milhas em muitas horas
         tada por inúmeros rios – as lanchas eram pri-  tudo deram pela sua Pátria.   de navegação. Da sua conduta dependia o
         mordiais na ligação entre os diversos pontos   Bem haja senhor                           êxito de inúmeras
         do território, essenciais no patrulhamento e   Almirante.                                missões, a vida de
         fiscalização das vias fluviais, e insubstituíveis   Procurando en-                         muitos homens e
         em desembarques operacionais de unidades   globar todos sem                              a chegada ao des-
         militares. Uma das mais nobres missões des-  distinção, inde-                            tino de centenas de
         tes pequenos grandes navios, consistia ainda   pendentemente                             toneladas de mate-
         no apoio logístico às unidades militares esta-  do tipo de mis-                          rial de guerra e de
         cionadas fora de Bissau, que não teriam sobre-  sões e das zonas                         abastecimento.
         vivido sem as suas visitas regulares, muitas   de acção onde                              Sujeitos com as
         vezes integradas em comboios civis de rea-  prestaram servi-                             suas guarnições a
         bastecimento.                       ço, não consigo, porém, deixar de distinguir  todos os riscos, navegavam quer em rios
                                             as lanchas da Guiné, teatro de operações  muito apertados onde o inimigo espreitava
         LDM 302, UM CASO RARO               que melhor conheci e onde, pela configu-  a todo o momento, quer ao longo da costa,
                                             ração geo  gráfica e características das suas  de dia ou de noite, apenas com a ajuda de
           Na Guiné destaque ainda para a LDM 302,   extensas bacias hidrográficas que torna-  conhecenças em terra, de uma tabela de
         que registou oito ataques graves durante a sua   vam diferentes as necessidades da guerra,  marés e de uma simples agulha magnética.
         vida. Os dois primeiros verificaram-se em 1964,   atendendo ao extraordinário relevo de to-  Grande parte das vezes a  aproveitar não
         sem consequências, ocorrendo nova flagelação   das as suas águas interiores, a Marinha fez,  só a maré, mas também a própria altura da
         em 1965, da qual resultaram 30 impactes no   desde a primeira hora, o seu maior esforço  água, no cumprimento de um horário que
         costado, não se registando baixas no seu pesso-  em toda a guerra do Ultramar, chegando  não podia ser alterado, embora para isso ti-
         al, para o que muito contribuiu a resposta ime-  aquela Esquadrilha a totalizar 39 unidades,  vessem por vezes que impor, a superiores,
         diata e eficiente da sua guarnição. Nesse ano foi   sendo 8 LFP’S, 23 LDM’S e 8 LDP’S.  as suas divisas de cabo.
         atacada de novo por mais duas vezes, sendo na   Gostaria igualmente de salientar a de-  Numa bacia hidrográfica que registava
         última feridos 10 militares de uma unidade do   terminação inabalável da Marinha em fa-  amplitudes de maré superiores a 6 me-
         Exército embarcada na lancha.

         16  NOVEMBRO 2005 U REVISTA DA ARMADA
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